No último dia 21 de março a luta dos Xukuru para garantir seu território teve um importante capítulo: o Estado Brasileiro foi julgado na Corte Interamericana de Direitos Humanos. É a primeira vez que um povo indígena consegue processar o Brasil pelas violações que comete. O caso dos Xukuru foi denunciado à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) em 2002. Divulgado em julho de 2015, o relatório de mérito do caso conclui que o Estado Brasileiro é responsável pelas violações de direitos do povo Xukuru e faz recomendações, não cumpridas até hoje. Por isso, em março de 2016, a CIDH decidiu submeter o caso à Corte Interamericana.
A audiência do dia 21 foi a primeira e será única durante todo o julgamento do caso. Agora os representantes das vítimas e os representantes do Estado ainda têm até o próximo dia 24 de abril para apresentarem novas alegações, por escrito, para que então a Corte emita sua sentença sobre o caso, condenando ou absolvendo o Brasil das acusações.
O povo Xukuru sofre com mais de três séculos de espoliação e morte, na Serra do Ororubá, em Pesqueira, agreste de Pernambuco. Foi nos anos 1980 que essa trajetória começou a mudar. A nomeação de Xikão como cacique permitiu que os Xukuru se articulassem melhor e, após quase 20 anos de luta, em 2001, conseguissem a homologação dos 27.555 hectares em que vivem.
Nessas terras habitam 12 mil indígenas que lutam diariamente contra o preconceito e a violência para manter sua cultura viva. Até o momento o Estado não concluiu a desintrusão total da área e nem garantiu a posse da totalidade do território ao povo Xukuru, que ainda sofre com a presença dos posseiros na terra.
O problema se arrasta desde a promulgação da Constituição Federal de 1988, que deveria garantir os direitos dos povos indígenas. Esse tempo foi marcado por grande violência e pela criminalização dos indígenas. Entre 1992 e 2003 cinco indígenas Xukuru foram mortos diretamente em função da luta pela terra. A situação se complica ainda mais porque há 45 processos judiciais de antigos ocupantes que pedem as terras de volta, criando uma grande insegurança jurídica para os indígenas que lá vivem.
A advogada do Conselho Missionário Indigenista (CIMI) Caroline Hilgert, durante o julgamento, afirmou que “o caso Xukuru revela o gargalo da estrutura normativa, apontada nessa Corte pelo próprio perito do Estado, ao destacar que no sistema atual, mesmo depois do reconhecimento formal, o Estado não exerce a proteção dos povos e de suas terras. Isso significa que a demarcação é um ato declaratório e não demarcatório, como reconhece a Constituição”.
Edição: Monyse Ravenna