Eduardo Mara, é cientista social, doutor em serviço social pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e membro da Direção Nacional da Consulta Popular. Na entrevista concedida ao Brasil de Fato Pernambuco ele reitera o papel e a importância da Frente Brasil Popular na luta contra o golpe em curso no Brasil.
Brasil de Fato: Hoje, na Frente Brasil Popular, qual o eixo que orienta a unidade entre os movimentos sindicais e os movimentos populares?
Eduardo Mara: Eu diria que existem dois eixos principais e interdependentes. O primeiro deles é a luta contra o retrocesso e a barbárie imposta pela retomada das reformas neoliberais e que pode ser resumida na palavra de ordem “Nenhum Direito a Menos”. A maior expressão disso hoje são as lutas contra as reformas da previdência e trabalhista que mobilizaram as duas grandes paralizações nacionais do dia 28 de abril e agora no último dia 30. Mas é um eixo bastante amplo porque trata não somente das reformas que estão em votação no congresso nos dias correntes, mas também de toda a política de abertura do Brasil aos desmandos do capital estrangeiro, à privatização das nossas riquezas, etc.
É evidente que todas essas lutas ampliam ainda mais a insatisfação popular com o governo ilegítimo de Michel Temer. Sabemos que esse é um governo inviável no longo prazo e parte da classe dominante também entendeu isso, daí a importância de construirmos lutas em torno de bandeiras políticas. A estratégia do capital internacional e do monopólio da mídia é garantir a continuidade da retirada de direitos, se necessário através de eleições indiretas. Para nós, é necessário retomar a democracia e recolocar a decisão nas mãos do povo brasileiro. Daí a importância da bandeira das “Diretas Já” que tem crescido em setores importantes da sociedade, envolvendo a classe trabalhadora, os setores médios, intelectuais e artistas em todo o Brasil. Articulado à isso, acreditamos ser necessário articular essa lutas a um projeto autônomo da classe trabalhadora, capaz de inserir a maioria do nosso povo de forma ativa na disputa pelo poder. Daí a importância do Plano Popular de Emergência.
Qual o objetivo do plano popular de emergência?
São dois os objetivos principais. O primeiro é retomar o debate programático de forma unitária em toda a esquerda brasileira e nos movimentos populares e sindicais. A clareza das bandeiras que nos unificam aumenta a força dos lutadores e lutadoras do nosso povo e dá um sentido permanente à nossa unidade. O segundo e talvez o mais importante é servir de instrumento de trabalho com nosso povo, de retomada do trabalho de base. Um plano não será nada mais do que um pedaço de papel se não contar com força social organizada para executá-lo. Não se trata, portanto, de uma proposta apenas para apresentar à candidaturas ou a governos, até porque não temos mais a garantia de governos democráticos no Brasil. Se trata de um plano para retomar a capacidade do povo em acreditar que pode fazer política e mudar a própria vida a partir de sua organização e de suas lutas. O plano é, assim, a convergência entre as necessidades reais vividas pela classe trabalhadora e a construção de organização e luta permanente para disputar o poder na sociedade.
Para você, quais são os destaques entre as propostas do Plano Popular de Emergência?
Antes de mais nada é importante dizer que o plano não resume toda a formulação sobre o país que queremos. Os movimentos sindicais e populares no Brasil tem uma enorme formulação sobre cada um dos eixos do plano que, sem dúvida alguma, é muito mais avançada do que o que colocamos agora como proposta, daí o caráter emergencial da proposta: é algo para dialogar com a atual correlação de forças e com as demandas colocadas pela maioria da população. Por isso o mais importante é entender o plano como um processo, como um instrumento de trabalho para o avanço da consciência e da organização do povo.
Entre os dez eixos temáticos que compõe o plano eu destacaria o primeiro que trata da democratização do Estado. Ele perpassa todas as questões do plano. Não haverá retomada do emprego e da renda, acesso à moradia e à terra pra plantar, direito à saúde e educação garantidos se não houver a derrota do governo ilegítimo nas ruas e a retomada da democracia. Esse eixo inclui a luta pela democratização do judiciário, hoje um declarado inimigo da democracia; a democratização da mídia, hoje monopolizada por não mais do que cinco grandes famílias cujos interesses andam de mãos dadas com grupos internacionais sem compromisso algum com o desenvolvimento do nosso país.
Além disso, o plano prevê, e eu destaco como fundamental, a revogação de todas as medidas de caráter antipopular, antinacional e antidemocrático efetuadas pelo atual governo. Sem isso é impossível pensarmos a retomada de um projeto de desenvolvimento soberano de nossa economia. Basta pensar na emenda constitucional aprovada logo no início do governo golpista que congela os gastos estatais em 20 anos. Há também no plano propostas para colocar na ordem do dia a luta pela terra e o sonho da reforma agrária, essencial para a construção de nossa soberania, a retomada e melhoria de programas sociais como “Minha casa minha vida” e, não menos importante, a retomada e fortalecimento de uma política externa cujas alianças no âmbito do comércio internacional que construam possibilidades de romper o atual papel ocupado pelo Brasil na divisão internacional do trabalho.
O que a Frente Brasil Popular e o Plano Popular de Emergência estão apontando como possibilidade de superação para esse cenário de crise política e social?
Ambas as crises tem como fundamento a crise econômica mais ampla que atinge a economia brasileira. O golpe foi dado com o objetivo claro de destruir conquistas e direitos ampliando o espaço de valorização do capital, ou seja, ampliando os lucros dos patrões. Nesse momento o poderio da grande mídia articulada às grandes corporações internacionais e ao judiciário conservador é quem dita os ritmos e conteúdo do processo político brasileiro. Mergulhados em corrupção, tanto o parlamento quanto o poder executivo tentam salvar-se acelerando a votação das reformas para acalmar os ânimos do capital internacional e, assim, salvar a própria pele.
A única solução nesse momento é derrotar esse governo pela pressão e mobilização popular por direitos e por eleições diretas e, a partir daí, recolocar um projeto de reformas populares na ordem do dia. Sabemos, ademais, que no médio prazo só será possível a retomada de um projeto de mudanças substantivas na vida do povo se superarmos o sistema político atual e refundarmos o Estado brasileiro. Daí a importância do horizonte político de uma Constituinte Popular e Soberana para que a população possa debater e decidir sobre qual o Brasil que queremos.
Qual o calendário principal nacionalmente e em Pernambuco que a Frente Brasil Popular aponta?
Nosso principal desafio tanto nacionalmente quanto aqui no estado é ampliar a presença da Frente Brasil Popular em qualquer lugar onde possa haver povo organizado lutando por direitos e democracia. Em Pernambuco será decisivo o passo que daremos no próximo sábado, 15 de julho, em Recife. Vamos reunir todas as regiões do estado e movimentos populares e sindicais para planejar e dar início a um grande mutirão de trabalho nas cidades, bairros, locais de trabalho do sertão ao litoral, dando continuidade à construção das Caravanas Populares pela Democracia. E faremos isso em meio à resistência central e imediata à votação da reforma trabalhista. Estamos indicando nacionalmente ocupar as ruas no dia da votação da denúncia do processo contra o presidente Michel Temer e a realização de atividades com objetivo de pressionar os senadores no dia da votação da reforma trabalhista. Além disso, teremos nos dias 18 e 19 desse mês em São Paulo uma reunião nacional do conjunto dos movimentos e entidades populares e sindicais que compõe a frente para planejar um calendário mais amplo de lutas.
Edição: Monyse Ravena