Nesse momento em que um golpe se realiza no Brasil, é possível perceber com mais clareza a estrutura do sistema de desigualdades que marcam a sociedade brasileira. Porém, não é mais possível fechar os olhos para o fato de que o sistema de desigualdades combina as múltiplas formas de discriminação, em especial a discriminação de raça, gênero e classe, retroalimentando os preconceitos e os crimes que afetam de maneira mais profunda alguns sujeitos que compõem este povo. É preciso falar sobre a vida das mulheres, em especial as mulheres negras. Reconhecer que pelo simples fato de ser mulher e negra, estas estão sujeitas a violências como assédio sexual e moral, estupro, tráfico, exploração. Muitas chegam a compor as terríveis estatísticas de morte, hoje caracterizado como feminicídio.
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), a taxa de feminicídios no Brasil é de 4,8 para 100 mil mulheres, ocupando o lugar de quinta maior no mundo. Além disso cresceu também a proporção de mulheres negras entre o total de mulheres vítimas de mortes por agressão, passando de 54,8% em 2005 para 65,3% em 2015. Isso significa que 65,3% das mulheres assassinadas no Brasil neste ano eram negras. Enquanto a mortalidade de mulheres não negras teve uma redução de 7,4% entre 2005 e 2015, atingindo 3,1 mortes para cada 100 mil mulheres não negras, abaixo da média nacional -, entre as mulheres negras houve um aumento de 22%, chegando à taxa de 5,2 mortes para cada 100 mil mulheres negras, acima da média nacional.
A participação feminina no mercado de trabalho é estanque, oscilou em torno dos 54-55%, o que significa que quase metade das brasileiras em idade ativa está fora do mercado de trabalho. Ou seja, o aumento da ocupação das mulheres em relação aos homens no campo educacional não reflete no mercado de trabalho, mantendo os homens brancos no topo da pirâmide e a base pelas mulheres negras.
Mais de 90% das mulheres realizam atividades domésticas, ou seja, as mulheres ocupadas continuam se responsabilizando pelo trabalho doméstico não-remunerado, a chamada “dupla jornada”. Pode se afirmar que embora homens e mulheres produzam bens e/ou serviços necessários para toda a sociedade, a jornada total média semanal das mulheres superava em 7,5 horas a dos homens (53,6 horas semanais a jornada média total das mulheres e 46,1 a dos homens).
Na contramão desses dados estarrecedores, observamos que o crescimento da proporção de domicílios "chefiados" por mulheres nestes 20 anos passou de 23% para 40% e, em sua maioria, essa chefe de família é a mesma mulher negra trabalhadora.
Datas como o 08 de março (Dia Internacional da Mulher) e o 25 de novembro (Dia Internacional da Não Violência contra a Mulher) são calendários de luta e de organização das mulheres que, além das lutas cotidianas, dão uma grande contribuição ao pensamento social e político da atualidade, ao afirmar não há luta emancipatória sem o enfrentamento das lutas estruturais contra o machismo e o racismo, bases da opressão e exploração das elites.
Edição: Brasil de Fato