São João é uma festa de inúmeras expressões e ritmos culturais. Os bacamarteiros há anos homenageiam os santos com seus tiros e danças. Não há precisão na data que nasceu a tradição dos bacamarteiros, mas a versão mais difundida sobre a origem dos batalhões é que teria surgido após a ocorrência da Guerra do Paraguai (1865). Porém, alguns pesquisadores afirmam que o uso do bacamarte, especificamente no estado, deu-se para saudar aos santos juninos, e teve início com a invasão holandesa em Pernambuco, enquanto que os brincantes afirmam que a origem é anterior a citada guerra, que a tradição surgiu quando do nascimento de São João Batista.
A manifestação cultural, consiste em uma apresentação performática de pessoas, vestidas com calça e camisa de zuarte, lenço no pescoço e chapéu de palha ou couro, reúnem-se em grupos, troças ou batalhões, sob a chefia de um sargento e o controle geral de um comandante, que responde, perante às autoridades, pelos atiradores durante as apresentações. O nome vem da bacamarte, que é uma arma de fogo de cano curto e largo, reforçada na coronha usada por eles. Não se sabe ao certo se é uma arma originalmente brasileira, nem como ela chegou no Nordeste. O que é sabido é que ela foi adaptada para o folguedo, antes era usado com chumbo, agora é com pólvora, porque produz mais barulho e fumaça.
Segundo o estudioso George Michael, em sua dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Antropologia, da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), “Os bacamarteiros não são exclusivos da cidade de Caruaru. O folguedo é e encontrado em outras cidades e regiões do estado de Pernambuco e do Nordeste. Contudo, há grande número de grupos na cidade, assim como pela expressividade na cultura regional. A informação quanto ao número de bacamarteiros no município é de aproximadamente 150 brincantes divididos em 8 batalhões”, escreve. No dia 24 de Junho já é festejado no Brasil todo o dia de São João. Em Pernambuco, a data também reverencia os bacamarteiros. Sancionada pelo ex-governador Eduardo Campos, a Lei nº 15.152 institui, no Calendário de Eventos de Pernambuco, o Dia Estadual do Bacamarteiro, mas não é considerada feriado por esse motivo. Mesmo assim, é uma expressão que sofre com pouca fomentação governamental.
Elivânia Ferreira, 37 anos, sente saudade dos grupos de bacamarteiros que eram tão presentes na infância dela, em Caruaru. Moradora da cidade, Elivânia conta que a ansiedade pela chegada do São João para ver as apresentações dos bacamarteiros deu lugar a preocupação de ser uma expressão que esteja sumindo. “Antes eram mais valorizados, não sei se porque aqui em caruaru as festas eram mais nas comunidades feitas nas próprias comunidades, nos próprios bairros e agora não é mais. Quase todos os lugares tinha uma palhoça onde os moradores dançavam suas quadrilhas e tinha as apresentações dos bacamarteiros. Naquela época essa expressão é mais forte, hoje não vejo essa força mais. E precisa ser mais valorizada, porque é uma coisa tão linda de se ver”, conta.
Na cidade de Ibirajuba, no agreste pernambucano, os bacamarteiros eram religiosamente presentes nas festas juninas, mas foi se perdendo, principalmente por causa de muitas prisões de bacamarteiros por porte ilegal de arma. Depois de muita luta por parte dos brincantes e da Prefeitura Municipal da época, os bacamarteiros foram legalizados em uma associação de Caruaru e hoje o transporte da arma pode ser feito com uma guia de tráfego especial, onde consta o nome do bacamarteiro, associação à qual pertence, quantidade de pólvora e um aviso: o documento não garante porte de arma. Para fomentar ainda mais a tradição na cidade, desde 2012 é realizado o Encontro dos Bacamarteiros, que reúne mais de 500 bacamarteiros da região. Os encontro realiza-se em apenas um dia, onde os brincantes assistem uma missa na Igreja de Santa Quitéria e depois seguem em desfile para o centro da cidade, onde começam as apresentações. Segundo Adilson Siqueira, chefe do Batalhão 07 de IIbirajuba, mesmo com o encontro anual, a expressão cultural é pouco incentivada. “ Vivemos ainda com recursos próprios e um pouco da prefeitura do município. E isso é difícil para conseguirmos continuar deixando essa história viva”, afirma.
Para George Michel, o que tem acontecido em Caruaru também é a falta de incentivo público. “O que existe é uma atuação específica por parte da prefeitura, no período junino e que atende as demandas de uma “indústria cultural”, um apelo midiático que “vende” a maior festa da cidade, que chama a atenção de turistas e, consequentemente, movimenta a economia do município. Isso acaba por enfraquecer o folguedo, por que mesmo com toda a força própria dos bacamarteiros em manter viva a tradição, é essencial que agências de fomento, que no caso seria a prefeitura, incentivem através de patrocínio contínuo, pensando na manutenção dos grupos culturais”, escreve
Edição: Monyse Ravenna