O audiovisual brasileiro tem uma história de vida bem recente, comparado aos outros países, sobretudo da Europa. E isso influencia diretamente na forma de fazer e de contar histórias através do áudio e do vídeo, juntos. No Brasil, segundo os dados do Observatório Brasileiro do Cinema e do Audiovisual, em 2017, foram apenas 3.425 filmes registrados com o Certificado de Produto Brasileiro, que é um documento que dá garantia de que o filme é um produto nacional. É como uma certidão de nascimento que prova a titularidade da obra audiovisual brasileira. E o que chama atenção é que desse número, 2.448 foram feitos de forma independente.
Quando esses números são relacionados à produção de filmes por pessoas negras, baixa mais. Segundo dados da pesquisa “A Cara do Cinema Nacional: perfil de gênero e cor dos atores, diretores e roteiristas dos filmes brasileiros”, conduzida por pesquisadores da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) e divulgada pelo Jornal Nexo, “Pretos e pardos correspondem à metade da população, mas são apenas 15% dos atores principais e 2% dos diretores de filmes nacionais”. Aqui no Recife, um grupo de mulheres negras estão trabalhando em um projeto que contribui para a mudança desse quadro.
O documentário Hixikanwe – Estamos Juntas, nasceu de uma experiência individual de Débora Britto, diretora do filme, de reconhecimento da sua identidade enquanto mulher negra. Em 2014 ela morou em Moçambique, na África, e foi lá que começou a entender sobre sua ancestralidade e se enxergar nas dores e no que representa ser mulher e negra em uma sociedade machista e racista. O filme quer capturar essa essência. O encontro de Débora, Safira, Mayara, Mariana, Gabriela e Magda todas brasileiras com Judite, Júlia, Amélia, Madalena, Graça e Ramia, moçambicanas.
“Ao longo desses quatro anos, tenho buscado entender os processos de mulheres negras no geral. Em diálogo com outras mulheres, a gente percebeu que sentimos muito parecido. Mesmo com histórias distintas e lugares diferentes, de onde a gente veio, nós compartilhamos de um sentir. É quando a gente toma consciência do que significa ser essa mulher negra.”, conta Débora. Não à toa, Hixikanwe (que dá nome ao filme) significa "estamos juntos", em Xi-Changana, língua materna da Região Sul de Moçambique. É ali, aliás, onde fica a organização social de mesmo nome, onde tudo começou, em 2014, também ponto de partida para a retomada das filmagens, em 2018.
Para a produtora executiva de Hixikanwe, Mariana Reis, mesmo com o fomento de políticas públicas para o audiovisual brasileiro, ainda é difícil fazer cinema no país. “É um projeto que foi aprovado pelo Funcultura, que é um Fundo de Cultura do Governo do Estado de Pernambuco, mas, para a aprovação, tivemos que fazer alguns reajustes de cortes no orçamentos. Fazer audiovisual no Brasil ainda é muito caro e mais ainda quando a gente pensa em um cinema negro, realizado por mulheres negras, que é a ponta mais frágil da cadeia. Mas, nós acreditamos e estamos fazendo esse trabalho de formiguinha, fazendo uma teia de possibilidades para materializar esse projeto”, diz.
A equipe pretende ir em Moçambique no início de agosto e, para ajudar no custo do filme, estão com uma campanha de financiamento coletivo, que qualquer pessoa pode doar. É só entrar no site www.benfeitoria.com/estamosjuntas e escolher a opção que deseja. Além de incentivar o filme, ainda tem como contrapartida recompensas como nome nos agradecimento no filme, camisas e canecas com uma arte exclusiva e assessórios moçambicanos. As doações são a partir de R$15 e vão até o dia 16 de julho. O formato é tudo ou nada, se elas não conseguirem bater a meta de R$25.000,00 tudo o que já foi doado será devolvido.
Edição: Monyse Ravenna