Fátima Bezerra foi eleita duas vezes deputada estadual e três vezes deputada federal. Natural da Paraíba, é pedagoga e tem a carreira política marcada pela luta em defesa da educação pública. Fátima derrotou, no segundo turno, Carlos Eduardo Alves, representante de uma das maiores oligarquias políticas do Rio Grande do Norte.
Brasil de Fato: Nas Eleições 2018, todos os candidatos a governadores apoiados pelo ex-presidente Lula conseguiram ser eleitos no Nordeste. Além disso, o candidato do PT, Fernando Haddad, venceu as eleições presidenciais em todos os estados da região. Na sua opinião, o que essa resposta do povo nordestino representa para o momento político atual?
Fátima Bezerra: O Nordeste tem uma história de protagonismo político e de resistência. De Canudos a Palmares; de Frei Caneca a Marighela; da Revolução Praieira às Ligas Camponesas, de Miguel Arraes a Dom Hélder Câmara e Luís Inácio Lula da Silva, nossa referência maior. Na verdade, o Nordeste já vem se caracterizando como uma terra de resistência e o recanto progressista do país por várias eleições, inclusive estaduais. Foi essa opção que permitiu um avanço político inimaginável até algum tempo em nossa região, quando éramos considerados a cara do atraso. Elegemos e reelegemos, em alguns casos por seguidas vezes, governadores de esquerda ou de perfil popular. O voto em 2018 mostrou o quanto essa opção foi acertada é que vale à pena apostar em mudanças. Se dependesse do Nordeste, Haddad teria sido eleito é já no primeiro turno. Infelizmente para o Brasil o resultado foi outro. Mas na luta para resistir à sanha de um governo entreguista e inimigo do povo, o Nordeste será de novo um território de lutas. Quem vive no Nordeste tem plena consciência dos avanços que experimentamos os 13 anos de governos Lula- Dilma. Uma região tão discriminada e esquecida como a nossa não esquece quem nos tratou com dignidade e que trabalhou para mudar nossas vidas. Para os nordestinos o legado dos governos petistas ninguém apaga
De que modo você planeja estabelecer diálogo com esses outros representantes dos demais estados nordestinos?
Cada estado nordestino tem suas particularidades, mas não enxergamos outro caminho para superação de problemas comuns e resistirmos à ofensiva conservadora, do que uma ação conjunta de toda região, independente de divergências políticas ou interesses estaduais. Na medida do possível, temos que atuar em bloco para construir uma agenda comum de superação da crise. Ainda vou tomar posse, mas sinto que vamos avançar muito nesse sentido.
O Rio Grande do Norte possui um histórico de mulheres protagonistas na política eleitoral. Esse ano, você foi a única mulher a ser eleita governadora, enquanto os outros 25 estados e o Distrito Federal serão governados por homens. De que forma você avalia esse quadro do cenário político atual?
O fato de ser a única governadora do país é motivo de alegria pra mim, mas sei que isso aumenta minha responsabilidade porque a cobrança sobre o desempenho das mulheres é sempre feita em dobro, ainda mais sendo eu a única do Brasil. Essa realidade de termos apenas uma mulher eleita é extremamente preocupante porque demonstra de forma categórica o quanto precisamos trabalhar para ampliar o protagonismo feminino em todos os espaços da sociedade, inclusive na política. Essa é uma questão estratégica para o Brasil, ainda mais num período de retrocessos como já estamos vivendo e deverá se intensificar no país.
Você pensa em outros nomes de mulheres para estar compondo seu governo? E que políticas públicas você planeja desenvolver direcionadas às mulheres potiguares?
Estamos ainda na fase de definição da nossa equipe de Governo. E teremos sim uma participação efetiva. Além da Secretaria de Mulheres, Direitos Humanos e Cidadania que criamos, que tocará programas específicos, nosso governo terá políticas de gênero em todas as outras áreas como educação, saúde, Cultura, segurança, agricultura familiar e assistência social. A questão de gênero será prioridade no Governo da única mulher governadora do Brasil.
Na política potiguar, era comum a constante reeleição de famílias inteiras, as chamadas oligarquias. Você acredita que sua vitória representa o rompimento com a velha política e o início de uma nova relação dos potiguares com o voto? Na sua opinião, o que pode ter ocasionado a derrota desses grupos políticos que protagonizavam a política no estado há tanto tempo?
As velhas oligarquias e grupos tradicionais do Nordeste estão esgotados. O que aconteceu no RN agora já tinha ocorrido na Bahia, Maranhão, Piauí, Ceará, Paraíba e Pernambuco. É uma reação do povo e uma expressão clara de mudança. Os nordestinos e nordestinas estão construindo uma nova cultura política. Parece que todo o legado de resistência e nossa riqueza cultural se somaram para resultar nesse rosto renovado que oferecemos ao país como exemplo de que é possível alargar a democracia e preservar direitos. Com políticas públicas ousadas e participação popular.
Edição: Monyse Ravena