Se no Recife o Galo da Madrugada abre os dias de folia, em Olinda é o Homem da Meia Noite que abre o carnaval. Patrimônio Vivo de Pernambuco desde 2006 e com 87 anos de história comemorados no último sábado (02), o bloco surgiu em 1931 a partir da iniciativa do pintor de paredes Luciano Anacleto de Queiroz; o carpinteiro Sebastião da Silva; os encadernadores Cosme José dos Santos e Heliodoro Pereira da Silva e o sapateiro Manoel Joaquim dos Santos, o Neco Monstro, que por não participarem da chapa da diretoria da Troça Carnavalesca Mista Cariri Olindense, que abria o Carnaval, decidiram fundar um bloco concorrente que desbancasse o Cariri.
O Homem da Meia Noite sempre sai da sua concentração em frente à Igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos, no Bairro do Bonsucesso, entre o sábado de Zé Pereira e o domingo de Rei Momo com a chave da cidade. Seu boneco é o mais antigo de Olinda, que tem a marca do paletó verde e cartola preta ou paletó e cartola brancos, o sorriso com dente de ouro e o relógio no braço que sempre marca a meia-noite. Uma das várias histórias que se contam sobre a origem do boneco tem a ver com a noite em que Luciano Anacleto foi ao cinema e assistiu o filme “O ladrão da meia-noite”, que conta a história de um ladrão de luxo, que saia todos os dias de um relógio diferente à meia-noite e causava pânico na cidade em que vivia.
Além disso, o boneco tem uma relação com as religiões de matriz africana, já que seu primeiro desfile foi num 2 de fevereiro, dia de Iemanjá, o que faria do Homem uma espécie de calunga, figura mística associada a orixás ligados às águas do mar. Mariana Peixoto, neta do ex-presidente Tacio Botelho e sobrinha de Luiz Adolpho Botelho, atual presidente, cresceu vendo o envolvimento da família com o bloco e todas as etapas de preparação para que o bloco saísse ás ruas “Meu avô tinha uma relação de amor com o Homem da Meia Noite. Ele dizia pra gente chamar ele de calunga, porque só um boneco não tinha a capacidade de chamar tanta gente, é algo incrivelmente mágico o que acontece no sábado de carnaval”.
O Homem que é um dos símbolos de Olinda tem cerca de quatro metros e 50 quilos e foi carregado por mais de quarenta anos por Alcides Honório dos Santos, o Cidinho. Hoje, a tarefa é de Pedro Mangabeira, bonequeiro que com 61 anos carrega o Homem da Meia noite há pelo menos três décadas e no ano passado participou da lista de votação dos homenageados no carnaval de Olinda.
Hoje, para Mariana, o bloco é tradição da família, mas pertence ao povo. “O Homem da Meia Noite não é nosso. Não é da nossa família, mesmo a gente cuidando a tanto tempo. A espera das pessoas por ele, a emoção que o povo tem é difícil até de racionalizar. Até hoje eu lembro da minha mãe me vestindo de calunga. Hoje eu levo Olívia, minha filha. No primeiro Carnaval ela só tinha três meses e ainda assim eu fui com ela”.
Para o carnaval de 2019, os preparativos começaram há meses. Esse ano, o tema escolhido para o bloco foi a “Voz do Morro”, homenageando Lia de Itamaracá, o bloco Patusco e Lucas dos Prazeres. No último sábado (02), no aniversário do bloco, o Calunga subiu o Morro da Conceição em clima de festa para buscar sua roupa de carnaval, junto com a orquestra do mastro Carlos e várias outras agremiações.
Edição: Monyse Ravena