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Política

Ricardo Gebrim: “O bolsonarismo está unificado em torno do programa ultraneoliberal”

O advogado e dirigente da Consulta Popular fala sobre cortes na educação, Reforma da Previdência e governo Bolsonaro

Brasil de Fato | Recife (PE) |
Ricardo Gebrim conversou com o Brasil de Fato em visita a Pernambuco
Ricardo Gebrim conversou com o Brasil de Fato em visita a Pernambuco - Marcos Barbosa/Brasil de Fato PE

Em visita ao Recife, o advogado e membro da direção nacional da Consulta Popular Ricardo Gebrim conversou com o Brasil de Fato Pernambuco sobre as mobilizações populares contra os cortes na educação que tomaram as ruas de todo o Brasil na última semana, além de fazer uma avaliação dos primeiros meses do governo Jair Bolsonaro (PSL) e a luta contra a Reforma da Previdência.

Brasil de Fato: Inicialmente, como você avalia o governo Bolsonaro até aqui?

Ricardo Gebrim: Bom, a grande tragédia em curso, Bolsonaro e movimento bolsonarista são representação política de uma correlação de forças que tem conseguido, até o momento, unir várias frações da burguesia e unir a burguesia como um todo, o que não é comum na nossa história, porque a burguesia tem várias frações e com contradições internas. Esse movimento está muito unificado em torno de um programa, que é um programa ultraneoliberal, que, em essência, desmonta as bases nacionais, altera profundamente o curso da nossa história, fecha espaços políticos retirando espaços de decisão política dos poderes executivo e legislativo e desmonta, fundamentalmente aquele Brasil que teve um ciclo virtuoso entre 1930 e 1980. 

BdF: O governo Bolsonaro pode ser caracterizado como “neofascista”?

RG: Eu entendo muito boa e apropriada essa caracterização de neofascismo, que diferencia daquele fascismo clássico dos anos 1920 e 1930. No entanto, traz elementos que mostram que há elementos comuns com aquela experiência e este momento de agora, não só nos posicionamentos políticos, mas nas tentativas de mobilização da ação social que ele [Bolsonaro] faz para a implementação do seu programa, que é um programa essencialmente anti-popular. Acho boa a caracterização de neofascismo, porque ela demonstra que é uma situação nova, mas que não ocorre única e exclusivamente no Brasil, temos outras situações no mundo, de outros governos, que vão assumindo um caráter muito similar ao do governo Bolsonaro.

BdF: O que essas manifestações em defesa da educação significam para o governo e para a política nacional?

RG: São manifestações importantes, que têm que ser estimuladas, porque elas nos colocam novamente a possibilidade de retomar uma capacidade de luta mais vigorosa nas ruas, com uma mobilização maior. São mobilizações do movimento estudantil que, historicamente, tem peculiaridades, características que lhe permite sair à frente, com mais autonomia, em diversas circunstâncias da nossa história. Isso ocorreu perante o golpe de 1964, o movimento estudantil saiu com mais força e antes dos outros setores, tentando arrastar a classe operária e, em certa medida, isso ajudou e possibilitou greves como as de Contagem, Osasco, em 1968, e a de Belo Horizonte. No entanto, naquele momento, a repressão e, posteriormente, as mudanças econômicas do chamado “milagre econômico”, fecharam essas portas que poderiam desdobrar em um movimento maior. No entanto, já em 1977 e 1978, o movimento estudantil também tem essa capacidade de sair à frente e, dessa oportunidade, ele consegue posteriormente ajudar a catalizar quando a classe trabalhadora entra em cena, nestes mesmos anos. Desta vez [em 2019], a questão central é se a classe trabalhadora vai voltar a entrar em cena ou não. A classe trabalhadora está enfrentando condições muito difíceis, está sendo atacada violentamente por esse governo, por todo o processo do golpe e, se nós não conseguirmos trazê-la à cena, a capacidade do movimento estudantil, isoladamente, é bastante limitada. 

BdF: Diante dessa efervescência do movimento estudantil e desses atos em relação aos cortes da educação, há o risco dessas manifestações tomarem o mesmo rumo das famosas manifestações de 2013?

RG: Há uma diferença, a contradição que está colocada neste momento, leva às ruas pessoas que estão sendo atingidas por esta contradição. Fechamento de universidades, o fim da pesquisa, o corte de bolsas, a possibilidade de privatização de escolas públicas, o desmonte e fechamento de várias universidades educacionais. Essa contradição é o que leva o povo às ruas. Para os setores conservadores e de direita, essa é uma pauta que não tem como eles absorverem enquanto a pauta for essa. Eu acho que é muito importante que as lideranças estudantis centrem fogo na pauta que é a contradição, exatamente para disputar bases que poderiam ser atraídas pelo lado dos setores de apoio ao governo. Mas, é evidente que 2013 nos mostrou que a disputa do metro quadrado das ruas passou a ser algo que temos que conviver, enfrentamos uma direita que também pretende mobilizar e temos que saber disputar isso nas ruas. 

BdF: Então, qual é o papel dos movimentos estudantis e populares nesta conjuntura?

RG: Primeiro, nós temos que identificar as grandes contradições que esse governo vem causando e que podem ser, pedagogicamente, explicadas para o povo e atrair o máximo de forças em torno dela. Essa, que o movimento estudantil está fazendo com muita capacidade e com muita força, e pode ampliar esta força, é uma contradição fundamental que é a contradição do desmonte do sistema educacional. Mas, também, a Reforma da Previdência é algo que pode se casar com isso e pode ser, pedagogicamente, explicada para setores cada vez mais amplos. São contradições importantes, que atingem a população e nós temos que, através delas, envolver o mais amplo leque de forças atraindo, fundamentalmente, os setores da classe trabalhadora, que neste momento estão bastante paralisados pelos ataques que já vêm sofrendo. As ações que se constituirão, que estão previstas para as mobilizações gerais do dia 14 de junho, vão ser um bom elemento para sabermos se estamos conseguindo avançar nesse quadro e se conseguiremos construir uma campanha poderosa também em relação a barrar a Reforma da Previdência.
 

Edição: Monyse Ravena