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PRIVACIDADE

Opinião | Temos uma Autoridade Nacional de Proteção de Dados. E agora?

O esperado avanço em relação à proteção de dados no Brasil foi prejudicado

Brasil de Fato | Recife (PE) |
O Congresso Nacional poderá derrubar os vetos, recuperando o compromisso firmado por meio do texto original da MP 869/2018
O Congresso Nacional poderá derrubar os vetos, recuperando o compromisso firmado por meio do texto original da MP 869/2018 - Mattheus Henrique

Por meio da publicação em Diário Oficial da União, no dia 9 de julho, o presidente Jair Bolsonaro sancionou, com vetos, o texto que altera a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais brasileira e cria a Autoridade Nacional de Proteção de Dados ("ANPD"). Dentre as 24 atribuições da ANPD estão a elaboração de diretrizes para a Política Nacional de Proteção de Dados Pessoais e da Privacidade e aplicação de sanções em caso de tratamento de dados realizado de forma irregular.

Quem é a Autoridade Nacional de Proteção de Dados?
Sabe-se que, inicialmente, o órgão será parte integrante da Presidência da República, mas terá natureza transitória, podendo, após dois anos, e a critério do governo, ser transformado em autarquia, isto é, uma pessoa jurídica de direito público que dispõe de patrimônio próprio.
Já em relação ao tamanho da estrutura prevista para a ANPD, o novo órgão terá a seguinte configuração: o Conselho Diretor, com 5 membros escolhidos pelo Presidente, sabatinados pelo Senado e com mandatos de 4 anos; o Conselho Nacional de Proteção de Dados Pessoais e da Privacidade, com a participação multissetorial de 23 integrantes; uma Corregedoria; uma Ouvidoria; uma área de assessoramento jurídico próprio; e unidades administrativas necessárias à aplicação da lei.

O que foi vetado?
Com os vetos realizados no texto original da Medida Provisória 869/2018, texto esse que foi fruto de um extenso debate multissetorial, com ampla participação da sociedade civil, desenvolvido ao longo dos últimos anos, todo um esperado avanço em relação à proteção de dados no território brasileiro foi prejudicado.

Dentre os vetos observados, algumas temáticas devem ser destacadas por oferecer visíveis limitações ao funcionamento da Autoridade, como é o caso do comprometimento da independência financeira da ANPD. Assim, uma possível forma de remuneração, por exemplo, pelos serviços prestados fica proibida.

A precarização da atuação da Autoridade também é percebida com o fim de punições mais severas. O veto à previsão de certas sanções administrativas aplicadas pela ANPD como a suspensão e a proibição do exercício de atividade de tratamento de dados por empresas que sejam reincidentes ou cometam infrações graves representa a clara sobreposição dos interesses de mercado dos setores empresariais sobre os direitos de cidadãos e consumidores brasileiros.

O que podemos esperar?
Apesar do cenário desanimador, a luta ainda não chegou ao fim. O Congresso Nacional ainda poderá derrubar os vetos realizados pelo Presidente da República antes da constituição definitiva da ANPD, recuperando o compromisso anteriormente firmado por meio do texto anteriormente aprovado da MP 869/2018. Para que a regressão dos direitos e garantias anteriormente assegurados seja evitada, assim como o estabelecimento de medidas que vão na contramão das práticas adotadas por boa parte da comunidade internacional, serão necessários os votos de pelo menos 257 deputados e 41 senadores.

Mariana Canto e Raquel Saraiva são pesquisadoras do IP.rec - Instituto de Pesquisa em Direito e Tecnologia do Recife.

Edição: Monyse Ravenna