Duas mil mulheres indígenas se reúnem a partir desta sexta-feira (09), em Brasília, na 1ª Marcha da Mulher Indígena. O evento foi uma das deliberações do 15ª Acampamento Terra Livre, que aconteceu no mês de abril também na capital do país, onde diante de quatro mil indígenas de 150 etnias, se enxergou a necessidade política de um espaço de auto-organização das mulheres, para que possam ter autonomia para discutir suas realidades dentro e fora das comunidades e definir lutas a partir de pautas nacionais e locais.
Com o tema “Território: nosso corpo e nosso espírito”, as mulheres se organizarão para discutir temas como a violência familiar e interétnica, o acesso aos meios técnicos e financeiros para a geração de renda, a saúde reprodutiva, a soberania alimentar, a participação das mulheres nas decisões de políticas dos governos e vários outros temas, tudo com base na luta pelo território, pauta central para as indígenas, como explica Anayliô Tuxá: “A ameaça da perda das nossas terras impacta todas as mulheres. É lá que essa a nossa base e nossa ciência vem desse território sagrado. Sem essa terra, não temos nada, nossa força vem do território. Nós temos com a terra um olhar de cuidado e respeito com a nossa terra, porque sem ela nós nem existiríamos”.
Uma das mulheres que participará da Marcha, Anayliô foi escolhida pela sua comunidade como pajé há oito anos e é uma das mulheres que exerce um papel de liderança espiritual e política do povo Tuxá, que vem lutando há décadas pelo seu território. A Aldeia Tuxá fica a 24 Km da cidade de Inajá, no Sertão Pernambucano. Até 1987, a comunidade vivia na Ilha da Viúva, na divisa de Itacuruba (PE) e Rodelas (BA), mas depois da construção da Usina Hidrelétrica Luiz Gonzaga, a comunidade foi expulsa do local, tendo o povo dividido, onde três grupos vivem em Inajá, Rodelas e Ibotirama (BA). A ofensiva contra as terras indígenas não é uma exclusividade do povo Tuxá. Por isso, o tema do evento coloca a centralidade da luta pelo território, já que é nesse espaço que as comunidades vivem e sem conquistar esse direito primordial, é quase impossível obter conquistas relacionadas a outros temas.
A pajé ressalta a importância da Marcha na construção de uma agenda política construída pelas mulheres indígenas. “Esse encontro é um importante espaço de luta. Lá nos vamos mostrar que as mulheres indígenas estão organizadas e trazem essa lutas da base, e é também um espaço de empoderamento e conquista de políticas públicas para nós e nossas comunidades”, completa.
Atualmente, elas se reúnem na Associação de Mulheres Indígenas Produtoras Tuxá, que além das lutas políticas, também organiza a produção e a autonomia financeira das mulheres da comunidade e no Grupo Cultural Cabocla Ginu, que no nome tem memória a primeira cacique mulher da etnia, que organiza os cantos, danças e o resgate das tradições Tuxá que foram se perdendo em meio ao conflito da terra e a separação da comunidade. Para Anayliô, uma outra barreira é a conquista de espaço. “A gente sofre bastante discriminação e preconceito. Estamos buscando quebrar esse olhar patriarcal da sociedade de achar que a mulher não pode estar liderando rituais e a própria comunidade”, finaliza.
Edição: Monyse Ravenna