Na manhã do último sábado (14), 1.800 pessoas se reuniram no assentamento Normandia, em Caruaru, em acampamento nas terras onde está o Centro de Formação Paulo Freire, alvo de ordem de reintegração de posse solicitada pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e pela Advocacia Geral da União (AGU). Em ato de resistência, agricultores acampados e assentados de todas as regiões do estado montaram suas próprias cozinhas coletivas e estão participando de atividades políticas e culturais. Acampamento permanecerá por tempo indeterminado, mantendo aproximadamente 1.400 pessoas, segundo organizadores.
O território em litígio está há 20 anos sob gestão da associação comunitária Centro de Capacitação Paulo Freire, composta por membros das famílias assentadas que reuniu as famílias para a ocupação da antiga Fazenda Normandia ainda em 1993, resistindo a desapropriações violentas durante cinco anos, até a legalização das terras junto ao Incra em 1998.
Parte das terras, no entanto, foi cedida em comum acordo pelos assentados à associação comunitária Centro Paulo Freire para benefício coletivo. No local, a associação e o MST ergueram um centro de educação em agroecologia, voltado para trabalhadores da terra de todo o estado. As terras também compreendem uma igreja católica, uma creche e uma Academia da Cidade, construída pelo Governo de Pernambuco.
As terras abrigam, ainda, uma agroindústria pela qual passam toneladas de raízes (batata doce, inhame e macaxeira) e carne de boi e de bode cultivadas por trabalhadores de todo o estado. A agroindústria também beneficia a produção de pães e bolos, fruto do trabalho de uma cooperativa de boleiras assentadas em Normandia. Os alimentos são fornecidos para a merenda de escolas e creches de prefeituras do Agreste, Zona da Mata e litoral pernambucano, incluindo escolas do Recife.
Atividades culturais
Após uma tarde de depoimentos de solidariedade de professores e líderes religiosos, as artistas caruaruenses Gabi da Pele Preta e Bianca Mota deram início à programação cultural do acampamento. A proposta é ter atividades culturais diariamente.
Gabi da Pele Preta afirma que, mais que contribuir, ela aprende. "Esse pessoal aqui do Centro de Formação Paulo Freire educam para vivermos com mais qualidade de vida, para lutarmos por mais direitos e pela produção de alimentos sem veneno", elogiou. "Estamos aqui para cobrar o direito à terra e moradia, que é garantido na Constituição Federal", completa.
Ela também convocou outros artistas a se pronunciarem. "Quem faz arte e cultura ocupa um lugar estratégico, consegue se comunicar com as pessoas de outras formas. Então não podemos nos omitir", disse Gabi, que é também militante da Marcha Mundial das Mulheres.
A coordenadora de cultura do acampamento e militante do Levante Popular da Juventude, Rosa Amorim, afirma que a cultura é algo que constitui todos os acampamentos dos trabalhadores sem terra. "Sempre resistimos com muita poesia e música popular. Isso é parte de nós", diz Rosa. "Estamos articulando artistas locais, bandas e trios pé-de-serra do próprio povo sem terra, além de artistas que queiram se apresentar", completa. A programação cultural deve ser mais intensa nas noites de quinta, sexta, sábado e domingo.
Saúde
O acampamento conta, também, com uma equipe multiprofissional formada por médicos, sanitaristas, dentistas, psicólogos, farmacêuticos, educadores físicos e assistentes sociais. "Somos 14 profissionais, divididos em grupos para atendermos as demandas que surgirem a qualquer hora", garante Jerônimo Vaz, um dos coordenadores da brigada de saúde do acampamento.
Além dos atendimentos solicitados pelas pessoas, o grupo também tem se dedicado a cuidar dos sem terra que estão em atividades na cozinha, limpeza e segurança. "Em suas tarefas diárias acabam tendo desgaste físico grande", explica Vaz.
Campanha de vídeos
Além do acampamento, foi lançada uma campanha audiovisual colaborativa. Qualquer pessoa, de qualquer lugar do Brasil, pode participar. A ideia da campanha é destacar a importância do Centro de Formação Paulo Freire, que faz parte da história de milhares de pessoas que já passaram pela escola no Agreste pernambucano.
Qualquer pessoa que já tenha participado de formações políticas ou voltadas para agroecologia ou qualquer outra atividade no Centro, deve gravar vídeo falando um pouco da sua experiência no local. Para participar, é necessário fazer um vídeo respondendo a pergunta: “o que o Centro de Formação Paulo Freire representa em sua vida?”. Mas, aqueles que ainda não conhecem o Centro Paulo Freire, mas reconhecem sua importância, também podem mandar mensagens de solidariedade.
O vídeo deve ser feito na horizontal e precisa ter um minuto de duração. A produção pode ser postada nas próprias redes sociais, marcando a página do MST Pernambuco (@movimentosemterrapernambuco) e utilizando as hashtags #DespejoNao e #MSTcentroPauloFreireResiste. O vídeo também deve ser enviado por whatsapp para o número: (81) 99606-6101.
Já enviaram depoimentos figuras como o presidente nacional da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Vágner Freitas; o ator Leandro Ramos, do Choque de Cultura; a professora universitária Celi Taffarel, da UFBA; e Ivan Marinho, presidente da Associação de Bacamarteiros de Pernambuco
Apoio financeiro
Pessoas que vivem na Região Metropolitana do Recife e tiverem interesse em fazer contribuições financeiras ou em forma de alimento, levar a contribuição ao Armazém do Campo, na avenida Martins de Barros, nº 387, bairro de Santo Antônio, centro do Recife. Outra opção é fazer transferência bancária diretamente para a conta da Associação Centro de Capacitação Paulo Freire. A conta corrente do Banco do Brasil tem número 28554-4, agência 0159-7.
Edição: Monyse Ravena