Há um mês, no dia 2 de setembro, banhistas encontraram manchas escuras de óleo em praias na Paraíba. Nos dias seguintes a substância alcançou as praias pernambucanas de Piedade, Boa Viagem, Del Chifre, Cupe e Tamandaré. Passados mais de 30 dias, já são 132 praias do Nordeste atingidas pelo que se descobriu ser petróleo cru. Além dos mencionados, também foram atingidos Alagoas, Sergipe, Ceará, Piauí e Maranhão. Em toda a região, apenas o litoral da Bahia foi preservado. Ainda não se sabe em que circunstâncias houve o derramamento ou quem cometeu o crime ambiental.
Em Pernambuco foram 16 praias atingidas, mesmo número de locais afetados na Paraíba. O Rio Grande do Norte teve a costa mais atingida, com 40 pontos recebendo o petróleo. A corrente marítima na costa nordestina vem do sul para o norte e levou o material para o litoral cearense, piauiense e maranhense. Após atingir dois mil quilômetros da costa do Nordeste, a substância se dirige agora em direção ao Pará.
O surfista e comunicador Reginaldo Galvão havia lido sobre as placas de óleo na praia de Porto de Galinhas. Mas no dia seguinte, ao se deparar com o óleo na praia do Paiva, onde costuma surfar no Cabo de Santo Agostinho, diz ter ficado chocado. "As piscinas naturais cobertas de óleo. Foi terrível. As manchas ficaram lá quase uma semana", recorda.
Dias após a limpeza, ele voltou a encontrar óleo. "Para quem vive no mar é uma sensação das piores possíveis. Todos ficamos em estado de choque. É um crime ambiental de alta proporção, com a morte de animais, e ainda não sabemos as consequências futuras", lamenta. Galvão também se queixa da demora para encontrar os autores do crime. "Com toda essa tecnologia e ainda não descobriram os culpados. Ficamos sem saber se haverá alguma punição ou solução, o que também é bastante ruim", completa.
Entre os danos ambientais, já foram encontradas - até a publicação desta matéria - seis tartarugas marinhas mortas envoltas no óleo, uma ave e há suspeita de que esta tenha sido a motivação da morte de um boto no litoral do Ceará. A região entre Alagoas e Rio Grande do Norte possui berçários de golfinhos e tartarugas.
Sobre a origem do material, cogitou-se a possibilidade de que o óleo seria proveniente da Refinaria Abreu e Lima, que sofreu um vazamento no dia 26 de agosto, mas a tese foi descartada, pois as avaliações atestaram que o óleo não é produzido ou comercializado pela Petrobras.
Causas
As principais possibilidades ventiladas pela agência de meio ambiente de Pernambuco (CPRH) são de que houve um vazamento de alguma embarcação ou um despejo intencional do produto no oceano após limpeza de tanque. Ambas são crimes: a primeira, ainda que o vazamento tenha sido acidental, houve omissão; a segunda, do descarte intencional, é violação das normas, já que esse tipo de limpeza só é permitido em portos, onde o óleo pode ser entregue a empresas especializadas em tratamento. A agência avalia ainda que, pela quantidade de material, dificilmente teria sido oriunda da limpeza de tanque de uma única embarcação.
Uma força-tarefa foi montada para tentar descobrir a origem do material. Além da CPRH e da Secretaria de Meio Ambiente de Pernambuco (Semas), somam-se o departamento de Oceanografia da UFPE, o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente (Ibama), o Instituto Chico Mendes (ICMBio) do Ministério do Meio Ambiente, além da Marinha do Brasil. O grupo espera dar respostas sobre a origem do óleo até a metade deste mês de outubro. A Petrobras colocou 100 trabalhadores do seu Centro de Defesa Ambiental dedicados à limpeza das áreas atingidas.
O trabalho de identificar a embarcação ou embarcações envolvidas no crime é ainda mais difícil, já que as fotos de satélite não possuem a qualidade necessária. Diante das dificuldades, as secretarias de Meio Ambiente dos oito estados atingidos formalizaram denúncia junto ao Ministério Público Federal (MPF) para que o órgão e a Polícia Federal se envolvam na investigação.
As multas para crimes ambientais do tipo, previstas na Lei 9.605 (de 1988) podem alcançar os R$ 50 milhões. "É necessário ter celeridade e punir os culpados", cobra o deputado federal João Campos (PSB-PE), em conversa com o Brasil de Fato. "Não se pode ficar omisso. O Brasil sempre foi respeitado por seu patrimônio ambiental. Mas este governo tem sido muito omisso nessa área. É um desleixo que vem do presidente [Jair Bolsonaro] e passa pelos ministros", reclama o parlamentar.
Campos e parlamentares dos oito estados afetados subescreveram um pedido de informações junto ao Ministério do Meio Ambiente, questionando que medidas o Governo Federal está tomando em relação ao caso; e a estimativa de dano e as medidas de mitigação a serem tomadas. Também deve ocorrer, em caráter de urgência, uma audiência pública na Câmara Federal, na próxima semana, com a presença das instituições envolvidas na força-tarefa e grupos atingidos.
O deputado, no entanto, acredita que o caso tende a tomar proporções internacionais. "Precisamos mobilizar os órgãos nacionais, mas também parceiros da cooperação internacional na área ambiental", afirma Campos, destacando a possibilidade de que o crime tenha sido cometido por embarcações de outras nações.
Orientações
Os especialistas orientam que caso os banhistas ou pescadores avistem o óleo, não devem tocá-lo. O material pode conter compostos cancerígenos. É fundamental que a pessoa informe a Prefeitura sobre a presença do óleo. Caso o indivíduo já tenha feito contato com a substância, deve buscar um médico dermatologista. A mesma orientação serve para quando avistar animais na praia envoltos no óleo: chamar imediatamente os órgãos ambientais e não devolver o animal ao mar.
*Entramos em contato com o Ibama que não respondeu até o fechamento dessa edição
Edição: Monyse Ravenna