Pernambuco

VIOLÊNCIA

Em PE, os conflitos no campo aumentaram em 2019; confira o balanço

O maior elemento propulsor de muitos dos conflitos no território pernambucano ano passado foi o setor sucroalcooleiro

Brasil de Fato | Recife (PE) |
Despejo ocorrido final do mês de outubro cerca de 80 famílias que viviam no acampamento Beleza, no município de Aliança
Despejo ocorrido final do mês de outubro cerca de 80 famílias que viviam no acampamento Beleza, no município de Aliança - MST PE

A Reforma Agrária, historicamente, sempre andou a passos lentos no Brasil. Mas, em 2019 ela não andou. Segundo o “Balanço da Reforma Agrária 2019”, feito pela Comissão Pastoral da Terra Nordeste (CPT), o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), órgão responsável pelas ações que deveriam garantir a distribuição justa das terras no Brasil, não assentou nenhuma família e não desapropriou nenhuma propriedade para fins de Reforma Agrária, entre outros retrocessos.
Como exemplo, a paralisação de programas como o Programa de Compra Antecipada de Alimentos (PAA) e o Programa Nacional de Educação em Áreas de Reforma Agrária (Pronera). O primeiro, administrado pela Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) chegou a aplicar mais de R$ 1 bilhão por ano, (em 2019, foram aplicados apenas R$ 92 milhões) e representava um estimulo à produção de alimentos saudáveis e uma garantia aos camponeses que poderiam vender ao governo, recebendo à vista. O segundo, estimulava as universidades públicas a construírem cursos especiais na forma de alternância, realizando vestibular específico.
Em Pernambuco, os conflitos no campo se proliferam. Em meio a dezenas de despejos ou a possibilidade iminente disso, os camponeses atravessaram 2019 sem motivos para comemorar. Para CPT, o maior elemento propulsor de muitos dos conflitos no território pernambucano ano passado foi o setor sucroalcooleiro, sobretudo da zona da mata. “Impressionante como, mesmo desativadas, em falência ou com dívidas multimilionárias, estas Usinas são capazes de gerar muitos conflitos e de atuar de modo violento contra famílias camponesas”, afirma.  
O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), também avalia o cenário como bastante desolador. O Movimento viveu em 2019 dias de muita resistência para não perder o que já havia sido conquistado, como é o caso emblemático do Assentamento Normandia, no agreste pernambucano. Mas, os riscos de despejos não pararam por ai, como também não foram evitados alguns despejos de territórios e famílias que já tinham tempo e construção física da vida em acampamentos. 2020, na avaliação do MST e da CPT, promete um ano desafiador como o que passou e que será necessário disposição, articulações e mobilizações sociais.
O Balanço da CPT chama atenção também para a assinatura da MP 910 normatizando a legalização de terras públicas griladas na Amazônia Legal por latifundiários, bastando auto declaração de que já estão ocupando. A CPT declara que “A meta anunciada pelo Governo é regularizar um total de 600 mil títulos até o ano de 2022. Está em curso, portanto, uma verdadeira legalização da grilagem de terra na Amazônia Legal ou uma disfarçada e imoral anistia à apropriação ilegal de terras públicas”.  
Além dessas deliberações, outras tantas atingiram os povos do campo, como a liberação de 502 novos rótulos de agrotóxicos, muitos deles proibidos de serem vendidos nos países de origem e a autorização do porte de armas, de qualquer calibre, em toda extensão das fazendas. E a consequência não pode ser pior, o aumento da violência dos latifundiários no campo, em especial na fronteira agrícola, para disputa de terras. A CPT) registrou aumento dos conflitos durante 2019 e a ocorrência de 29 assassinatos de lideranças, incluindo indígenas e quilombolas.


Casos emblemáticos em PE


Normandia
Setembro marcou com o emblemático caso do Centro de Formação Paulo Freire, no Assentamento Normandia, em Caruaru. O juiz federal Tiago Antunes de Aguiar, da 24ª Vara Federal, em Caruaru, determinou a reintegração de posse de área de 15 hectares dentro do Assentamento Normandia, que fica na zona rural da cidade. A área em litígio está há 20 anos sob gestão de uma Associação de assentados e sedia um dos mais reconhecidos centros de formação e capacitação de camponeses do estado. Quem pede reintegração de posse é o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), que não aceita a relação de confiança entre assentados e o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Depois de muita mobilização de diversas organizações e partidos, além de um acampamento permanente no local, a justiça aceitou uma nova negociação, que está em curso até o momento. 

Acampamento Margarida Alves
Também em meados de setembro, foi a vez de ser concretizado a reintegração de posse do Acampamento Margarida Alves, que ficava na zona rural de Moreno, na Região Metropolitana do Recife. A ação foi expedida pela 1ª Vara Cível de Moreno. O terreno estava ocupado há mais de 16 anos, o antigo Engenho Xixaim abrigava 55 famílias do MST, que viviam e produziam alimentos na área de cerca de 120 hectares. Na ocasião, foram destruídas escola, biblioteca, plantações e casas. 

Acampamento Beleza
No final do mês de outubro cerca de 80 famílias que viviam no acampamento Beleza, no município de Aliança, foram despejadas pela tropa de choque, oficial de justiça e corpo de bombeiros. Segundo o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), a ação teve caráter truculento e destruiu todo o plantio dos trabalhadores e das trabalhadoras, além das casas das famílias.

Gameleira
Em novembro, os mais de 800 moradores do Assentamento São Gregório, o Alegre I e II, que fica em Gameleira, município da Mata Sul de Pernambuco, foram surpreendidos com uma liminar de ação de reintegração de posse. A ação foi pedida pela Usina Estreliana, antiga dona da terra e deferida pela 26ª Vara da Justiça Federal de Palmares. A área de mais de mil hectares é ocupada por mais de 100 famílias do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), desde 1995. 

Edição: Monyse Ravenna