Em todo o nordeste, cerca de 500 mil pescadores artesanais fazem parte da produção de alimentos, chegando a representar 75% dos pescados chegam até a mesa de mais de um milhão de famílias de toda a região. Só que desde agosto de 2019, com o vazamento de óleo no litoral, que impactou a pesca, poluiu mangues e nascedouros e em alguns locais chegou até na foz de rios, impediu que muitas famílias e comunidades que vivem da pesca continuassem tirando sua renda desta atividade. Desde então, parte dos pescadores vem se mantendo com o Seguro Defeso, um benefício pago quando o pescador fica impossibilitado de pescar, por exemplo, no período de piracema.
O problema é que esse benefício só é concedido a quem tem o Registro Geral de Pesca (RGP), que há muito tempo estava suspenso, levando à exclusão de milhares de pescadores dos benefícios dessa medida, já que atualmente o RGP não expressa o número real de trabalhadores das águas. Agora, a pandemia de coronavírus se soma a esse cenário de dificuldades, como explica Laurineida Santana, membro da Conselho Pastoral dos Pescadores “Os pescadores vem desde o ano passado sofrendo com a contaminação de petróleo. Sem sair dessa situação, veio o impacto da pandemia. Tem peixe, tem produção, mas não adianta pescar se a comercialização diminui. Os bares e restaurantes estão fechados, as feiras livres diminuíram muito o funcionamento. O problema não é a pesca em si, mas a comercialização e o risco de contato direto desses trabalhadores nesse momento”, explica.
Uma outra questão é que as famílias que já estavam em situação de vulnerabilidade pioraram ainda mais as condições de vida. Pescadores que já possuíam Bolsa Família ou CadÚnico conseguiram acessar o Auxílio Emergencial do Governo Federal, mas as famílias mais pobres, que sequer tem condições de ultrapassar a burocracia para esses cadastros anteriores, agora não tiveram acesso a internet para tentar o cadastro para o benefício de emergência “Essa coisa da digitalização não chegou para todo mundo. Tem uma parcela grande da sociedade que não tem acesso à internet e isso dificulta o acesso não apenas para os pescadores, mas para outras categorias também”, explica Laurineida.
Consórcio Nordeste
Com o agravamento das condições de vida dessas famílias, organizações como o Conselho Pastoral de Pescadores, o Movimento de Pescadores e Pescadoras Artesanais, a Articulação Nacional de Pescadores e a Comissão Nacional de Fortalecimento das Reservas Extrativistas Costeiras e Marinhas elaboraram no início do mês de abril uma carta de reivindicação cobrando ações dos governos estaduais do nordeste e do Consórcio Nordeste medidas como a criação de um fundo especial para pescadores; a distribuição de cestas básicas e produtos de limpeza nas comunidades pesqueiras; um plano específico de assistência social e atendimento médico voltado ao combate da covid-19; a compra da produção pesqueira artesanal via programas governamentais; linhas de investimento no setor e a suspensão de mandados de reintegração de posse e despejos, entre outras medidas.
Em resposta, o Consórcio Nordeste afirmou em nota que está trabalhando em parceria com o Fórum dos Gestores e Gestoras da Agricultura Familiar do Nordeste, incorporando uma ação regional de apoio à pesca artesanal dentro de um programa regional de apoio à agricultura familiar e fazer um levantamento da oferta de produtos para aquisição imediata, no sentido de incluir as comunidades pesqueiras nas ações de aquisição de alimentos saudáveis. Além disso, o Consórcio vem mapeando quais órgãos e secretarias municipais e estaduais fazem esse tipo de diálogo com as comunidades, para propor uma negociação direta com as lideranças locais das comunidades. Uma reunião para debater acerca das medidas para as comunidades pesqueiras iniciou o processo de articulação na última sexta (24), para pensar em como efetivar essas e outras medidas econômicas, de seguridade social e de saúde para os pescadores e pescadoras artesanais do nordeste.
Edição: Monyse Ravena