Nesta terça (11), o programa Aqui pra Nós teve como entrevistada Cibele Vieira, dirigente da Federação Única dos Petroleiros (FUP). Trabalhando na Petrobras há 17 anos, ela esteve na ocupação do Edifício Sede (Edise) da Petrobras durante uma greve história da categoria no último mês de março. Cibele explicou os impactos da crise do petróleo no Brasil e as ações da federação durante a pandemia de coronavírus. O programa Aqui pra Nós vai ao ar todas as terças no YouTube, sempre a partir das 19:30h. Confira os destaques da conversa:
Geopolítica do petróleo
Ainda em 2017, a Petrobras mudou sua política de preço com a justificativa de equiparar os preços ao mercado internacional, mas o que ocorre nos postos desde então é um aumento do preço, às vezes com alterações diárias. Cibele explica que essa e outras medidas estão relacionadas com a geopolítica do petróleo “dos anos 1970 pra cá, a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP) diminui a produção de acordo com a demanda. Na prática, é um cartel, porque com isso você controla o preço”. Países que têm uma grande reserva de petróleo e não participam desse acordo acabam sofrendo ataques dos Estados Unidos, a exemplo da Arábia Saudita, que após ataques se aliou ao país, e a Venezuela, que resiste às investidas do governo de Donald Trump.
Nas últimas semanas, o preço negativo no petróleo dos EUA repercutiu, mas ela explica que isso é um reflexo da diminuição da demanda de petróleo com a pandemia “você compra o petróleo para ser entregue no futuro, então tudo o que já havia sido vendido antes da pandemia foi que baixou de preço, porque a crise diminuiu a capacidade das empresas que utilizam essa matéria prima e os Estados Unidos já tinham tanto petróleo que nem tinha mais onde estocar”.
Política de preços
No Brasil, os reflexos da pandemia tem um impacto direto na Petrobras “eles podem falar que é uma equipe técnica mas estão completamente alinhados com a política do governo federal. As ações da Petrobras vem caindo de valor e isso é um reflexo das escolhas dessa gestão desde 2015, com a lava jato e desmonte do sistema Petrobras. É uma empresa que diminui o seu poder para que outras empresas se tornem mais competitivas, isso não faz sentido nem numa empresa capitalista”.
Antes da pandemia, ela afirma que a diminuição de produção de gasolina foi de 15% e o aumento da importação foi de 60% importação; já o diesel teve sua produção diminuída em 10% e as importações cresceram 60%. Já o gás de cozinha subiu 38% nas refinarias e 21% na venda “a empresa está se auto sucateando para abrir mercado para que as empresas de fora vejam aqui no Brasil um bom mercado para elas. Nos anos em que o preço era controlado ele não oscilava tanto... A Petrobras dava lucro e nenhuma empresa conseguia chegar aqui, vender tão barato e ser tão lucrativa”.
Direitos trabalhistas
Os petroleiros fizeram em março uma greve histórica contra uma onda de demissões e venda de subsidiárias “estamos uma gestão que não respeita o movimento sindical. Nossa pauta era contra o desmonte da Petrobras e contra as medidas corporativas que eles estavam fazendo sem diálogo. Trabalhadores souberam das suas demissões pela TV, eles não respeitam os acordo coletivos”.
A greve teve várias frentes de atuação, como os acampamentos na portaria das empresas e a ocupação no Edise, a sede da Petrobras no RJ. Depois de 21 dias de greve, a pauta avançou, mas ainda há pendências “o acordo não foi como queríamos, mas conseguimos um tratamento digno para aqueles trabalhadores que foram demitidos e suas famílias.” Com 17 anos na empresa, ela afirma que essa foi a maior movimentação de resistência da categoria dos últimos anos.
Trabalhadores infectados
Em Pernambuco, o Sindicato dos Trabalhadores na Indústria de Petróleo dos Estados de Pernambuco e Paraíba (Sindipetro-PE/PB) solicitou à gestão da Refinaria Abreu e Lima a adoção medidas para evitar o contágio do coronavírus, prevendo a possibilidade de uma greve sanitária, caso a maioria dos trabalhadores se contamine . Cibele explica que a FUP vem tentando propor soluções “Desde o começo, pedimos para participar de um comitê de crise e isso nos foi negado. Em alguns lugares conseguimos atuar mais, outros menos. As plataformas são locais de risco de contaminação, porque as pessoas ficam em grupo isoladas por até 21 dias. A gente não quer fazer greve, mas tudo aponta para uma greve sanitária”.
Ela divulgou dados da própria empresa, que do total 151 mil trabalhadores diretos e terceirizados, tinha até o último dia 04 de maio 1642 casos suspeitos, 806 confirmados e pouco mais de 300 recuperados. “A política da empresa tinha sido indicar o isolamento das pessoas suspeitas e diminuir o salário delas. Isso é pedir por subnotificação, porque as pessoas não querem deixar de trabalhar e ganhar ainda menos”. Ela ressalta que a categoria é um setor essencial “se ficar sem combustível tem ambulância? Tem construção de hospital de campanha? Os profissionais de saúde vão conseguir chegar no trabalho? Os alimentos vão conseguir sair das empresas e do campo para as pessoas? O serviço é essencial, mas não é necessário que todos os funcionários estejam trabalhando”, explica.
Solidariedade
Em diversos estados, os sindicatos de petroleiros tem se movimentado em iniciativas de solidariedade e diálogo com a categoria e a população. Em Pernambuco, o Sindipetro PE/PB vem contribuindo com o Mãos Solidárias; No Rio de Janeiro uma parceria do Sindicato com o Instituto Federal Fluminense (IFF) vai produzir e distribuir sabonete líquido para a população em situação de vulnerabilidade, entre outras iniciativas. A FUP também pressionou a Petrobras para doar combustível para serviços essenciais, já que a empresa também precisava diminuir o estoque para continuar produzindo “nós falamos desde março que era para a Petrobras doar gasolina, diesel e gás para os setores essencial e agora ela anunciou que vai doar três milhões de litros de combustível para os órgãos públicos de saúde. A Petrobras precisa fazer o seu papel para contribuir no combate ao coronavírus”.
Ela ressalta que as iniciativas como a distribuição de cestas básicas tem o papel de unir os sindicatos e movimentos populares, especialmente os do campo, que produzem alimentos livres de agrotóxicos “Nacionalmente, temos parceria com Levante Popular da Juventude, Central de Movimentos Populares, Central Única das Favelas, Movimentos dos Pequenos Agricultores, Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, a Marcha Mundial das Mulheres... Todas essas parcerias têm potencializado nossas ações. Nós já tínhamos uma parceria na luta, mas essa relação econômica, de economia solidária para ajudar a população é um diferencial dessa articulação”.
Edição: Monyse Ravena