Maria Socorro Lima, mais conhecida como Dona Socorro, mora no Sítio Flamengo, na zona Rural de Garanhuns desde 1987. Na última semana ela sentiu uma das maiores tristezas de vida. Camponesa há 30 anos, dona Socorro viu a destruição de grande parte de seu plantio sendo feita por quem deveria a proteger, a Prefeitura Municipal de Garanhuns.
A trabalhadora rural conta que chegaram máquinas grandes, como tratores e retroescavadeiras, controladas por funcionários da Prefeitura de Garanhuns e destruíram não só a produção da sua terra, mas também da vizinhança. "Chegaram aqui e fizeram diversas humilhações com a gente, dizendo que essa terra não é nossa. Disseram que não iam mexer na minha terra, mas eles meteram o trator pra cima. Tamparam o poço da vizinha, tamparam uma nascente que a gente tinha e não sabe nem onde era mais, porque eles destruíram tudo", diz.
Organizações que atuam na região prestaram solidariedade à agricultora, como a Rede Agreste de Agroecologia de Pernambuco, que reúne diversas instituições sociais que atuam no Agreste de Pernambuco e que tem foco no desenvolvimento sustentável com base na agroecologia. É esta organização que organiza a AGROFEIRA, um espaço criado para fortalecer a produção agroecológica e a oferta à população de alimentos saudáveis, comercializados pelas famílias de agricultores familiares da região, local que Dona Socorro vende sua produção de alimentos.
A REAGRO manifestou repúdio ao ocorrido através de carta, que também foi assinada por diversos movimentos populares. O documento diz: "Diante desse arbítrio, violência, desrespeito e perseguição por parte da Prefeitura, a REAGRO reitera seu inconformismo com este fato absurdo e inaceitável e exige que autoridades dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário do município de Garanhuns se mobilizem a fim de colocar um freio nessa injustiça e obriguem a Prefeitura a corrigir os danos morais provocados (não só de agora) à Dona Socorro e os danos físicos sobre sua propriedade. Enfim, por questão de justiça, a Dona Socorro deve ser respeitada e seu ambiente de vida preservado. Isto é o mínimo que se espera de uma gestão pública responsável e comprometida com sua população".
O sítio do Flamengo fornece à população da região diversos tipos de frutas e verduras sem nenhuma adição de agrotóxico, todos são produzidos de forma agroecológica. "Todos os dias eu planto árvore, a gente se preocupa com o meio ambiente, sem preocupa com a saúde das pessoas e as autoridades não, pelo contrário, destroem tudo", ressalta a camponesa.
Para Uedislaine Santana, vice presidente da CUT PE e também agricultora familiar, que visitou o sítio após o ocorrido, este caso é mais um de violência contra os povos do campo. "Esta é uma ameaça e violência contra os trabalhadores e as trabalhadoras do campo, por parte do poder que se acha maior e melhor do que todo mundo e se sente no direito de invadir nossas terras e nos violentar de tantas formas. O poder público tem papel importante para legitimar a posse de terra para dona Socorro de usucapião, que já está na justiça há um bom tempo, mesmo morando no sítio há mais de 30 anos", reitera.
Em nota, a REAGRO também afirma que “Desde 2009, um processo de usucapião vem se arrastando na justiça. A prefeitura de Garanhuns já havia manifestado interesse em se apropriar dessa área e provocou para que o seu processo se deslocasse da Vara Cível para a Vara da Fazenda Pública”.
Procurada pela reportagem do Brasil de Fato Pernambuco para falar sobre o ocorrido no sítio e o processo, a Prefeitura Municipal de Garanhuns se pronunciou em nota, apontando que no local será construído o Loteamento Jardim Garanhuns. Sobre o ocorrido, a prefeitura afirmou que "Após visitas ao local onde encontra-se uma das áreas públicas daquele espaço, foi verificado que a altura do matagal existente não permitia o deslocamento de materiais de uso da topografia, apontando a necessidade da realização de limpeza em local específico. A Secretaria de Desenvolvimento Rural e Meio Ambiente (SDRMA) não identificou espécies arbóreas, cercas ou indícios de ocupação do solo que apontassem ali existir atividades agropecuárias ou agroecológicas, daí a efetivação dos serviços de limpeza pretendidos."
A nota também aponta artigos do Código Civil e da Constituição Federal que explicam que "os bens públicos em geral jamais serão objeto de usucapião, nem móveis, nem imóveis, sejam de uso comum do povo, de uso especial ou dominicais". A Prefeitura disse estar aberta ao diálogo com a população e que "as famílias que se apresentam como 'posseiras' daquelas terras, podem procurar o setor de obras competente, na Secretaria de Obras e Serviços Públicos, ou a Secretaria de Planejamento e Gestão, para assim, obter maiores esclarecimentos sobre as ações em execução".
Edição: Vanessa Gonzaga