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Coluna

A Lava Jato e o Tribunal de Exceção para perseguir políticos de esquerda

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A atitude da justiça do Rio de Janeiro tem por intento intimidar a advocacia criminal - Gustavo Conde
O autoritarismo e a criminalização da advocacia andam de mãos dadas

Na semana passada o braço da Operação Lava Jato no Rio de Janeiro deflagrou uma nova fase da Lava Jato denominada de “Operação S” que teve como alvo escritórios de advocacia. A decisão que autorizou as buscas e apreensões em diversos escritórios e na residência de advogados se baseou na deleção premiada de um criminoso confesso, Orlando Diniz, ex-presidente do Sistema S do Rio de Janeiro. A delação vinha sendo tentada por Orlando Diniz desde 2018, mas apenas após suas acusações contra os escritórios de advocacia é que foi homologada, ou seja, aceita pelo juiz. Além disso, após a homologação, foi concedido ao delator o direito de ficar com cerca de R$ 1 milhão de reais depositados em contas no exterior.

Surpreendentemente, as buscas e apreensões foram autorizadas pelo juiz Marcelo Bretas – juiz que compareceu, junto com Jair Bolsonaro, em atos públicos de cunho político-partidário – para acontecerem nos escritórios e nas residências de Cristiano Zanin e Roberto Teixeira, ambos advogados de Luís Inácio Lula da Silva. Os dois advogados também foram denunciados pelo Ministério Público Federal, tendo a denúncia sido aceita no mesmo dia em que foram autorizadas as buscas e apreensões.

Um primeiro ponto que chama atenção é que o Ministério Público Federal denunciou – e o juiz de direito aceitou a denúncia – mesmo havendo uma pendência de prova a ser produzida, as próprias buscas e apreensões. É que, conforme determina o Código de Processo Penal, em caso de inexistir prova suficiente para se justificar a denúncia, o Ministério Público deve requerer novas diligências e, apenas quando houver indícios firmes, mesmo que não absolutos, de responsabilidade criminal, a denúncia deve ser oferecida.

No caso em questão, a denúncia baseou-se única e exclusivamente na delação do próprio criminoso que, aliás, ainda guardará R$ 1 milhão de reais por sua delação. Embora as denúncias – e condenações – baseadas unicamente em delações sem provas sejam uma praxe na Operação Lava Jato, esperava-se que hoje em dia, após a própria operação ter sido internacionalmente criticada por seus excessos, abusos e injustiças, houvesse, no mínimo, maior cuidado técnico nas suas investiduras políticas.

O fato do Ministério Público ter oferecido a denúncia e o juiz de direito a aceitado, para, apenas depois, determinar a produção de provas que poderiam – ou não – dar maior firmeza às acusações formuladas, demonstra que o interesse político de utilizar a Lava Jato como um verdadeiro Tribunal de Exceção para perseguir políticos de esquerda e acabar com o direito de defesa no Brasil permanece vivo e não se constrange com as críticas mundiais.

O segundo ponto é o contorno antidemocrático que o sistema de justiça brasileiro adota nos últimos anos. As buscas e apreensões, violando o espaço da advocacia, bem como os grampos no telefone e a quebra de sigilo fiscais e bancários de escritórios que fazem a defesa dos acusados pela Lava-Jato, remontam aos tempos da ditadura militar. Ali, sem que houvesse qualquer prerrogativa constitucional e funcional, os advogados, especialmente aqueles que faziam a defesa no âmbito do direito criminal, foram perseguidos, vigiados, tiveram as suas correspondências interceptadas e seus telefones grampeados.

Uma das primeiras ações em uma ditadura é restringir ou aniquilar o direito de defesa. Para governos autoritários, a democracia e o pluralismo são inimigos mortais. Atacar a advocacia é atacar quem, constitucionalmente, tem o dever de proteger e garantir que todos sejam julgados de acordo com a lei. A atitude da justiça do Rio de Janeiro – que, não à toa, veio das mãos de um juiz que já foi visto diversas vezes na companhia de Jair Bolsonaro – tem por intento intimidar a advocacia criminal, justamente aquele responsável por frear os instintos repressivos, sádicos e narcísicos de autoridades que, no lugar de perseguir a justiça, perseguem o poder e a fama.

Os excessos e os abusos da operação Lava Jato vem, a muito, sendo apontados pelos mesmos advogados que hoje se tornaram réus. Nada poderia ser mais simbólico do que isso para comprovar que o autoritarismo e a criminalização da advocacia andam de mãos dadas. Aos demais advogados que até hoje recusam-se a ver o viés ditatorial, autoritário e antidemocrático da Lava Jato e de Jair Bolsonaro, fica aqui o alerta de cuidado. Os próximos podem ser vocês.

Edição: Vanessa Gonzaga