“Quando sento quieta para costurar uma roupa velha ou levanto a enxada para devolvê-la de novo ao chão, abrindo covas, arrancando as raízes das plantas, é que esse fio, que tem sido meu pensamento, vai se fazendo trama”.
Hoje é difícil falar de literatura contemporânea Brasileira, ou do nascimento de clássicos, sem falar de Itamar Vieira Junior. É imprescindível indicar Torto Arado para materializar o encanto e a peleja dos nossos. Bordando o sertão baiano junto aos curandeiros, a ancestralidade e a luta pela terra, é tecida a história das irmãs Bibiana e Belonísia com a máquina de costura -ou de escrever- primorosa dos que entendem o trabalho como algo que modifica e molda uma sociedade. É nesse ambiente de trabalho em troca de moradia, água, comida, os retirantes que de quando em vez enxergamos como passado, pungentemente dilacera o romance com problemáticas atuais e urgentes, porque são antigas e perduram, mas também por serem do povo.
Cenas do âmbito mágico, encantado ou místico se entrelaçam com a realidade concreta das curandeiras, rezadeiras e da fé materializada na figura de Donana. É fascinante enxergar, conhecer, o poder das ervas e o respeito a ancestralidade, quando é passado o posto a Zeca Chapéu Grande seu filho, praticante do Jarê, uma religião de matriz africana, mais especificamente um candomblé de caboclo, que se expressa intensamente e exclusivamente na Chapada da Diamantina na Bahia.
Um romance primoroso, de uma sabedoria e escrita instigante que não caberá nesta indicação, muito menos neste período histórico. Revisitar o Torto Arado de nossa história, de nosso passado-presente é um dever cotidiano que Itamar nos presenteia em momentos de recuo para pensar e aprofundar o vivido. Torto Arado é uma leitura fascinante e viva, assim como a nossa luta por terra, trabalho, dignidade... por dias melhores.
*Louise Xavier é estudante e militante do Levante Popular da Juventude
Edição: Vanessa Gonzaga