Neste dia 20 de novembro é celebrado o dia da Consciência Negra no Brasil. Para entender a importância e o porquê da data, além de compreender a trajetória do Movimento Negro Unificado em Pernambuco, o Brasil de Fato Pernambuco conversou com o poeta, escritor, psicólogo e professor Lepê Correia, que também pesquisador da cultura afro e doutorando em Educação na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Lepê nos conta sobre os ganhos da luta antirracista e quais são os próximos passos. Confira:
Brasil de Fato Pernambuco: A partir de quando o movimento negro passa celebrar essa data e por quê?
Lepê Correia: Nos anos 90, foi sugerido o Dia Nacional da Consciência Negra. O objetivo não era comemorar, mas lembrar que foi o dia em que as forças do Estado brasileiro conseguiram destruir Palmares e assassinar o seu maior líder, Zumbi. O 20 de novembro surge para que possamos fazer uma reflexão sobre isso e homenagear ele que está no livro do Panteão da Pátria da Liberdade Tancredo Neves, que diz que Zumbi dos Palmares é o libertador. Precisávamos de um referencial, e ele é o primeiro herói pan-africano. A data nasce para que possamos nos juntar em torno dela para fortalecer a luta dos movimentos negros. Digo movimentos negros porque o movimento negro nasce no Brasil em 1978, mas só se unifica mais tarde. Então o dia 20 de novembro é um dia de luta, mais um dia de luta contra o racismo no Brasil.
BdF PE: Você vivenciou e até hoje organiza uma grande parte das lutas do movimento nacionalmente e aqui em Pernambuco. Quais foram as lutas que mais te marcaram nesse processo?
Lepê: Em 1979 o movimento chega em Pernambuco e nos juntamos aqui no Diretório Central dos Estudantes (DCE) da Universidade Federal de Pernambuco. Nos reunimos pra fazer as primeiras reuniões para discutir as questões do racismo, do negro, do negro desempregado, do negro trabalhador, do negro precarizado. A gente se junta ainda com um nome de CECERNE (Centro de Cultura e Emancipação da Raça Negra). E aqui começamos a discutir essa coisa da negritude e com manifestações culturais. E aí a gente vai de CECERNE, vira Movimento Negro do Recife (MNR), para depois ser MNU.
BdF PE: 2020 foi repleto de episódios muito cruéis do racismo, mas também de muita luta organizada; acabamos de sair de um primeiro turno de eleições onde há um percentual considerável de candidaturas negras eleitas. Qual é o balanço que você faz do ano em relação a luta antirracista? Ela cresceu ou perdeu espaço na sociedade?
Lepê: Perdeu espaço? Como? Ela é o Sankofa, aquele pássaro que está com a cabeça virada para trás, mas as patas do pássaro estão caminhando para frente. Estamos, baseados na luta ancestral, caminhando pra frente, ocupando os espaços. Essas candidaturas negras são frutos de todo um trabalho que vem sendo plantado desde os final anos 70, quando os movimentos negros nascem no brasil, nessa nova versão; porque digo que o movimento negro no brasil sempre houve. Essas candidaturas que ganharam, mesmo aqueles que não ganharam, já se afirmaram, como lideranças e pessoas que podem organizar o povo em torno da luta pela igualdade de direitos, racial e a luta antirracista. Não perdemos espaços, ganhamos. A luta continuou, não esmorecemos, apesar da opressão, da morte, das chacinas.
BdF PE: Quais as perspectivas e desafios da construção das lutas antirracistas aqui no estado nesses próximos períodos?
Lepê: Na agenda do MNU tem a Caminhada de 1 Milhão, que acontece em março do próximo ano. Um milhão de negros caminhando em direção a Brasília. Além disso, pros anos seguintes continuaremos com a questão da literatura; ocupando os espaços nas universidades; com a promoção da cultura; com as candidaturas coletivas e com essa luta contra a discriminação religiosa. E principalmente dando formação e capacitação ao nosso povo para que possamos mais e mais avançar nessa luta por igualdade. Não queremos tomar o lugar de ninguém, destituir a cultura de ninguém, só queremos dizer que nenhuma cultura tem o direito de querer negar a cultura do outro. Construímos esse país e vamos continuar nesse trabalho de construção a partir das nossas caras e das nossas identidades.
Edição: Monyse Ravena