O 1º de maio nos convoca para cuidarmos da vida, da segurança e da saúde das pessoas
A tragédia da pandemia escancara para todo mundo ver que a divisão de classes é cada vez mais forte. Não é por acaso que, no Brasil, a partir de março de 2020, o desemprego atingiu mais de 15 milhões de brasileiros/as e 20 milhões se situam abaixo da linha da pobreza. No entanto, na mesma época, o lucro da elite mais rica do país triplicou.
Na Europa, no início dos anos 80, analistas sociais escreviam que se a taxa de desemprego chegasse a 8%, a sociedade não aceitaria e haveria uma convulsão social grave. Hoje há países como a Grécia, a Espanha e mesmo a Itália, onde a parcela de desocupados chega a quase 30% e não acontece nada. Na sociedade atual, quem perde o emprego sabe que não se trata de uma situação passageira. O desemprego se tornou estrutural. As empresas são consideradas sadias e lucrativas quanto menos empregados contratarem. E isso é visto como normal ou inevitável.
A maioria dos meios de comunicação apregoa o neoliberalismo como dogma. A exclusão social da imensa maioria das pessoas se apresenta como sacrifício inevitável e positivo do progresso. O objetivo é o lucro das empresas a qualquer custo. Os patrões se protegem da pandemia, mas as empregadas domésticas e todos/as os/as trabalhadores/as têm de assumir os riscos de viajar em ônibus lotados e garantir o lucro dos patrões.
O Capitalismo continua em seu afã de manter os organismos do Estado a seu serviço, de considerar a natureza como mercadoria a ser explorada e encontrar formas novas de explorar o trabalho dos outros.
Nestes dias em que a educação e muitas atividades são reduzidas ao trabalho virtual, as empresas de educação exploram o trabalho dos/as professores/as até a última gota de sangue e nem sempre pagando horas extras. Quem assessora grupos sabe que as pessoas simplesmente pedem lives e videoconferências, muitas vezes, sem se darem conta de que isso é um trabalho que exige mais de quem o faz do que os encontros presenciais. Nestes tempos de pandemia, o trabalho virtual começa a tomar, em alguns casos, a configuração quase de trabalho escravo não remunerado, mais exigente e pesado do que as formas clássicas de emprego.
É verdade que em um mundo de trabalho virtual e no qual todas as profissões sofrem a ameaça de ceder espaço para a revolução digital, o 1º de maio tem de ser celebrado de modo diferente do que era nas décadas de grandes passeatas e concentrações. É mais importante do que nunca mostrar que não existe a alternativa entre salvar a vida das pessoas ou salvar o comércio. Além do fato de que, a longo prazo, isso é falso, ao assumir abertamente a cara desumana do sistema que põe o lucro acima da vida, a sociedade dominante se revela mais assassina do que o vírus.
Infelizmente, a ideologia neoliberal penetrou até nos ambientes das Igrejas e religiões. Na encíclica sobre a fraternidade universal, o papa Francisco propõe que se passe do mundo dos sócios ao mundo de irmãos e irmãs (FT 101). Neste contexto, o 1º de maio não pode ser apenas o dia do trabalho, como se fosse uma data para acentuar o valor do trabalho. É a pessoa dos/das trabalhadores/as que deve merecer atenção e cuidado e não só como pessoas individuais e sim como categorias e coletivos.
O 1º de maio nos convoca para cuidarmos da vida, da segurança e da saúde das pessoas. Quem é cristão recorda que o evangelho chama Jesus de carpinteiro ou artesão, termo usado na época para qualquer trabalhador braçal. Assim, os homens e mulheres que hoje assumem a missão de participar da caminhada coletiva do mundo do trabalho sabem que ao lutar pacificamente para transformar esse mundo estão sendo testemunhas de que o reinado divino está vindo e Deus está presente na luta do povo pela justiça e pela paz.
As opiniões contidas nesta coluna não refletem necessariamente a opinião do jornal
Edição: Vanessa Gonzaga