Só não vale atrapalhar quem tá se organizando para distribuir comida para quem tem fome
Esta semana, centenas de pessoas com dificuldades para comprar comida na comunidade de Santa Luzia estão podendo fazer as três refeições gratuitamente. Isso porque a turma do MTST juntou-se com o pessoal da comunidade e ocupou um terreno e, literalmente da noite para o dia, montou lá sua 9ª Cozinha Solidária do Brasil, a primeira em Pernambuco.
Só no primeiro dia foram 200 almoços e a mesma quantidade de porções de canja de galinha no jantar. A cozinha funciona a partir de alimentos doados e com o trabalho voluntário de gente como você, que se interessa por amar e mudar as coisas. Esse amor todo enche quentinhas de arroz, feijão, charque, macarrão, peixe, carinho, solidariedade e outras coisas sobre as quais não se bota preço.
Quem faz fila para receber as quentinhas é gente trabalhadora. Gente humilde, gente como tanta gente que tá afetada pela crise. Gente feito o comerciante informal Roberval, que viu as vendas caírem com a pandemia. Ou Claudimary, catadora de material reciclável. Guerreiras feito Elizama, que é técnica de enfermagem desempregada que tem se virado com a venda de tapiocas no bairro mesmo. Gente que precisa de uma mão para lidar com a carestia e que tem feito o que pode para não entrar nas estatísticas da fome no Brasil. Não custa lembrar: atualmente, mais da metade da população não tem segurança alimentar, enquanto 19,1 milhões literalmente passam fome.
A área ocupada já serviu de laboratório para soluções urbanísticas sustentáveis há mais de dez anos. Também foi local de triagem de material reciclado para uma cooperativa vizinha que, em outros tempos, também realizava atividades por lá. Atualmente, porém, não tinha nada nada nada. Para poder ocupar, o movimento limpou, capinou, tirou lixo, mato e está pintando algumas edificações que existem no local.
A Prefeitura do Recife, proprietária do terreno, apareceu por lá logo no primeiro dia. Primeiro com a Guarda Municipal, depois com a secretaria de Governo. Dizem que aceitam ‘negociar’ desde que o MTST desocupe o local. Naturalmente, o movimento se nega a sair e conta cada vez mais com o apoio da vizinhança. A conversa ainda não acabou, talvez ainda seja cedo para afirmar com certeza que haverá acordo sobre o uso solidário do terreno abandonado. Mas já dá para dizer que a cozinha tá bombando, que a militância tá chegando junto e que muita gente do bairro tá aplaudindo.
O que se espera do Poder Executivo é respeito. Se não têm projeto para o lugar, que garantam a segurança do uso coletivo e a ativação por conta da comunidade. Isso vale não apenas para o movimento, mas para todos os grupos da comunidade que tenham interesse em realizar atividades culturais, cursos, arrecadação e distribuição de alimentos e o que mais possa ser feito.
A Prefeitura tem projeto? Que mostre, que discuta, que assuma compromissos e mostre o calendário da licitação, da ordem de serviço. Que aceite sugestões e que se inicie a revitalização da área com vistas ao bem de toda a comunidade. A área é grande e lá dentro vale muita coisa. Só não vale atrapalhar quem tá se organizando para distribuir comida para quem tem fome.
As opiniões contidas nesta coluna não refletem necessariamente a opinião do jornal
Edição: Vanessa Gonzaga