Dados da Fundação João Pinheiro apontam que, no Brasil, existe um déficit habitacional para atender as quase seis milhões de famílias. o número engrossa com a pandemia, aumento do desemprego e redução do valor do auxílio emergencial. Muitas pessoas encontram abrigo nas Ocupações, onde para além de um teto e comida, também acham proteção contra o coronavírus. Mas há outra ameaça por perto: a possibilidade de despejo. Confira a reportagem:
Isso ocorre na Ocupação Vila Claudete, no Cabo de Santo Agostinho, localizado na Região Metropolitana do Recife; onde 1.200 famílias vivem nas casas de um conjunto habitacional da Prefeitura e da Caixa Econômica Federal, que estavam desocupadas e sem função social desde 2016. “A gente não tem para onde ir, a verdade é esta, a gente não tem para onde ir. O Governo oferece, o que eu acho um absurdo, um auxílio moradia de R$150,00, que não é nada, não é nada mesmo, não é nem uma ajuda, não é nem metade de um aluguel para quem não pode pagar, para quem é pai e mãe de família e está desempregado”, afirma Eduarda Vitória, moradora da ocupação Vila Claudete há um ano, junto com seu esposo e seu filho.
Para tentar garantir a permanência no local, os ocupantes foram às ruas pedir para terem onde morar, inclusive até a porta da prefeitura e da Caixa. O Movimento de Trabalhadores e Trabalhadoras por Direitos (MTD) se somou à luta para cobrar que não aconteça o despejo durante a pandemia, como explica Pedro Henrique Reinaux, integrante do Movimento. “A gente enquanto MTD chega procurado pelas famílias e chega junto com esse objetivo de garantir o direito à moradia e a gente precisa entender que a moradia não é só ter a casa; é ter assistência básica, é ter alimentação, é ter auxílio, é ter renda, é ter um agente de saúde passando na casa, é ter posto de saúde, é ter emprego, é ter um trabalho decente. E aí a gente chega mais para tentar somar com essa articulação, né? Tanto na articulação do direito humano à moradia, mas com a moradia dia digna, que é um direito humano para todo brasileiro”, afirma.
Por outro lado, existem diversas Ocupações que vem sofrendo com ações de despejo. O acampamento Bondade, em Amaraji, na zona da Mata Sul de Pernambuco, não resistiu, apesar da luta. Jaime amorim, dirigente do Movimento dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais Sem Terra (MST) relata a violência do despejo. “Nós tínhamos lá mais de 250 famílias acampadas, nós estamos falando de famílias, estamos falando aí de aproximadamente 1.000 pessoas que viviam direta ou indiretamente do Acampamento. As famílias já estavam se organizando para produzir, as imagens mostram que nós já tínhamos plantado e produzido bastante. Já estávamos iniciando o processo do inverno, da chuva, e o pessoal ia plantar bastante. Bom, e com o despejo, é terra arrasada. Vocês viram que houve uma parceria os capangas da usina, que foram na frente, e a Polícia Militar, que deu cobertura. Foi uma ação muito violenta”, avaliou o dirigente.
O tema não vem sendo debatido somente pelos movimentos populares e pela sociedade civil, mas também na esfera legislativa do governo federal e estadual. Sobre o tema, foi proposto o Projeto de Lei n°827 de 2020, que já foi aprovado pela Câmara dos deputados e está sendo debatido no Senado Federal; assim como há discussão na Assembleia Legislativa do Estado de Pernambuco (Alepe), através do Projeto de Lei nº 1010 de 2020. Mas já existe orientação do Supremo Tribunal Federal contra as decisões de despejo e reintegração de posse durante a pandemia. “A orientação do STF de não fazer a reintegração de posse durante a pandemia é pelo motivo fundamental, que é não fazer aglomeração, para não levar risco às famílias que estão lá, mas também às famílias de policiais que vão fazer a reintegração de posse. Então, em cima disso, o governador deveria ter suspendido a reintegração de posse”, ressalta Jaime Amorim.
Com isso, os moradores de ocupações, que ainda não possuem resposta quanto à reintegração de posse, convivem com a indignação e o medo de serem retirado do lugar que conhecem como casa, durante uma crise sanitária sem precedentes. “Eles querem fazer um extermínio da população, é inaceitável isso. A gente vai pra onde? Nós vamos para onde? Vamos para a rua? Pegar o vírus? O vírus está aí circulando para quem quiser, ainda mais com essas variantes que agora estão circulando, que é um perigo. E eu fico, assim, até comovida, porque eu vejo isso como se o governo tivesse querendo mesmo que o pessoal fosse pra rua se matar”, lamenta Eduarda.
A reportagem entrou em contato com o Governo de Pernambuco, com a Caixa Econômica Federal, com a Prefeitura do Cabo de Santo Agostinho, e com a Polícia Militar de Pernambuco. Mas não obteve resposta até o fechamento.
Edição: Monyse Ravena