É comum que, após as eleições municipais, alguns prefeitos e vices precisem lutar na Justiça para manter seus mandatos. As cidades cujos gestores eleitos têm seus mandatos cassados pela Justiça Eleitoral precisam passar por novas eleições. Entre a cassação do mandato e a realização do novo pleito, a prefeitura fica sob responsabilidade do presidente da Câmara de vereadores. Condenados ou inocentados em primeira instância, os casos quase sempre são decididos no Tribunal Regional Eleitoral (TRE). Em Pernambuco, a Zona da Mata se destaca como região com mais processos deste tipo.
Na Zona da Mata Sul do estado, o município de Joaquim Nabuco e seus 16 mil habitantes reelegeram o prefeito Antônio Raimundo Barreto Neto, o Neto Barreto (PTB), com 5,5 mil votos. Na noite daquele 15 de novembro de 2020 o vice-prefeito reeleito Eraldo Veloso (MDB) comemorou jogando notas de R$100 e R$50 de sua varanda para as pessoas na rua. Vídeos desse ato circularam bastante na internet e ganharam repercussão nacional.
A chapa adversária, encabeçada por Lírio Júnior (PSB), acionou a Justiça Eleitoral, acusando a chapa reeleita de compra de votos – através de dinheiro, promessa de emprego e terras. O dinheiro jogado da varanda, segundo a acusação, fora uma promessa de campanha do vice-prefeito. A 38ª zona eleitoral condenou a chapa, pedindo ainda inegibilidade de ambos por oito anos e pagamento de multa de R$20 mil. Neto Barreto (PTB) e Eraldo Veloso (MDB) recorreram ao Tribunal Regional Eleitoral (TRE-PE), mas também lá foram derrotados.
Em maio foi publicado o acórdão do TRE afastando prefeito e vice. O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) decidirá uma data para a nova eleição. Até lá, a prefeitura está sob responsabilidade do presidente da Câmara de vereadores, Charles Batista (SD), eleito com 377 votos e aliado do prefeito afastado Neto Barreto (PTB).
No município vizinho, Água Preta, de 37 mil habitantes, o prefeito Noelino Magalhães de Oliveira Lyra, ou apenas Noé (PSB), foi reeleito com 6.941 votos, apenas 75 votos a mais que o seu concorrente Tonhão (PROS). A eleição acirrada, no entanto, teve episódios que o Ministério Público Eleitoral (MPE) considerou inadequado.
Segundo o MPE, no mês de agosto, período pré-eleitoral, o prefeito candidato a reeleição promoveu sua festa de aniversário com a presença de artistas e na qual houve distribuição gratuita de bebidas à população. O procurador regional eleitoral Wellington Cabral Saraiva também afirma que durante a campanha o posto de combustíveis “Arca de Noé” teria sido amplamente utilizado em favor da candidatura, com distribuição de cestas básicas e brindes. A acusação também garante que o prefeito teria realizado limpeza de ruas e pago dinheiro em troca de votos.
O MPE acusa a chapa de Noé Magalhães (PSB) e do seu vice Neto Cavalcanti de ter praticado abuso de poder econômico e, considerando a pequena diferença de votos, o abuso teria sido decisivo para a vitória eleitoral. O juiz Rodrigo Ramos Melgaço, responsável pela 38ª zona eleitoral, avaliou que as condutas não eram suficientes para uma condenação. Mas o MPE recorreu e a decisão cabe agora ao Tribunal Regional Eleitoral (TRE-PE).
Enquanto um distribuiu cerveja, o outro distribuiu água. Em Maraial, município com 11,3 mil habitantes também na Zona da Mata Sul, a população não quis reeleger o prefeito Marquinhos Moura (PTB). O escolhido foi Sérgio da Silva, o Sérgio da Farinha (Avante). Ele e seu vice Ananias Santos (“Nia Filho”) foram eleitos com 2.598 votos (38,5%), apenas 85 votos à frente do candidato Marlos Cavalcanti (PSB). Mas o ex-prefeito Moura acionou o Ministério Público Eleitoral (MPE) contra Sérgio da Farinha.
Isso porque no dia 14 de setembro, duas semanas antes do início oficial da campanha eleitoral, o vereador Josivaldo Santos, o “Val do Gás” (PP), divulgou em suas redes sociais que estava realizando a distribuição de três mil litros de água potável para famílias do município, escrevendo ainda que o “amigo Sérgio da Farinha” era um dos financiadores daquele caminhão pipa. Semanas depois, durante a campanha, o mesmo vereador gravou vídeo em que afirma que Sérgio da Farinha e Nia Filho teriam pago pela construção da ponte que liga Maraial ao distrito de Sertãozinho. O agradecimento pela obra é acompanhado de slogans de campanha.
Sérgio da Farinha venceu, já Val do Gás teve apenas 190 votos e não conseguiu ser reeleito, mas o prefeito o nomeou para a Secretaria de Saúde. A ação do ex-prefeito contra o atual prefeito ganhou reforço do MPE, já que o procurador regional eleitoral Wellington Cabral Saraiva considera que as ações na pré-campanha e campanha configuram “abuso de poder econômico” e, portanto, os diplomas do prefeito e do vice devem ser cassados. Mas o pedido foi considerado improcedente pelo juiz Fernando Jefferson Cardoso Capette, da 43ª zona eleitoral. O ex-prefeito Marquinhos Moura recorreu e o caso está nas mãos do TRE-PE.
Também na Mata Sul, o município de São José da Coroa Grande reelegeu seu prefeito Jaziel Gonsalves Lajes, o Pel Lajes (CD), que desta vez tem como vice Bruna Suelem Alves. Eleito em 2016 pelo Patriota, desta vez Lajes se candidatou pelo Cidadania e formou uma coligação que reuniu do PSC ao PCdoB. Entre os 21,3 mil cidadãos de São José, o prefeito Pel Lajes conquistou 5.665 votos (44,6%), o suficiente para vencer dois ex-prefeitos na disputa. Mas o candidato José Barbosa Andrade (PSD), que teve mil votos a menos, acionou a Justiça Eleitoral.
De acordo com a denúncia, durante a campanha o prefeito teria mandado mensagem de áudio no whatsapp para um servidor público oferecendo-lhe “vantagens” em troca do voto. O juiz Rodrigo Caldas do Valle Viana, da 42ª zona eleitoral, considerou procedente o pedido de cassação dos diplomas do prefeito e da vice e o pedido de inegibilidade de oito anos do prefeito Jaziel Lajes (CD). O acusado recorreu à segunda instância e segue no cargo enquanto aguarda julgamento do caso no Tribunal Regional Eleitoral (TRE-PE). Se confirmado o afastamento, o presidente da Câmara assume o Executivo e é convocada uma nova eleição.
Ainda na Zona da Mata, mas ao norte, o município de Nazaré da Mata, com 32,5 mil habitantes, também pode passar por novas eleições. Isso porque o prefeito reeleito Inácio Nascimento, o Nino (SD), teria praticado “abuso de poder político” ao conceder aumento salarial para servidores municipais. A acusação parte do seu adversário Egrinaldo Coutinho, o Nado (PTB), que teve 350 votos a menos que Nino, mas teve sua candidatura impugnada pela Justiça Eleitoral. O Ministério Público Eleitoral (MPE) deu razão à acusação de Nado (PTB) contra Nino (SD).
O procurador regional Wellington Saraiva, do MPE, considera que os aumentos efetuados através de três leis municipais aprovadas ainda no primeiro semestre, são aumentos acima da inflação. O prefeito Nino defende que as leis municipais, além de terem sido editadas antes do período vedado pela legislação federal (Lei 9.503), elas não tratam reajustes salariais. O MPE insiste que sim, acusando o prefeito de haver oferecido aumentos salariais através de benefícios diversos. Saraiva usa como exemplo o adicional de insalubridade concedido aos agentes comunitários de saúde por estarem atuando durante a pandemia. Mas o adicional foi concedido não de maneira provisória, mas permanente, o que na avaliação do MPE é um aumento de remuneração.
O Brasil de Fato Pernambuco entrou em contato com as prefeituras de todos os municípios citados na matéria. Até o momento nenhuma das prefeituras respondeu aos questionamentos. Em outras regiões do estado há outros municípios com prefeitos que estão respondendo na Justiça pelo direito de continuarem nos seus cargos, a exemplo do prefeito Luiz Aroldo (PT), de Águas Belas, no Agreste do estado. Mas nesta matéria optamos por focar na Zona da Mata.
Edição: Monyse Ravena