Pernambuco

VIOLÊNCIA NO CAMPO

ONU investiga uso de agrotóxicos como arma em conflitos territoriais da Mata Sul

Após não obter resultados judicialmente, o conflito tem dossiê escrito pela FIAN Internacional e é investigado pela ONU

Brasil de Fato | Recife, PE |
Na região, são cerca de 1.500 famílias que vivem sob tensão e ameaças - CPT PE

Desde 2015, a empresa IC Consultoria em Empreendimentos Imobiliários reclama o arrendamento das terras da antiga Usina Frei Caneca, na zona da Mata Sul de Pernambuco, que fechou há mais de duas décadas, sem ter pago as verbas rescisórias para seus trabalhadores. Sem ter acesso aos seus direitos, as famílias que já moravam no local passaram a utilizar da agricultura familiar para garantir a sua subsistência. Confira na reportagem:

Mas, desde 2020, os moradores das comunidades de Fervedouro e Barro Branco, no município de Jaqueira; e Batateiras, no município de Maraial, que fazem parte do território da antiga usina, denunciaram que aviões tem despejado agrotóxicos em suas terras. 

“O que está em jogo é a vida das pessoas e do meio ambiente. Então, se a gente tem um meio ambiente doente, as pessoas estão doentes, as pessoas vão morrer e isso é crime - crime ambiental, crime contra a saúde das pessoas. Então, tem que ser denunciado, tem que ser exposto e não pode ficar por isso. E tem responsabilidades desde quem está botando lá, desde o estado de Pernambuco, o Estado brasileiro. Alguém tem que ser responsabilizado por isso”, analisa Cícera Nunes, presidenta da Federação dos Trabalhadores Rurais e Agricultores e Agricultoras Familiares do Estado de Pernambuco (FETAPE).

O conflito territorial chegou à Organização das Nações Unidas (ONU), que começou uma investigação sobre o caso, após um dossiê sobre o uso de agrotóxicos em ataques químicos contra os camponeses elaborado pela Organização pelo Direito Humano à Alimentação e à Nutrição Adequadas (FIAN Internacional) e FIAN Brasil, que monitora violações de direitos humanos junto a determinadas comunidades e grupos populacionais.

“A  importância da ONU tomar conhecimento é porque há uma falta de mobilidade de resposta por parte do governo, por parte da polícia, por parte da justiça, e as pessoas estão aí há 60, 70 anos na posse da terra, judicialmente elas tem direito à terra, constitucionalmente elas tem direito à terra, mas isso não é reconhecido pela justiça e muito menos reconhecido como direito dela, porque quando ela tenta exercer esse direito, ela é tratada como segunda classe de cidadão. É essa falta de visibilidade que nós queremos superar, talvez com a pressão internacional o governo brasileiro faça alguma coisa”, comenta Flávio Valente, da FIAN Internacional. 

Os agrotóxicos impactam não só na produção, mas também na saúde das 1.500 famílias camponesas que moram e trabalham no local. “Essas famílias que estão hoje posseiras são quem sustentam os municípios onde elas estão e esses alimentos são em sua maioria agroecológicos, ou seja, eles não usam (agrotóxicos), mas as empresas sim”, comenta presidenta da FETAPE. 

A reportagem entrou em contato com a Polícia Militar de Pernambuco e a empresa IC Consultoria em Empreendimentos Imobiliários, mas não obteve respostas até o fechamento desta matéria.  O conflito está em tramitação na Justiça Criminal e na Procuradoria Agrária do Ministério Público de Pernambuco.
 

Edição: Vanessa Gonzaga e Rani de Mendonça