Perdura ainda o forte impacto e enfraquecimento dos sindicatos de servidores públicos
Já discutimos em colunas anteriores o risco trazido pela PEC 32/2020, a dita Reforma Administrativa, contra o serviço público e contra os direitos mais básicos dos servidores e servidoras públicos. Com o texto original enviado para o Congresso Nacional pelo próprio governo Bolsonaro, sob a falsa promessa de “modernizar” o funcionamento da Administração Pública, essa redação da PEC foi alterada diversas vezes nos debates da Comissão Especial instalada na Câmara de Deputados, de forma que foi aprovado em votação no dia 23 de setembro um texto substitutivo com uma série de mudanças.
Desde então, a proposta da Reforma Administrativa está pronta para votação no Plenário da Câmara, não tendo ainda sido colocada em pauta, em grande medida devido a intensa mobilização feita pelo movimento sindical, mas com perspectivas de entrar entre os dias 19 e 21 de outubro.
Nesta coluna, temos o objetivo de expor as principais diferenças entre o texto original apresentado pelo Governo e o substitutivo aprovado na comissão especial e que irá à votação no Plenário.
Estabilidade dos servidores públicos
No texto inicial da PEC, era restrita aos ocupantes dos chamados cargos exclusivos de Estado, uma espécie de elite do serviço público, restrita a alguns cargos específicos mais ligados às atividades de fiscalização, diplomacia, advocacia pública, Ministério Público, Judiciário, Legislativo e segurança pública, após o tempo de vínculo de experiência, de forma que os demais servidores poderiam ser demitidos a qualquer hora.
No texto aprovado na Comissão Especial, é mantida a estabilidade a todos os servidores concursados, porém se flexibiliza essa garantia na medida em que se aumenta as hipóteses de perda de cargo e mesmo se amplia as formas de contratação temporária.
Alteração da organização da Administração Pública pelo Presidente
Na proposta do governo, era possível através de mero decreto, sem qualquer controle legislativo, o Presidente da República extinguir cargos e funções sem a realocação dos servidores que atualmente os ocupam, sendo exonerados; transformar cargos efetivos vagos em cargos comissionados; extinguir e fundir órgãos, autarquias e fundações públicas. Hoje, todas essas são atribuições do Poder Legislativo.
Já no texto aprovado na Comissão e que vai à votação no Plenário, essa prerrogativa via decreto presidencial foi alterada, de modo que passou a ser previsto a possibilidade de a União, através de lei ou medida provisória, estabelecer normas gerais sobre criação e extinção de cargos; sobre concurso público e critérios de seleção e requisitos de cargos comissionados; políticas remuneratórias, estrutura de carreiras e concessão de benefícios; normas sobre a contratação temporária, dentre outras.
Redução de jornada e salário de servidores públicos
Na proposta inicial, havia uma permissão genérica que seria objeto de regulamentação em lei posterior sobre redução da jornada de trabalho e remuneração, sendo vedada a sua aplicação apenas aos ocupantes de cargos exclusivos de Estado.
No texto atual que vai à votação no Plenário, essa vedação persiste, porém a possibilidade de redução passou a ficar prevista para os períodos de crise fiscal, com comprometimento de 95% das receitas correntes com despesas públicas, de modo que seria autorizada a redução de até 25% dos salários e jornada de trabalho dos servidores.
Persiste, do ponto de vista geral, o sucateamento do serviço público, ao ser mantida a previsão de ser possível a transferência ilimitada de atividades e serviços públicos para a iniciativa privada, inclusive empresas e entidades com fins lucrativos, através da celebração dos “instrumentos de cooperação”. Se mantém esse sucateamento na possibilidade de contratação temporária por mera seleção simplificada em todos os cargos e funções públicas, como limite de prorrogação de dez anos, sendo essa previsão mantida do texto original.
Perdura ainda o forte impacto e enfraquecimento dos sindicatos de servidores públicos, na medida em que haverá uma maior fragmentação e esvaziamento de suas bases sindicais, pois estar no serviço público com vínculo efetivo será uma exceção em face do que será regra: os contratos temporários e a sua terceirização para iniciativa privada.
É contra essa privatização e redução do Estado brasileiro para as políticas sociais que se precisa lutar nas próximas semanas.
As opiniões contidas nesta coluna não refletem necessariamente a opinião do jornal
Edição: Vanessa Gonzaga