Não ficaremos calados diante de imagens de pessoas revirando ossos para se alimentar
O Brasil de Bolsonaro é o país da fome. A cada dia em que vamos aos supermercados, vamos apreensivos se precisaremos reduzir a quantidade de carne que vamos levar para nossas casas. Quando a fome é senhora de um país, temos uma cultura de morte e violência ditando todas as nossas relações.
Segundo o IBGE, o número de cidades que têm favelas duplicou em todo o território nacional durante os últimos 10 anos. São mais de 13 mil favelas no Brasil de 2021. A favela é um território fundado pelo povo negro, são quilombos urbanos onde a comunidade negra e periférica vai criando ferramentas de resistência. O crescimento de favelas e o crescimento da fome, nos indica que o povo das periferias brasileiras têm lutado sistematicamente contra o bolsonarismo e seu legado de miséria.
A fome é um processo político, planejado às custas de muita exploração e acúmulo. Ela, no Brasil, se materializa no povo negro, historicamente excluído dos lugares de humanização da sociedade, como a execução de um grande plano de morte. Por isso, Carolina de Jesus afirma que o Brasil precisa ser dirigido por uma pessoa que já passou fome.
É inadmissível vermos a história de Rosângela Sibele, presa por roubar R$ 21,69 em alimentos em um supermercado de São Paulo. Após 18 dias presa, ela, ao sair da prisão, afirmou: “Meu sonho é ser gente”. Esse projeto de país rouba nossa humanidade, rouba nosso direito de ser gente, de não precisar sermos presas por roubar algo que na verdade é nosso direito. Comer é direito de todo ser humano, se isso nos é negado, então é porque o governo desse país não nos considera gente.
Estamos em um país em que, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) Contínua, quase 50% das crianças vivem na pobreza e mais de 24 milhões de pessoas não sabem se vão comer alguma coisa durante as 24 horas do dia. O mais escandaloso é que durante o governo Bolsonaro mais de 2 milhões de famílias entraram na extrema pobreza.
Percebemos aqui que o governo brasileiro é um dos maiores fabricantes de pobreza e fome do mundo. Existe uma lógica desumanizadora que gera desempregados, flexibiliza as condições de trabalho, diminui os postos de trabalho com carteira assinada. A terceirização do trabalho é uma realidade. Estamos trabalhando mais e ganhando menos, isso faz o país parar, os postos de trabalho desaparecerem. Estamos diante de um governo neoliberal que não investe no povo e que enxerga tudo como um grande gasto. O custo Bolsonaro é alto: o gás, a gasolina, a carne e tantos outros produtos já não cabem mais em nossas realidades. A gestão bolsonarista da pandemia custou milhares de vidas, congelou nossa distribuição de renda e nos fez escolher entre a vida e a “economia” do país.
Portanto, é importante lembrar o grito do nosso povo: nós queremos ser gente! E não seremos gente enquanto estivermos morrendo de bala, de fome e de covid-19. Não por acaso o movimento negro brasileiro reafirmou durante a pandemia que o povo negro quer viver, pois enquanto a gente diz que sonha em ser gente, Bolsonaro diz que o país que ele quer construir nos desumaniza e nos empobrece.
Nós escolhemos viver, resistir e subverter as lógicas e estruturas que tentam nos encarcerar, nos exterminar e nos silenciar. Assim como Rosângela, nós só queremos ser gente. Não aceitaremos retroceder, não ficaremos calados diante de imagens de pessoas revirando ossos para se alimentar em um dia qualquer nesse país. Exigimos que nos tratem como gente que lutamos todos os dias para existir nesse mundo.
Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato Pernambuco.
Edição: Vanessa Gonzaga