Cerca de 50 famílias agricultoras do município de Itambé, na zona da mata norte de Pernambuco, podem ser despejadas de um território onde moram e produzem alimentos há mais de 10 anos. A maior parte deles é de ex-trabalhadores do Engenho Aliança, do grupo Cruangi, que teriam sido dispensados em 2011 sem o recebimento dos direitos trabalhistas.
Grimauro Gomes de Freitas trabalhou na Usina Aliança a partir dos 12 anos e permaneceu no local após o seu fechamento. Hoje, aos 53 anos, é agricultor familiar e presidente da Associação de Agricultores e Agricultoras Familiares do Engenho Gongo. “Nós temos uma história de vida lá. Nós demos nosso sangue, nossa vida, temos a história da nossa família... construímos um grande amor pela terra - paixão pela terra. Então, a gente tem esse caráter de resgatar o nosso passado, não só a questão dos bens materiais, mas a nossa cultura. Não tem outra saída para o agricultor, a única saída é a terra”, afirma o agricultor.
Um processo de usucapião tramita na justiça de Itambé para garantir a permanência das famílias que estão no local desde o fechamento da usina, em 2011. Mas, em abril deste ano, a propriedade das terras foi transferida pelo juiz da comarca de Timbaúba para Marcelo Petribu. Ele faz parte da família proprietária da Usina Petribu e é credor da Usina Aliança.
“O juízo da comarca de Timbaúba recentemente, em abril deste ano, autorizou que a Usina fizesse uma dação em pagamento de dois de seus bens para este credor que é Marcelo Petribu e aí a justiça autorizou e foi feito o processo de transferência”, explica o advogado e vereador de Itambé oelo Partido dos Trabalhadores (PT), Ronaldo Fernandes, que acompanha a disputa desde o início.
“Aí, ele entra com uma ação de reintegração de posse alegando que os trabalhadores invadiram a propriedade em abril deste ano e que derrubaram as cercas do engenho, posta fotos de lavouras e tal, e protocola esse processo no Fórum de Itambé. Aí o juiz dá uma canetada e diz ‘é, bora reintegrar no sentido urgente porque as famílias invadiram a propriedade e derrubaram cercas’. Nunca existiu cercas na propriedade, os trabalhadores estão ali há muito tempo. Tem famílias que estão ali há mais de 3 gerações, é uma decisão absurda. Porém, com a decisão do STF de despejo zero na pandemia, ficou em suspensa a reintegração de posse”, conclui.
As famílias produzem toneladas de alimentos que são comercializados no município de Itambé e também contribuem em campanhas de solidariedade. Neste final de ano, estão participando da campanha “Natal Sem Fome” com a doação de 4 toneladas de alimentos. “A gente luta pela terra porque, por exemplo, na pandemia, o povo da cidade estava sufocado para comer enquanto nós no campo tínhamos macaxeira, tinha inhame, tinha praticamente tudo no campo, tinha galinha, tinha boi. A questão é essa. Nós produzindo no campo tem alimento para o campo e para a cidade”, acredita Grimauro.
Por causa disso, caso ocorra o despejo, Ronaldo acredita q a economia do município também será impactada diretamente. "Desenvolvimento econômico, emprego, oportunidade não existem [no município]; indústrias não existem -além da Giasa e a Olho D’Água que tem aqui como fonte de emprego. Então, de fato, vai ser um caos para a cidade e para as famílias se de fato acontecer esse despejo”, pontua Ronaldo.
Além do advogado, os agricultores têm contado com o apoio da Federação dos Trabalhadores Rurais, Agricultores e Agricultoras Familiares do estado de Pernambuco (Fetape), da Comissão Pastoral da Terra (CPT), do mandato do deputado federal Carlos Veras e do mandato coletivo das codeputadas estaduais Juntas. As famílias também estão se reunindo com a Arquidiocese de Nazaré da Mata e o Instituto de Terras e Reforma Agrária de Pernambuco (Iterpe) para debater a situação das famílias agricultoras.
A equipe do Brasil de Fato Pernambuco entrou em contato com Marcelo Petribu para falar sobre a questão, mas não obteve resposta até o fechamento desta matéria.
Edição: Vanessa Gonzaga