Na última semana o governador Paulo Câmara recebeu em jantar no Palácio do Campo das Princesas o prefeito João Campos, o deputado federal Danilo Cabral e o presidente do Partido Socialista Brasileiro, Carlos Siqueira. Ao fim do encontro, Siqueira publicou em seu perfil do Twitter que “o PSB tem seu pré-candidato ao governo de Pernambuco”. O partido lidera a Frente Popular, composição de 13 siglas que comandam o Governo do Estado há 16 anos e que deve apoiar a candidatura de Lula (PT) para presidente da República.
O PSB tem seu pré-candidato ao governo de Pernambuco, o deputado federal Danilo Cabral. Nesta sexta, no Palácio Campo das Princesas, em Recife, me reuni com o atual governador Paulo Câmara, o prefeito da capital, João Campos, e o companheiro Danilo Cabral. Vamos adiante! pic.twitter.com/kCf7mF1pTA
— Carlos Siqueira (@csiqueirapsb) February 13, 2022
Desde 2020, quando se encerrou o segundo mandato de Geraldo Julio (PSB) à frente da Prefeitura do Recife, dentro do PSB o nome dele era tratado como candidato natural à sucessão no Governo do Estado. Geraldo foi nomeado por Paulo Câmara para a Secretaria de Desenvolvimento Econômico, mas nunca apareceu nos principais espaços de articulação política do PSB, como por exemplo nas conversas do partido com o PT, mesmo quando Lula esteve em Pernambuco. Aos mais próximos, o ex-prefeito alegava não ter interesse em se candidatar, enquanto lideranças do partido aguardavam uma mudança de posição.
Em dezembro o PSB realizou um encontro estadual em que o debate central seria as eleições de 2022. A ausência de Geraldo Júlio na atividade sinalizou que ele estava mesmo fora. Só então outros nomes passaram a ser especulados, como o secretário estadual da Casa Civil, José Netto; os deputados federais Danilo Cabral e Tadeu Alencar; e mesmo da presidenta do Tribunal de Contas da União (TCU), Ana Arraes. Entre os cinco, Cabral e Ana Arraes são os que se mostram ideologicamente mais à esquerda. Mas o posto atual de Ana Arraes é muito mais importante – não se pode abrir mão.
Durante o período de indecisão, o senador Humberto Costa (PT) colocou seu nome para o PSB apresenta-lo, dentro da Frente Popular, como possível candidato do conjunto. Mas o PSB em momento algum cogitou abrir mão de encabeçar a chapa.
Após um ano de espera por Geraldo Júlio e dois meses de discussões, Danilo Cabral finalmente foi o nome escolhido. Nascido em 1967, em Surubim, região agreste do estado, Cabral cursou direito no Recife, especializou-se em direito administrativo e administração pública. É servidor concursado do Tribunal de Contas do Estado (TCE). Em 1995 assumiu seu primeiro cargo no Governo do Estado, sob comando de Miguel Arraes. Passou por vários cargos até ser nomeado diretor-geral do TCE (1999-2000), já no primeiro escalão da política estadual.
Já na política, Danilo Cabral foi secretário de administração do Recife (2001-03) na gestão João Paulo (PT) e se candidatou pela primeira vez em 2004, eleito vereador do Recife (2005-08). Foi secretário estadual de Educação (2007-10), em seguida eleito deputado federal, cargo para o qual foi reeleito em 2014 e 2018, estando hoje em seu 3º mandato. Nesse percurso, se licenciou do mandato duas vezes para assumir as secretarias estaduais de Cidades (2011-14) e Planejamento (2015-16). Em 2016 votou a favor do impeachment contra a presidenta Dilma Rousseff (PT). Nos últimos dois anos foi líder do PSB na Câmara Federal.
Há pelo menos três semanas Danilo Cabral tem publicado em suas redes sociais vídeos com trechos de discursos seus, numa sinalização que seria o candidato ao Governo. Nas peças, se apresenta como um “deputado presente”, alegando que anda em Pernambuco não só durante o período eleitoral; noutro vídeo (veja abaixo), divulgado em 3 de fevereiro, ele defende que se “coloque na presidência da República alguém que já demonstrou (...) qual é o lado dele, aquele presidente que todo mundo sente saudades: Luiz Inácio Lula da Silva”. No mais recente, já falando como candidato, ele diz ter “a clareza da responsabilidade que tenho pela frente”.
Nesta segunda-feira (14) o pré-candidato a governador visitou Geraldo Julio, para não deixar dúvidas do ambiente pacífico entre os dois.
Quem quer ser senador
A vaga mais cobiçada entre os 13 partidos da Frente Popular é a candidatura ao Senado. O PT tem reivindicado a vaga, mas dificilmente conseguirá a aprovação do PSB na postulação. Um dos fatores é a falta de confiança entre as siglas, que nos últimos 10 anos viveram mais atritos do que alianças. Outro fator é que além de PSB e PT, a Frente Popular é composta, hoje, por PCdoB, MDB, PSD, PP, PDT, Rede, PV, PROS, Republicanos, Solidariedade e Avante. Uma candidatura do PT ao Senado desagradaria siglas à direita, que poderiam enxergar uma chapa muito “de esquerda”.
Para completar, o nome favorito do PT para o cargo é o da deputada Marília Arraes (PT), opositora declarada do PSB, seu antigo partido. Acredita-se que, se eleita senadora, ela enfrentaria o PSB nas disputas do Recife (2024) e de Pernambuco (2026). Outro petista, Carlos Veras, é mais próximo ao PSB, mas ainda não tem apoio do partido para a postulação.
Outros nomes que buscam a aprovação do PSB para serem candidatos ao Senado pela Frente Popular são Eduardo da Fonte (PP), Silvio Costa Filho (Rep) e André de Paula (PSD). Da Fonte (PP) tem contra si investigações da Polícia Federal ainda em aberto, iniciadas no âmbito da Lava Jato, além da desconfiança do PSB. Com grandes bancadas na Assembleia Legislativa e na Câmara do Recife, com um senador o PP teria força para confrontar o PSB nas próximas disputas eleitorais.
No caso de Silvio Costa Filho (Rep), apesar de estar em primeiro mandato federal, não é visto como neófito, pela experiência em outros cargos e por acompanhar seu pai como deputado federal. Ele é tido como adaptável, sendo ao mesmo tempo base de apoio de Bolsonaro, enquanto em Pernambuco defende o nome de Lula. Mas seu partido entrou na Frente Popular apenas em 2020, de modo que ser priorizado neste momento pode ser mal visto pelos demais membros da frente.
Já André de Paula (PSD), 60 anos, é o nome que parece ter mais força, por enquanto. Na política desde os anos 1980, está em seu sexto mandato na Câmara Federal, sempre em partidos de direita: PDS, PFL, DEM e PSD. Comanda o partido em Pernambuco há muito tempo e tem proximidade com o presidente da sigla, Gilberto Kassab. De Paula é aliado fiel do PSB desde 2010 e passou por secretarias estaduais no primeiro mandato de Paulo Câmara.
Entre os três nomes, André de Paula (PSD) é o mais convicto em suas posições à direita, o que pode ser percebido por seu histórico de votações no Congresso. Já Eduardo da Fonte (PP) e Silvio Costa Filho (Rep), são perfis do chamado “Centrão”, pró-governo da vez, ambos simpáticos ao lulismo - apesar de integrarem partidos conservadores.
Correm por fora outros dois postulantes ao Senado: a vice-governadora Luciana Santos (PCdoB) e o deputado federal Wolney Queiroz (PDT). Nenhum dos dois partidos tem força em Pernambuco para tal postulação. O PCdoB não sabe se terá votos para eleger dois federais em Pernambuco, de modo que a candidatura de Luciana é uma incógnita. A situação de Wolney é mais delicada: com a iminente saída de Túlio Gadêlha para a Rede, o PDT dificilmente alcançará o coeficiente (que deve girar em torno de 150 mil votos) para eleger um federal. Apesar da fragilidade eleitoral, ambos são aliados antigos do PSB no estado.
Para o PT pode ser uma boa saída apoiar uma destas duas postulações dentro da Frente Popular, já que isso garantiria uma cadeira a mais para a esquerda num possível governo Lula.
Vice-governador (a)
Ainda não se fala publicamente sobre a cadeira de vice-governador, a última a ser definida na chapa majoritária. Mas alguns movimentos, como o envolvimento da deputada Teresa Leitão (PT) nas conversas com o PSB, sinalizam que o PT pode estar preparando sua candidata a vice para caso o PSB negue a vaga ao Senado. Leitão é educadora concursada, foi líder sindical dos professores da rede pública e é deputada estadual há cinco mandatos. Já declarou que não pretende mais disputar a vaga na Alepe, estando disposta a tentar uma vaga na Câmara Federal.
Federação
PT, PSB, PCdoB e PV estão com conversas avançadas para conformarem uma federação partidária. O instrumento jurídico uniria num mesmo CNPJ e sob os mesmos estatuto e direção os quatro partidos. Mas, diferente da fusão, a federação é temporária, com prazo legal de quatro anos. E também é diferente da coligação, união que dura apenas os meses da eleição e que está proibida para as disputas proporcionais (vereador e deputados) desde 2020.
A coligação permitia que um partido A fosse aliado do B num estado, enquanto são adversários noutro estado. A federação não permite isso, já que vigora em todo o território nacional. Caso se confirme, a federação obrigará PT, PSB, PCdoB e PV a andarem juntos em todos os estados e municípios até 2026. Isso contribui para que as composições sejam de conteúdo programático, não apenas tendo em vistas a eleição. O STF ampliou o prazo e agora os partidos têm até o fim de maio para firmarem federações partidárias.
A aprovação desse instrumento foi uma vitória do PCdoB, partido que luta para sobreviver a mais uma cláusula de barreira. Os partidos que na eleição de 2022 não elegerem ao menos 11 deputados federais (em pelo menos 9 estados) ou obtiverem ao menos 2% dos votos válidos, estes perderão acesso a recursos do Fundo Partidário além do direito a tempo de rádio e TV. A cláusula sobe para 13 deputados ou 2,5% dos votos (2026) e em seguida para 15 deputados ou 3% dos votos (2030).
A saída de cena de Geraldo Julio
Geraldo Julio liderou o afastamento entre PSB e PT, em 2014, quando o partido deu palanque para Aécio Neves (PSDB) contra Dilma (PT). Também foi favorável ao impeachment de Dilma em 2016. No Recife, PSB e PT se enfrentaram nas eleições em 2012, 2016 e 2020. A nível estadual, o PT apoiou um opositor em 2014, mas em 2018 abriu mão de uma candidatura própria em nome do apoio a Paulo Câmara.
Mesmo em 2018, quando Fernando Haddad (PT) e o governador Paulo Câmara se apoiaram, o PSB rejeitou uma aliança formal. As figuras públicas do PSB foram sempre vaiadas pelo eleitorado petista nos eventos com Haddad no Recife. A reaproximação PT-PSB, construída a partir do protagonismo de Paulo Câmara, coincidiu com a saída de Geraldo Julio dos holofotes, se dizendo desmotivado. Hoje os partidos estudam compor uma federação partidária, em que ficarão legalmente vinculados por quatro anos.
A PF e as eleições
Outra tese sobre a saída de cena de Geraldo diz respeito às investigações da Polícia Federal envolvendo seu nome, referentes ao período em que era secretário de Planejamento do Governo do Estado, ainda durante a gestão de Eduardo Campos. Com as seguidas intervenções do presidente Jair Bolsonaro (PL) na PF, existe a suspeita de que a corporação vai atuar para interferir no processo eleitoral em favor dos aliados do presidente.
A chefia da Polícia Federal em Pernambuco foi trocada em junho de 2021: o novo superintendente é Daniel Grangeiro, que era da PF em Alagoas. Nos bastidores, especula-se que o nome tenha sido uma indicação do senador pernambucano Fernando Bezerra Coelho (MDB), então líder do governo Bolsonaro no Senado. Além de ter investigações contra si na PF, Bezerra Coelho agora lidera um bloco de oposição ao PSB, com seu filho Miguel Coelho (DEM) como provável candidato ao Governo do Estado.
Edição: Vanessa Gonzaga