Na tarde desta segunda-feira (21) a coligação Frente Popular lançou, no Recife, a pré-candidatura de Danilo Cabral (PSB) para o Governo de Pernambuco. O Partido Socialista Brasileiro (PSB) está à frente do Executivo estadual há 16 anos (desde 2007) e encabeça a Frente Popular, agrupamento de 13 partidos que conta agora com o retorno do Partido dos Trabalhadores (PT). O evento teve muitos acenos ao velho-novo amigo e já é dado como certo o apoio da Frente Popular à candidatura de Lula – mesmo deputados de siglas bolsonaristas afirmaram voto no petista.
Ao lado de sua esposa, a engenheira Analúcia Mota, e emocionado ao falar do suporte que recebe da família, Danilo Cabral avaliou que está diante do maior desafio de sua vida. “E eu estou preparado”, avisou. O deputado considera que esta disputa eleitoral será “dura” para toda a Frente Popular devido ao momento que vive o estado e o país. “Vivemos uma crise profunda, que é econômica, sanitária, social e hídrica. Tudo isso gerido pelo pior presidente da história”, apontou, já disparando contra o presidente Jair Bolsonaro (PL).
O socialista também criticou o discurso “antipolítica” que dominou o cenário político durante anos recentes. “É importante ter política de volta ao centro do debate. A política é um instrumento de mudança da sociedade”, pontuou. Cabral foi vítima desse discurso dentro do PSB, quando o partido optou por Geraldo Julio (2012) e Paulo Câmara (2014), nomes sem experiência eleitoral e apresentados como “técnicos” e “não-políticos”. Para esta candidatura, a prioridade do PSB era Geraldo Julio, que acabou desistindo. Cabral fez um aceno ao colega, dizendo que o ex-prefeito do Recife “é uma referência para todo o PSB”.
O pré-candidato também fez questão de reafirmar suas posições em relação a gestão pública. Ele criticou as privatizações, que classificou de “entrega de patrimônio público”, mencionando o caso da Chesf/Eletrobras. “E tem gente aqui em Pernambuco que defenda isso”, reclamou. Mas ao seu lado, dividindo o palco, estavam os deputados federais Felipe Carreras (PSB), Silvio Costa Filho (Rep), Augusto Coutinho (SD) e Sebastião Oliveira (Ava), que em maio de 2021, na Câmara Federal, votaram a favor da privatização da Eletrobras. Danilo Cabral também criticou a Emenda Constitucional 55 (do teto de gastos) e quem “defende o equilíbrio fiscal como um fim em si” – para Cabral, a economia precisa de investimento público.
Ao defender seu currículo, ele lembrou seu início na militância no movimento estudantil, ainda como estudante da Faculdade de Direito do Recife (FDR/UFPE) e suas experiências no parlamento e a frente de diversas secretarias estaduais em Pernambuco. “Eu conheço o serviço público, conheço essa máquina”, propagandeou. Sobre uma futura gestão, discursou que em seu governo quer “ter de volta os movimentos sociais, para avançarmos ainda mais”. Antes dos movimentos, afirmou a vontade de atrair os “setores produtivos” (o empresariado) para o governo.
“É Lula! É Danilo!” e afagos ao PT
O elogio às gestões do ex-presidente Lula (PT), pré-candidato à Presidência da República, também foram frequentes no evento. Danilo Cabral disse que “povo brasileiro e o pernambucano têm saudades de Lula”. “Queremos ele de novo, para trazer de volta o orgulho de ser brasileiro”, pontuou o socialista, dizendo que o petista trouxe comida, emprego e conteve a inflação. Assista ao discurso no vídeo abaixo.
Cabral também buscou agradar outros petistas presentes, como ao chamar o deputado estadual João Paulo de “glorioso prefeito”, em referência aos anos do petista à frente da Prefeitura do Recife (2001-2008), quando Danilo foi seu secretário de administração (2001-03). Em direção ao senador Humberto Costa (PT), que abriu mão de sua pré-candidatura para apoiar Danilo Cabral, o socialista foi mais enfático. “Você também poderia estar aqui no meu lugar, por sua trajetória e pela qualidade do seu mandato. Você abriu mão de tudo isso em função do seu compromisso e responsabilidade com o Brasil e com Pernambuco”, elogiou.
O senador, que não demonstrou alegria mesmo quando afagado, discursou afirmando “compromisso com a unidade política”. “O gesto do PT, de retirar uma candidatura legítima e viável, foi feito por essa unidade e visa derrotar esse governo que trouxe de volta a inflação, a fome, o desemprego e a miséria”, disse Humberto. Ele também elogiou os anos de governo da Frente Popular, que, segundo o petista, “transformou radicalmente Pernambuco”. “Queremos que Pernambuco volte a crescer, reeditando as parcerias de Lula e Dilma com Eduardo”, concluiu.
Entre os petistas presentes estavam o senador Humberto Costa, o deputado federal Carlos Veras, o deputado estadual e presidente do partido Doriel Barros, todos no palco; e nas primeiras fileiras da plateia estavam os deputados estaduais Teresa Leitão, João Paulo, a vereadora Liana Cirne, além do dirigente partidário Oscar Barreto e o ex-secretário estadual de agricultura Dilson Peixoto.
Além de Humberto, outra fala do PT no evento foi da deputada federal e presidente nacional da sigla, Gleisi Hoffmann, que enviou vídeo saudando o seu “querido colega de Câmara” Danilo Cabral. A petista afirmou que a volta do PT a Frente Popular em Pernambuco “vai além do estado”. “Essa articulação tem grande responsabilidade com o povo brasileiro. A unificação das forças democráticas, progressistas e populares vai viabilizar a eleição de Lula”, pontuou.
A deputada federal Marília Arraes, apesar de lembrada no partido como possível nome da Frente Popular para o Senado, ela não se fez presente no evento, mostrando que as possibilidades de ser indicada são mínimas, visto que tem relação de atritos com seu antigo partido.
Os gestos em direção ao PT também partiram do governador Paulo Câmara (PSB), que esteve liderando o processo sucessório até aqui. “[o senador Humberto] nos orgulha muito em Brasília. Quero deixar público o agradecimento a sua decisão, correta, de nos ajudar a vencermos a eleição de 2022”, disse o governador, pontuando que com a volta do PT “a Frente Popular está novamente reunida. O gesto destes partidos vai ficar na nossa história”. O socialista disse nunca ter visto “tanta gente animada” para fazer campanha como este ano.
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Principal articulador do PSB junto ao PT nacionalmente, Paulo Câmara não economizou elogios a Lula. “É uma referência mundial de político exemplar. Ele orgulha o Brasil – bem diferente do que vemos hoje [na Presidência]. Lula é um símbolo de diálogo, de respeito e de combate às injustiças. É um nordestino, um pernambucano lutador como nosso povo”, disse Câmara. Ele foi secretário da gestão Eduardo Campos durante o governo petista. “Lembro como foi bom ter Lula presidente e Eduardo governador. Eu [como governador] não tive essa oportunidade, mas você vai ter”, disse Câmara – que durante sua gestão viu passar pelo Planalto Dilma (PT), Temer (MDB) e Bolsonaro (PL).
O prefeito do Recife, João Campos (PSB), apesar da boa relação com Lula, dentro do partido é tido como um ponto de resistência à formar uma federação PSB-PT. Mas no evento desta segunda fez um afago aos petistas, ao saudar Humberto Costa “por sua trajetória e largueza política” e citar outros petistas presentes, inclusive a vereadora Liana Cirne, que na Câmara Municipal faz oposição a sua gestão na prefeitura. O prefeito avalia que, mais difícil que a disputa eleitoral, será “reconstruir o Brasil e mostrar que o Nordeste é um celeiro de dignidade e gratidão”.
João disse que o povo pernambucano estará “unido num só caminho, que é o da candidatura de Danilo e do presidente Lula”. Ele também disse que o diretório do partido em Pernambuco está unificado na vontade de fazer o PSB ser “o primeiro partido a declarar apoio formal ao presidente Lula”. O presidente nacional do PSB, Carlos Siqueira, assim como os demais socialistas que discursaram, concluíram sua fala gritando que “é Lula, é Danilo”.
Em novembro de 2020, durante a disputa de segundo turno no Recife, contra a sua prima e adversária Marília Arraes (PT), a campanha de João Campos (PSB) espalhou cartazes pela cidade com caricaturas de Lula associando-o a corrupção. Morto em acidente de avião em 2014, Eduardo Campos sempre contou com o apoio de Lula em Pernambuco, chegando à constrangedora situação de, em 2006, Lula vir ao estado e fazer subir no mesmo palanque os então candidatos e adversários Humberto e Eduardo, com Lula pedindo voto para ambos.
A presidenta nacional do PCdoB e vice-governadora de Pernambuco, Luciana Santos, comemorou a volta de Lula à disputa eleitoral, que possibilitou às forças de esquerda “ter uma outra perspectiva”. Ela também elogiou a busca de Lula por alianças à direita. Luciana e seu partido há anos têm defendido a tese de que a esquerda só voltaria ao poder se conseguisse formar uma frente “amplíssima”.
O deputado Marcelo Freixo (PSB), pré-candidato a governador no Rio de Janeiro, também discursou afirmando que ele e Danilo “vamos governar com Lula”. O fluminense disse que a missão “não é só derrotar Bolsonaro, mas também o bolsonarismo”, apontando ainda que o país precisa de “um grande ‘pacto pela vida’”, em trocadilho com o nome do programa estadual de segurança que foi referência no governo Eduardo Campos.
Mea culpa sobre impeachment
Danilo Cabral e toda a bancada do PSB Pernambuco na Câmara Federal, em 2016, votou a favor do impeachment que derrubou a ex-presidente Dilma Rousseff (PT). Esse episódio é central na rejeição que a base eleitoral petista tem contra o apoio do partido às candidaturas do PSB. Mesmo em eventos de declaração de apoio do PSB ao PT, como nos atos de campanha de Fernando Haddad (PT, 2018) no Recife, os caciques socialistas são vaiados por petistas. Danilo Cabral foi questionado pela imprensa sobre a rusga. “O presidente Carlos Siqueira já se manifestou. O partido reconhece que houve um erro histórico em relação àquele processo. Agora é olhar para a frente, para o futuro”, tergiversou.
Senador e vice
Desde quando o PSB definiu (no dia 11) quem seria o candidato, Cabral tem tomado a dianteira nas conversas com os partidos da Frente Popular, papel até então cumprido por Paulo Câmara. Dentro do conjunto de partidos, a disputa agora é pela cobiçada candidatura ao Senado, que pode garantir um mandato de 8 anos na Casa Alta. Questionado sobre qual seria o perfil ideal para o cargo e para a sua vice, o socialista disse estar ouvindo as siglas e em busca de nomes “que representem o sentimento desta frente, que construa unidade, mas que nacionalmente ajude a derrotar Bolsonaro”. Leia mais sobre a disputa ao Senado clicando aqui.
Base bolsonarista, mas voto lulista
O Brasil de Fato entrevistou o deputado federal Silvio Costa Filho (Rep), que integra a base governista em Brasília. O questionamos sobre as críticas feitas contra Bolsonaro no evento. “Eu concordo com essas críticas. Desde que fui vereador do Recife, aos 21 anos, a minha vida pública foi junto à centro-esquerda. Também foi assim como deputado estadual e agora como federal”, disse ele, que a bem da verdade em Brasília tem votado a favor das reformas propostas por Bolsonaro.
O deputado deseja ser candidato ao Senado na chapa da Frente Popular, mas acha que o fato de ser base do governo Bolsonaro não cria desconfiança entre as forças de esquerda que compõem a frente. “Lula quer Alckmin de vice. Ele dá um sinal de entendimento com o centro. Acho que isso é o que deve ser feito, uma unidade pelo Brasil”.
Silvio Costa Filho disse estar “trabalhando para o partido ficar neutro” na disputa presidencial que se avizinha. “O Republicanos está caminhando para liberar sua bancada nacionalmente, para que cada estado se alie e vote em quem bem entender. E eu vou votar em Lula para presidente da República”, pontuou.
Presentes e ausentes
No palco do evento estavam presentes os deputados federais André de Paula (PSD), Silvio Costa Filho (Rep) e Wolney Queiroz (PDT), que assim como a vice-governadora Luciana Santos (PCdoB), Carlos Veras (PT) e Teresa Leitão (PT), todos almejam ser candidatos ao Senado pela Frente Popular. Outro cotado, o deputado Eduardo da Fonte (PP), não participou do evento, sendo representado por seu filho Lula da Fonte (PP).
Chama atenção ainda as presenças do deputado estadual bolsonarista Marco Aurélio Medeiros (PRTB) e seu filho e vereador Marco Aurélio Filho (PRTB); o ex-deputado João Fernando Coutinho (PROS); e o deputado federal Raul Henry (MDB), cujo partido cogita formar federação com PSDB ou União Brasil (fusão do DEM com o PSL) – propostas que contraria Henry, aliado da Frente Popular.
Perfil
Nascido em 1967, em Surubim, região agreste do estado, Cabral cursou direito no Recife, especializou-se em direito administrativo e administração pública. É servidor concursado do Tribunal de Contas do Estado (TCE). Em 1995 assumiu seu primeiro cargo no Governo do Estado, sob comando de Miguel Arraes. Passou por vários cargos até ser nomeado diretor-geral do TCE (1999-2000), já no primeiro escalão da política estadual.
Já na política, Danilo Cabral foi secretário de administração do Recife (2001-03) na gestão João Paulo (PT) e se candidatou pela primeira vez em 2004, eleito vereador do Recife (2005-08). Coordenou a campanha vitoriosa de Eduardo Campos (PSB) ao Governo do Estado (2006). Foi secretário estadual de Educação (2007-10), em seguida eleito deputado federal, cargo para o qual foi reeleito em 2014 e 2018, estando hoje em seu 3º mandato. Nesse percurso, se licenciou do mandato duas vezes para assumir as secretarias estaduais de Cidades (2011-14) e Planejamento (2015-16).
Edição: Vanessa Gonzaga