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eleições 2022

"Desde que nasci, fui para as fileiras da luta": Conheça Rosa Amorim, candidatura do MST em PE

Rosa “nasceu” no Assentamento Normandia, em Caruaru e será candidata a deputada estadual; ato de filiação foi sexta (11)

Brasil de Fato | Recife (PE) |
O povo brasileiro precisa construir o seu próprio caminho", afirma Rosa Amorim do MST, no ato de filiação ao PT - Nicolas Gandhi

Na última sexta-feira (11) o Partido dos Trabalhadores (PT) realizou o evento de filiação de Rosa Amorim, militante do MST que será candidata a deputada estadual. O evento aconteceu no Armazém do Campo, mercado de produtos do movimento no centro do Recife. Participaram figuras de destaque do PT no estado, a exemplo do senador Humberto Costa, o deputado federal Carlos Veras, a vereadora Liana Cirne, além do presidente estadual do partido, o deputado Doriel Barros. Também participam da celebração artistas locais como Isaar França, Isadora Melo, Barro, Martins, Luna Vitrolira e outros.

Em seu discurso, Rosa reafirmou que sua candidatura é parte de um conjunto de iniciativas para derrotar o bolsonarismo nas urnas. “Chegamos agora em um momento que digo ser uma das encruzilhadas mais difíceis que o nosso país está vivendo. E somos nós, esse povo que está aqui hoje, que denuncia esse projeto e que vai ser a linha de frente para a gente conseguir derrotar o governo Bolsonaro”, afirma ela sobre a conjuntura política e social em que a sua candidatura estará inserida.

No ato, se filiaram outros militantes do movimento sem terra. Jaime Amorim, pai de Rosa e integrante da Direção Nacional do MST, também se filiou ao PT. “Nós tomamos a ideia de filiar a militância ao Partido dos Trabalhadores ou partidos de esquerda para disputar mandatos porque entendemos que para derrotar a extrema direita e o fascismo que está impregnado na estrutura da sociedade, nós temos que estar em todos os fronts de guerra, em todos os fronts da batalha”.

Além do MST,  a atividade contou com a participação de vários movimentos sociais e sindicais, como a Federação dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares de Pernambuco (Fetape), a Central Única dos Trabalhadores (CUT) e a Federação Única dos Petroleiros (FUP). Também a UNE, União da Juventude Socialista (UJS), Marcha Mundial das Mulheres, Via Campesina, o Levante Popular da Juventude, o Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), Movimento Camponês Popular (MCP) estiveram presentes com representações.

O MST e o PT têm relação de proximidade desde o nascimento de ambas, na década de 1980. Mas as filiações visando as eleições deste ano são parte desta uma construção nacional do MST, que este ano deve lançar candidaturas “do movimento” através do PT em diversos estados. Em Pernambuco o movimento tomou a decisão no fim de 2021 de lançar Rosa Amorim para a Assembleia Legislativa (Alepe). Ela estuda na UFPE, mora no Recife há alguns anos, mas é “filha do movimento”, tendo vivido boa parte da vida no Assentamento Normandia, em Caruaru.

Quem é Rosa?

Rosa Amorim é filha do catarinense Jaime Amorim e da baiana Rubneuza Leandro, ambos com formação nas comunidades católicas, que se tornaram dirigentes do MST e foram deslocados para construir o movimento em Pernambuco, ainda em 1989. Rosa nasceu em 1997, única filha mulher entre três irmãos homens. “Desde que nasci fui para as fileiras da luta do movimento, como sem terrinha”, diz ela, que passou a maior parte da vida em Caruaru, transitando entre a área urbana e o Assentamento Normandia.


Rosa Amorim é filha de dois dirigentes do MST / Arquivo pessoal


Desde criança construiu sua relação com a militância e a arte / Arquivo pessoal

Em conversa com o Brasil de Fato Pernambuco, ela conta que passou a infância acompanhando marchas, ocupações e encontros do MST, especialmente na chamada “ciranda”, espaço em que os militantes deixam suas crias enquanto participam das atividades. “Na ciranda aprendemos as músicas do MST e desconstruímos as ideias que a mídia comercial cria sobre o movimento sem terra”, resume Rosa. Ainda criança ela inicia no ballet clássico e dança contemporânea, mas se encontrou mesmo no teatro. Aos 11 anos passa a integrar o Teatro Experimental de Arte (TEA), importante escola de artistas em Caruaru.

Também aos 11 começa a se envolver no movimento estudantil, participando do grêmio de sua escola e mobilizando colegas para protestar pela redução das passagens de transporte público em Caruaru. Após as “jornadas de junho” de 2013, então com 16 anos, Rosa é apresentada ao Levante Popular da Juventude, movimento urbano que àquela altura ainda estava em processo de nacionalização. No Levante ela construiu um envolvimento orgânico, passando por posições de direção. Já são nove anos militando junto a organização.

Em 2016 inicia sua graduação em teatro na UFPE – e o ano seria intenso na vida da militante. Logo após o impeachment que derruba a presidente Dilma Rousseff, o sucessor Michel Temer consegue aprovar a Emenda Constitucional 55, que estabeleceu um “teto de gastos” e congelou por 10 anos os recursos para a educação, saúde e outros setores.


Integrante do TEA (Caruaru) desde os 11, Rosa está no fim da graduação em teatro pela UFPE / Arquivo pessoal

Em resposta, milhares de estudantes participaram de ocupações em universidades e escolas de ensino médio por todo o país. “Ocupamos a UFPE por dois meses. Todas as atividades da universidade ficaram paralisadas. Eu fui uma das que estive à frente da ocupação”, lembra Rosa. “Ao fim, sofremos um processo de perseguição e criminalização do movimento estudantil. Acabei sofrendo um processo administrativo e quase fui expulsa da universidade”, lembra ela, que considera esse período como um “divisor de águas” em sua trajetória como militante.

As organizações estudantis protestaram, pressionaram a universidade, que ainda assim suspendeu Rosa por um semestre. Os meses longe da universidade a levaram a mergulhar de cabeça nas atividades políticas. “Não tinha como eu ficar distante das lutas do nosso país. Acabei me envolvendo mais com a militância e, quando voltei à universidade, já era tida como uma referência no movimento estudantil dentro do estado”, conta Amorim. Hoje Rosa é diretora da União Nacional dos Estudantes (UNE).

Mas ela diz nunca ter pensado em se candidatar a um cargo eletivo. “Cresci em organizações como o Levante, a Consulta Popular e o MST, que fazem a luta focada principalmente na organização popular, na construção de força na sociedade, sem pretensões na institucionalidade. Então nossas lideranças, mesmo quando são referências na sociedade, não saem candidatas”, explica Rosa.


Rosa tem "se dividido" entre MST e Levante Popular da Juventude há 9 anos / Arquivo pessoal


Relação histórica entre MST e PT tornou fácil a escolha do partido pelo qual se candidatar / Arquivo pessoal

Mas a opinião no MST mudou desde 2018. “Se a sociedade nos legitima, temos que colocar nossos nomes à disposição para as eleições. Se não ocuparmos esse espaço, outras pessoas vão ocupar, sem levar nossas pautas ou nosso legado”, avalia. Ano passado, ao receber o convite para a disputa, Rosa topou de pronto. “Esse lugar não foi feito para nós. Eles não nos querem lá. Mas eu quero ver mais mulheres nesses espaços, mais jovens, LGBTs, negros e negras, quero sem terra nesse lugar”, diz ela, que considera esta uma candidatura coletiva de todo o movimento.

E a candidatura não poderia ser por outro partido que não o PT. “É um dos maiores partidos populares que temos nessa parte do mundo”, diz Rosa, que lembra a relação histórica entre MST e PT, com maior aproximação a partir dos processos que culminaram com o impeachment de Dilma e a prisão do ex-presidente Lula.

Perguntada se sua postulação poderia causar atritos com candidatos que foram apoiados pelo MST em eleições anteriores, Rosa torce para que não ocorra. “O MST luta pela unidade da esquerda e dos movimentos sociais e sempre construímos alianças com diversos grupos políticos dentro da esquerda. Essa relação é muito maior do que uma eleição ou um mandato. Sei que nas eleições essas coisas mudam, mas nós não queremos perder esse vínculo por estarmos na disputa”, explica.


Ações de solidariedade do MST devem entrar na campanha / comunicação/MST

A pré-candidata coloca como principal desafio enfrentar ideias bolsonaristas que ganharam espaço na sociedade. “O discurso da antipolítica, o discurso anti-MST”, exemplifica. “É um desafio no campo da batalha das ideias”. Ela diz estar alerta para os ataques que virão. “O MST lida historicamente com isso e não seria diferente agora. Quero conquistar uma vaga mostrando que somos sem terra. Não daremos um passo atrás na nossa identidade de quem somos”, afirma, garantindo o uso do nome “Rosa do MST” na campanha.

O período eleitoral vai servir também para propagandear as ações dos sem terra durante a pandemia, que ganharam destaque pelas campanhas de solidariedade, distribuição de alimentos e combate ao desemprego e à fome. “Enquanto eles pregam o ódio e a criminalização de movimentos sociais, é assim que vamos responder”.

A campanha será direcionada aos assentamentos, acampamentos, à população urbana alcançada pelas ações do MST e também para os setores sociais simpáticos ao movimento. As pautas não devem se restringir ao povo do campo, mas abraçar bandeiras do feminismo, LGBTs, população negra, quilombola e indígena, além da luta pela educação. “Queremos avançar na reforma agrária, mas em todas a dimensões da conquista por direitos”, resume.


Mulher, jovem, negra e lésbica, ela garante que vai levar essas pautas na campanha / Arquivo pessoal

Edição: Vanessa Gonzaga