Pernambuco

ENTREVISTA

"Sair de Natal para o Rio me fez me perceber mais como nordestina", destaca Juliana Linhares

A cantora falou sobre o seu álbum "Nordeste Ficção", sobre suas referências musicais e seu olhar sobre o Nordeste

Brasil de Fato | Recife (PE) |
O álbum Nordeste Ficção tem o objetivo de trazer as múltiplas facetas da região a partir do olhar e das referências de Juliana Linhares - Clarice Lissovsky / Divulgação

Juliana Linhares é atriz, cantora e compositora potiguar que mora no Rio de Janeiro e lançou o seu primeiro álbum, o “Nordeste Ficção”, em 2021. Juliana dialoga, através da música, com suas referências do que é Nordeste, o que muitas vezes é estigmatizado em alguns símbolos, como o cacto, elementos sertanejos, a chita e tantos outros que de fato representam a região, mas são uma parte do todo que é de uma diversidade cultural enorme a partir da tradição de um dos 9 estados.

Para falar um pouco mais sobre suas referência e o seu processo criativo, o Brasil de Fato Pernambuco entrevistou Juliana Linhares para o programa Trilhas do Nordeste. Confira a entrevista:

Brasil de Fato Pernambuco: Juliana, conta para a gente mais um pouquinho sobre o “Nordeste Ficção”. Como você o descreveria e qual seu processo criativo? 

Juliana Linhares: O Nordeste Ficção é um álbum que acho que vem amadurecendo dentro de mim há algum tempo, a vontade grande de fazer um primeiro disco solo, o primeiro trabalho solo, trabalho solo entre muitas aspas, mas o primeiro trabalho como cantora. Já estou no Rio há doze anos. Eu sou de Natal (RN), vivo indo e vindo, mas moro no Rio há doze anos, e sair de Natal paro Rio me fez me perceber mais como nordestina. É engraçado esse processo. Eu era muito nova e, em Natal, eu vivia normalmente, não pensava “eu sou nordestina”, “olha o Nordeste”, e vivia. E aí quando eu saio de Natal, eu começo a perceber todos os preconceitos, os estereótipos… Eu começo a perceber que as pessoas me olham como um estereótipo nordestino que eu nem sabia muito bem que era. E aquilo começa a fazer sentido, até que chego no Durval Muniz de Albuquerque Júnior, que escreveu “Invenção do Nordeste”, que é um livro, e quando eu li o livro me fez muito sentido entender a história do Nordeste, a história do Brasil, que tinha acontecido por outros caminhos e não por aquilo que era. É como a gente estudar hoje a história preta, a gente percebe que não aprende, realmente cortaram as histórias do nosso aprendizado, a gente não teve acesso. 

E aquilo me fez dizer "ah, eu acho que tenho boca pra cantar sobre isso, partir disso”. E aí eu fiz o álbum muito inspirado no Durval, mas com várias outras inspirações desses anos todos meus como cantora e coloquei nesse trabalho. A minha inspiração é essa, mas também cantar, compor, os meus parceiros, as parcerias, são inspiração. Chico César, Zeca, as pessoas que estão no disco com quem eu pude conversar e trocar e compor. Pessoas que participaram, todos os músicos, todo mundo que está dentro me inspirou muito para aquele trabalho virar o que ele é”.

BdF PE: O teu álbum também tem muitas referências. Entre elas, Amelinha, Elba Ramalho, Cátia de França, gostaria que você falasse sobre a importância dessas mulheres nordestinas na tua trajetória também. E se tem alguma com a qual você se identifica mais como artista.

Juliana Linhares: Então, eu muitas vezes não consigo responder aos estereótipos do interior sertanejo, apesar de e te isso porque meu pai é, e visitei muito. Então, tenho muito próximo, a minha família toda é do interior do Rio Grande do Norte, mas eu nasci no litoral. Essa mistura toda faz com que me identifiquei muito com um lado mais rock da Elba, por exemplo, com um lado mais rock também que vejo, mais rock’n roll mulher que falo assim, da Cátia… Mas eu também sinto que a minha voz, se eu tivesse vivido no tempo dela, Marinês, porque acho que a gente é parecida, sabe? É uma mistura meio louca. Essas três que você trouxe, quer dizer, você trouxe Amelinha… Também foi uma grande referência, porque Amelinha tem alguns discos com músicas muito lado B do Nordeste mais místico, mais misterioso, diferente, que também me inspira muito, e acho que foge do estereótipo. Mas eu acho que as três, menos Cátia… Cátia é mais diferente nesse sentido porque a Cátia foi menos para o meio streaming, a verdade é essa. Tanto Amelinha quanto Elba chegaram mais ao povo, elas são importantes para mim, tanto Elba quanto Amelinha, porque elas cruzaram a fronteira da música regional para a música brasileira. Elas hoje são consideradas cantoras da MPB e não cantoras do regional, sabe? E isso é muito importante para o que a gente constrói em termos de artista nordestino.


BdF PE: O teu álbum tem uma mensagem muito forte para nós do Nordeste. O que você gostaria que esse álbum provocasse em quem escuta?

Juliana Linhares: E queria muito, desde o início, antes do álbum sair, antes até do disco sair, digamos que eram um sonho e eu não sabia o que ia acontecer, mas e queria q as pessoas ouvissem o disco e pensassem “caraca, ela botou no nome de Nordeste nisso e isso é tanta coisa, e isso é tão múltiplo", “nossa, são tantos nordestinos, são tantas coisas ”, “nossa, tem tantos ritmos”, “nossa, mas tem uma carioca”, “nossa, mas tem a Letrux”… “Caramba! Que mistura é essa que é o Nordeste dessa menina?”. E é o que é mesmo, eu sou uma nordestina misturada, uma nordestina que tem uma vida no Rio, mas não deixo de ser nordestina e de carregar um monte de coisa e de responder a um monte de expectativas diferentes das que as pessoas esperam. E aí, platinei o cabelo e fui brincar um pouco com a imagem, quis construir imagens de clipes que não fossem associadas à ideia do cacto, da chita, do milho, do Padre Cícero. Eu não queria representar o Nordeste de cara, mas eu queria que você fosse convidado a entrar naquilo de uma forma diferente. E eu fiquei muito feliz porque acho que a gente conseguiu isso, sabe?. 

Serviço

Se você quiser ouvir o "Nordeste Ficção", é possível escutar as músicas do álbum e outras composições de Juliana pelo Spotfy e também pelo YouTube. E para conhecer mais da cantora, é possível acompanhá-la pelo Instagram.

Edição: Elen Carvalho