Nesta segunda-feira (1º) o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) finalmente julgou o recurso impetrado por Marcos Luidson de Araújo, o Cacique Marcos Xukuru, prefeito eleito de Pesqueira, município de 68 mil habitantes na região agreste de Pernambuco. Mas o TSE rejeitou o recurso e decidiu pela anulação da eleição municipal. O Tribunal Regional Eleitoral de Pernambuco (TRE-PE) terá de organizar um novo pleito em Pesqueira, agendado para o dia 30 de outubro, data prevista para o 2º turno estadual e nacional.
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O Cacique Marcos tem uma condenação por “crime contra o patrimônio privado”, por um incêndio que ele supostamente teria cometido contra uma residência em 2003. Marcos negou ter participado do ato, mas acabou condenado em todas as instâncias. Já no imbróglio eleitoral, que se arrastou de 2020 a 2022, a defesa do líder indígena adotou duas linhas argumentativas.
A primeira é a de que o incêndio seria um crime contra a segurança pública, de modo que não se encaixaria no artigo 1º da Lei da Inelegibilidade (Lei Complementar 64/1990). A segunda é a de que o prazo de 8 anos inelegível contaria a partir da primeira condenação por órgão colegiado, em 2009 (de modo que o prazo teria se encerrado em 2017).
Mas, apesar do voto do presidente do TSE, Edson Fachin, a favor do recurso do líder indígena, a maioria dos ministros votou com o relator Sérgio Banhos. Ele defendeu que o fato de ser um incêndio na verdade agravaria o crime, alegando que teria colocado em risco “além do patrimônio, a vida e a integridade física de outrem”. Sobre o tempo inelegível, o TSE afirmou que é de 8 anos a partir do fim do cumprimento da pena. Apesar de condenado a 4 anos de prisão, Marcos Xukuru recebeu indulto da ex-presidenta Dilma Rousseff em 2016, de modo que segue inelegível até 2024.
Assista à entrevista concedida por Marcos Xukuru ao programa Trilhas do Nordeste em abril de 2022, sobre o Abril Indígena.
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Já durante a campanha eleitoral de 2020 o Ministério Público Eleitoral (MPE) de Pernambuco pediu que a chapa do cacique fosse indeferida, ao que o Tribunal Regional Eleitoral (TRE-PE), ao que o TRE acatou. Marcos Xukuru (Republicanos) recorreu. A campanha seguiu e o líder indígena foi eleito com 17,7 mil votos, correspondente a 51,6% dos 37 mil pesqueirenses que foram às urnas em 2020. Os adversários Maria José (então no DEM, hoje União Brasil) e Antônio Mota (PSOL) tiveram, respectivamente, 45,5% e 2,9%.
Eleito, Marcos Xukuru não pode tomar posse. E nem o seu vice Paulo Campos (PSB). Quem assumiu a prefeitura foi o presidente da Câmara de Vereadores, Bal de Mimoso (REP), aliado de Marcos. Assim, a presidência da Câmara ficou no colo do indígena Pastinha Xukuru (REP). Ao longo de 1 ano e 7 meses de gestão, Marcos Xukuru chegou a ser impedido de pisar na prefeitura, acusado de estar despachando junto com o prefeito interino. Meses depois foi nomeado secretário.
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Com a decisão do TSE, Bal de Mimoso (REP) segue como prefeito interino. O Tribunal Regional Eleitoral (TRE-PE) definiu que as eleições suplementares serão realizadas no dia 30 de outubro, junto ao 2º turno das disputas para governador e presidente da República.
Outro município pernambucano que passará por novas eleições para prefeito é Joaquim Nabuco, na zona da mata. Ainda não foi divulgada a data de início da campanha para as disputas de prefeito nessas disputas suplementares.
Os tiros, o incêndio e a santa
No início dos anos 2000, um projeto encampado pelo então prefeito João Eudes — marido da ex-prefeita Maria José — visava passar um pedaço das terras indígenas Xukurus para o controle da Igreja Católica. A igreja construiria um santuário para Nossa Senhora das Graças e o prefeito alegava que isso incentivaria o turismo religioso no município.
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A maioria dos Xukurus foi contra, especialmente pela forma de negociação adotada pela gestão municipal. Mas uma parcela que vive próxima à área do empreendimento se interessou pelo projeto. A briga interna do povo Xukuru resultaria na cisão que deu origem aos Xukurus de Cimbres (região do santuário) e os Xukurus do Ororubá (nome da serra em que parte das aldeias está localizada). Mas antes da ruptura houve tiros e mortes.
O Cacique Xicão, pai de Marcos, havia sido assassinado em 1998. Passados cinco anos, em 2003, o impasse interno sobre o santuário acirrou os ânimos entre as comunidades. O novo cacique, "Marquinhos", ainda não gozava de tanta legitimidade como hoje. E o indígena José Lourival Frazão, da comunidade de Cimbres, resolveu atirar contra o caminhão dirigido por Marcos. Frazão matou dois indígenas, mas Marcos conseguiu fugir, mesmo baleado.
A notícia logo chegou à Serra do Ororubá. E os indígenas reagiram: foram até a região de Cimbres e atearam fogo em quatro casas e cinco veículos. O cacique Marcos nega ter participado da ação, mas a Justiça considera que ele teria dado ordens para o ataque - algo que ele também nega. A condenação do cacique é por esse crime.
Com a ruptura entre os Xukurus de Cimbres e os do Ororubá, o Santuário de Nossa Senhora das Graças foi construído em 2005, no local onde supostamente houve uma aparição da Nossa Senhora em 1936, testemunhada por uma freira chamada Irmã Adélia. Hoje os Cimbres e Ororubá convivem pacificamente, mas politicamente estão em lados opostos – ao menos nos embates municipais. O povo de Cimbres em 2020 apoiou Maria José contra Marcos Xukuru.
Edição: Vanessa Gonzaga