Pela vigésima oitava vez, o Grito dos Excluídos e das Excluídas vai às ruas neste 7 de setembro como uma resposta do campo popular e progressista aos retrocessos que vive o país. O lema “200 anos de (in)dependência. Para quem?” mantém o questionamento do grupo à narrativa oficial da separação do Brasil do Império Português. Pernambuco, que antes mesmo da declaração de independência liderou uma revolução popular contra a coroa, segue na tradição: há atos previstos no Recife e em Petrolina, no Sertão, para esta quarta-feira.
Na capital, a concentração terá início às 8h no Parque 13 de Maio, no bairro de Santo Amaro, área central. No local, será realizada uma homenagem póstuma ao Padre Reginaldo Veloso, cuja trajetória de vida foi marcada pela defesa dos pobres. Do parque, os manifestantes, movimentos populares e organizações religiosas sairão em marcha pelas avenidas do entorno.
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Já no Sertão, o Mãos Solidárias Petrolina vai servir, em sua sede, um café da manhã para famílias em vulnerabilidade social, nutricional e financeira a partir das 9h.
Neste ano, o Grito dos Excluídos não é só marcado pelo bicentenário do 7 de setembro. A manifestação acontece a menos de um mês das eleições que já estão marcadas pela escalada da tensão política. Ao longo dos últimos anos, o Grito não recuou e manteve sua programação a despeito das hostilidade.
“Hoje se torna ainda mais importante irmos às ruas: vimos um golpe parlamentar em 2016 - independentemente da questão partidária e ideológica, foi um atentado à democracia e aconteceu dentro do Congresso Nacional. Mesmo com a democracia conquistada a partir da Constituição de 1988, tivemos muitos avanços mas rapidamente a classe dominante toma de assalto o poder e adota políticas contrárias aos interesses do povo brasileiro”, aponta Marcus Silvestre, integrante da coordenação do Grito na capital.
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Para garantir tranquilidade a quem vai à passeata no Recife, a organização está articulando medidas de segurança junto às polícias e com acompanhamento de plantão do Ministério Público de Pernambuco (MPPE) e de advogados populares.
“Houve sugestões de que não saíssem às ruas nesses anos, não só pelas eleições, mas também porque os adeptos ao presidente Bolsonaro estão se organizando. Mas em nosso entendimento, quem é de direita tem direito de ir às ruas, somos a favor da democracia. O que não se admite é que qualquer manifestação política impeça outras manifestações, nem com violência e nem com agressividade. Não queremos entrar em conflitos, por isso mantemos os devidos cuidados para ser uma atividade pacífica”, explica.
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O MPPE enviou dois ofícios à Polícia Militar de Pernambuco (PCPE), recomendando que a corporação evite o uso abusivo ou arbitrário da força e o emprego inadequado de armas, fazendo alusão à manifestação de maio de 2021 na qual os policiais dispararam tiros de bala de borracha que cegaram dois homens e machucaram mais outras pessoas.
O Grito dos Excluídos
Para quem foi a tal Independência do Brasil? Quem constrói o Grito dos Excluídos defende que o 7 de setembro de 1822 não garantiu a soberania nacional almejada pelo povo. Afinal, a libertação não foi uma conquista dos levantes populares da época, duramente reprimidos. Pelo contrário, foi um processo contratual com Portugal e o Império Britânico, que desejava mais consumidores dentro do modelo pré-capitalista que se formava.
O Brasil precisou comprar sua independência formal: a recém criada nação teve de pagar 2 milhões de libras esterlinas a Portugal, dinheiro que pegou emprestado da Inglaterra, configurando sua primeira dívida externa.
Durante os últimos dois séculos, o país foi atravessado por processos políticos que tampouco favoreceram um ambiente favorável para a consolidação de uma democracia para todos.
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“Desde o começo, é um país que sempre esteve subordinado ao grande capital mundial, que não tinha uma soberania completa e autêntica em relação aos países dominantes. Passamos por várias fases, desde o Império ao fim da escravidão oficial, à proclamação da República, depois o Estado Novo, e depois o golpe militar de 1964”, comenta.
“Passamos por muitas dificuldades para efetivar a democracia, a justiça social e a igualdade de direitos e políticas públicas [em 1988]. Porém, com o golpe contra a presidenta Dilma em 2016, o governo do golpista Michel Temer e agora com o governo Bolsonaro, vemos o Brasil recuar na sua soberania e adotar uma política econômica que prejudicou a qualidade de vida dos brasileiros”, acrescenta Marcus Silvestre. É em tom de denúncia que nasce o Grito dos Excluídos em 1995, também com a perspectiva de promover uma reflexão sobre o Brasil.
Edição: Vanessa Gonzaga