Pernambuco

Coluna

Racismo por omissão

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Apesar do avanço em algumas regiões, nas outras 12 capitais nenhuma mulher negra ou trans está entre os dez mais votados para a vereança - Foto: Pablo Vergara
Agarremos a vitória com retintas mãos

Primeiro debate aos presidenciáveis. Silêncio total cobrindo a racialização dos temas abordados. Silêncio sobre a sub-representação das mulheres e homens negros na política institucional, sobre os obstáculos encontrados por esta população ao vislumbrar se aproximar de ocupar tais cargos. Silenciamento sobre os corpos dos jovens negros vitimados pelas polícias e milícias, sobre os corpos das mulheres negras atingidas por feminicídio. Silêncio sobre racismo, sonhos, futuro. Absoluto e mudo silêncio sobre o questionamento coletivo acerca de que aqueles seis candidatos fossem capazes de representar o povo brasileiro em sua diversidade de classe, raça, gênero, religiosidade, regionalidade.

Silenciar uma população, sujeitos, interesses, signos, silenciar uma questão com a importância que a questão racial tem no contexto brasileiro é também racismo. Quantas mães, jovens, trabalhadoras, artistas não se enxergaram naquele debate entre brancos e seus ranços? De dois em dois anos, candidatos brancos fraudam a sua raça/etnia fingindo-se negros afim de boicotar uma das formas de acesso a alguns espaços, a partir de cotas raciais; candidatos brotam nas favelas como se ali vivessem nos outros onze meses do ano e uma ausência de programa que abarque as demandas da população negra no país.

Há um movimento em curso, realizado principalmente pelas mulheres negras, que vem tentando reparar essa lacuna em nossa história, campanhas tais como Eu Voto em Negra que reforçam o aquilombamento também nestes espaços parlamentares, em que boa parte de nossas vidas são decididas, considerando que os orçamentos destinados às políticas, suas prioridades, leis, dentre outros aparatos de poder são presididos por aqueles que detém o poder econômico e de propriedade privada.

Mulheres com larga trajetória política, em sua comunidade, sabedoria de vida, conhecimento técnico, qualificação profissional, experiências diversas e plurais mas que em geral não tem o sobrenome de um pai ou marido poderoso. Cada dia uma batalha na tentativa de driblar os menores salários, maior taxa desemprego e informalidade, jornada doméstica e de cuidados intermitente, assédio sexual, moral, responsabilização pela família e filhos e, a despeito de tudo isso colocar-se à disputa eleitoral.

A reprodução das desigualdades estruturais dentro dos partidos também é uma regra, então pretas retintas em geral não têm visibilizadas as suas campanhas, recebem pouco orçamento e as candidaturas mais claras, seja de mulheres e de homens passam na frente. Este movimento que se construirá ao longo de décadas e séculos deve no futuro colher importantes frutos. No presente nos cabe enfrentar o racismo que nega e finge não ver estas importantes candidaturas, que em muitos casos quando eleitas, são cassadas e ameaçadas de morte. Nossa tarefa portanto, é também garantir que os mandatos sejam governados e que possam estimular tantas outras companheiras a atravessar essa árdua seara ao mostram-se como nossas representantes do povo brasileiro. 

Este revide ativo, como pulsão que exige viver e viver bem, uma boa vida coletiva, pautada na justiça e na reparação histórica. “Nem todo trajeto é reto, nem o mar é regular”, não é uma batalha fácil tampouco impossível. Se uma cai, três levantam, agarremos a vitória com retintas mãos. 

Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato Pernambuco.

Edição: Vanessa Gonzaga