Diante de um cenário de cortes nas políticas de incentivo à agricultura familiar, este tema, junto do direito à terra e da agroecologia tomaram uma grande importância nessas eleições. Para falar sobre isso, o economista e dirigente nacional da Via Campesina e do MST, João Pedro Stédile, comenta sobre as estratégias dos movimentos do campo para a disputa eleitoral deste ano. Assista:
Brasil de Fato Pernambuco: Estamos em ano de eleições e vendo que os movimentos sociais estão se mobilizando para participar da disputa eleitoral colocando candidaturas. No caso dos movimentos do campo, o que motiva essa estratégia?
João Pedro Stédile: O Brasil está vivendo a pior crise dos 200 anos, uma crise estrutural do capitalismo que juntou com milhões de brasileiros na calçada, que acabou com as políticas públicas para a agricultura familiar e para a reforma agrária, e que voltou com a fome. Então, portanto, nós estamos dizendo que no dia 2 de outubro nós vamos estar em uma encruzilhada em que o povo brasileiro vai ter que decidir se vai continuar com esse projeto insano, genocida do Bolsonaro ou vai ter outro projeto de país.
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BdF PE: São diversas as pautas dos movimentos do campo. O que a Via Campesina aponta como pautas em comum entre os movimentos?
Stédile: Existem muitos temas que dizem respeito a toda população que vive no campo. Então, de fato, as várias formas de movimento procuram expressar o que é comum. Primeiro é que a agricultura seja organizada para produzir alimentos saudáveis. Para produzir alimentos saudáveis tem que adotar a agroecologia. A agricultura precisa ser um lugar de bem-estar para as pessoas e, portanto, é nosso papel também defender a natureza, defender o desmatamento zero. Não derrubar mais nenhuma árvore e reflorestar para salvarmos o planeta e não só o Brasil.
E nós precisamos também organizar no campo a agroindústria na forma cooperativa para poder industrializar os alimentos e transportar até as grandes cidades; recuperar todas as políticas públicas que favoreciam a agricultura familiar como o PAA, o PNAE, como os programas de assistência técnica, e ampliar os programas de educação, como era o PRONERA, como era a ampliação dos IFETES no interior.
BdF PE: A maioria das candidaturas do MST estão localizadas no Nordeste. A região é uma prioridade nesse sentido da luta institucional e partidária?
Stédile: O que nós temos dito é que será fundamental nós termos uma bancada poderosa de parlamentares de esquerda, comprometidos com a classe trabalhadora, seja para o legislativo estadual, seja para a Câmara dos Deputados. Não só o MST, a CONTAG, a CONTRAF, os quilombolas, os pescadores. Todo mundo está engajado nessa missão que é eleger parlamentares para as assembleias legislativas e para a Câmara dos Deputados que sejam comprometidos não só com os camponeses, mas comprometidos com a classe trabalhadora e as mudanças que o Brasil precisa. E o MST em cada estado, não é só aqui no Nordeste, tem apresentado candidaturas junto com outras forças populares do campo e da cidade.
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BdF PE: Em nível de América Latina nós temos diversas experiências de ocupação dos povos do campo em espaços de decisão de poder. Quais lições podemos tirar neste sentido?
Stédile: A lição que vem da América Latina é que as mudanças estruturais frente a essa crise do capitalismo necessariamente dependem de mobilizações populares. Foram as mobilizações populares que fazem ganhar eleições, como nós vimos no Chile, recentemente, e como nós vimos na Colômbia.
O segundo ponto é que nós temos que combinar a luta institucional, através das eleições de governantes e parlamentares, com a luta de massas para conquistar aqueles direitos que estão na constituição brasileira. E a terceira lição, que é comum de toda a América Latina, é que nós temos que colocar energia na formação de militantes, na educação, para elevar o nível educacional da nossa base. Como disse José Martí, pai da pátria latinoamericana, só o conhecimento liberta verdadeiramente as pessoas.
BdF PE: As candidaturas vêm do campo, mas para disputar as eleições precisam dialogar com os meios urbanos, que são onde está concentrada a maior parte do eleitorado. Qual a expectativa dessa experiência para o fortalecimento dessa relação entre campo e cidade?
Stédile: A nossa experiência nesse trabalho tem sido fantástica porque nos deu a oportunidade de ir falar com as pessoas. Ir de casa em casa, ir às praças públicas, fazer atos culturais. Ou seja, dialogar com o povo da cidade. E o que nós falamos com o povo? Falamos que estamos enfrentando a fome, que nós estamos enfrentando o desemprego e que é preciso salvar o planeta por causa do clima.
Então, esses temas que nós não teríamos possibilidade de dialogar com a cidade, em função da campanha, nos permite dialogar e a população se dá conta de que não vai acabar a fome se os camponeses não tiverem condições de produzir alimentos.
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Edição: Vanessa Gonzaga