No dia 13 de novembro, será aplicada a primeira prova do Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM). Os estudantes terão que responder 90 questões das provas de Linguagens e Ciências Humanas, além de escrever uma redação. Para os alunos da Escola de Referência em Ensino Médio Otacílio Nunes de Souza, em Petrolina, no sertão de Pernambuco, esse será um desafio ainda maior. Isso porque passaram quase o ano inteiro sem professores das disciplinas de Geografia, Matemática, Filosofia, História e Redação.
Ao longo do ano, dezenas de ofícios foram enviados pela gestão da escola à Gerência Regional de Educação (GRE). Telefones, e-mails, encontros presenciais e tentativas de diálogos. A resposta era sempre a mesma: não temos professores disponíveis. A situação deixou 13 turmas prejudicadas.
Miriam Letícia, coordenadora pedagógica da escola, conta que, certa vez, a gestora-adjunta do Otacílio Nunes foi à GRE e entregou ofício para todos os setores. "Alguns setores até diziam: ‘não é aqui’. A gestora disse: 'não, mas, dessa vez, nós estamos entregando em todos os setores. Se reúnam e resolvam essa situação'”. Mesmo assim, não houve resultado.
Vários pais e responsáveis cobravam uma resolução. Uma mãe chegou a pedir a transferência de sua filha; outra, se dirigiu pessoalmente à GRE e teve como devolutiva a resposta de que não estavam a par da situação. Esse foi o estopim para que os próprios estudantes se mobilizassem e fizessem um protesto nas ruas de Petrolina.
Protagonismo estudantil nas ruas
Há um mês, no dia 4 de outubro, os estudantes se concentraram em frente à GRE para reivindicar os professores. Sem grêmio estudantil, a iniciativa foi organizada pelos líderes de turma. A direção da escola apoiou o ato e os acompanhou até o local.
“Nós trabalhamos muito aqui o protagonismo juvenil. Sabendo que eles não poderiam sair do espaço físico da instituição em horário escolar, os acompanhamos”, conta a coordenadora pedagógica.
“Como somos alunos do 3º ano, nós não podemos concluir o ano sem essas notas. Além disso, estamos nas vésperas do Enem. Tivemos que tomar a iniciativa de lutar pelos nossos direitos, para que sejam atendidos e respeitados”, defendeu uma das líderes de turma envolvida no ato.
No dia, a Secretaria de Educação de Pernambuco informou em nota que os professores de Matemática e História foram encaminhados para a unidade de ensino, e que foi autorizado o aumento de carga horária da professora de Ciências da Natureza. Em relação ao professor de Geografia, disciplina mais prejudicada, o órgão informou que seria feita uma mobilização com os professores da coordenação de ensino para criar um cronograma de reposição da aprendizagem com aulões.
Assim, o problema de um ano foi “resolvido” em um dia. Um replanejamento foi feito para readequar as aulas com foco total nos temas recorrentes na prova do Enem. Além disso, a GRE encaminhou professores para realizarem aulões. A tentativa era recuperar o tempo perdido.
O prejuízo que fica
Contudo, o plano de retomada inspirado nos "50 anos em 5" não é tarefa fácil. A coordenadora pedagógica do Otacílio Nunes demonstra aflição quanto à lacuna que ficará para os alunos do 3º ano, que não terão a chance de repor o conteúdo, como os alunos do 1º e do 2º.
Ela também se preocupa com a performance dos alunos no Enem. "É um grande prejuízo. A gente sabe que tem aqueles alunos que buscam além da escola, mas são aqueles que têm condições de pagar um cursinho. E os que não podem?", questiona Miriam.
Para outra líder de turma envolvida nos protestos, a situação é bastante complicada. "Temos um déficit muito grande, tanto com a pandemia, quanto com isso. Embora chegue o professor, já estamos sem tempo", lamenta a estudante. A saída, segundo ela, é correr atrás fora da escola.
Para além dos professores
Além da questão do déficit de professores, a equipe de reportagem do Brasil de Fato Pernambuco ouviu da coordenação da escola mais críticas sobre as condições de ensino da unidade, que dribla as adversidades para atender a 720 alunos. Desde 2010, o Otacílio Nunes tornou-se uma Escola de Referência em Ensino Médio (EREM), com ensino semi-integral. No entanto, Miriam Letícia afirma que nunca houve uma reestruturação do espaço físico da unidade.
Não há auditório para reuniões de pais; os alunos não possuem local adequado para apresentações; a alimentação é servida no pátio e não há refeitório, os alunos se alimentam espalhados pelos espaços da unidade. “A cozinha... é desumano como trabalham lá. Não há ventilação, nem espaço”, partilha a coordenadora.
Ainda assim, em 2023 a escola deverá passar para o regime integral. A esperança é que, para isso, outros aspectos para além dos professores sejam priorizados; e que os danos da pandemia e de um ano conturbado sejam contornados.
Edição: Vanessa Gonzaga