Você sabe o que são doenças raras? Se não, já deve pelo menos ter ouvido falar sobre o assunto no mês passado. Segundo o Ministério da Saúde, doenças raras são doenças que têm diversas características em seus sinais e sintomas e que podem variar de acordo com cada uma delas ou com cada pessoa. Um conceito amplo e pouco conhecido que tem no mês de fevereiro um calendário de conscientização para que o tema alcance mais pessoas.
É neste sentido que atua a enfermeira obstétrica, Camilla Jordão, que é mãe da pequena Maria Lia de dois anos. Lia tem o diagnóstico da Síndrome do Atraso do Desenvolvimento Hipotonia e Ataxia (EBF3-HADDS), uma doença rara. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), existem cerca de seis a oito mil doenças raras no mundo e Camilla utiliza o Instagram para falar sobre uma delas e as suas vivências como mãe. Assista à entrevista:
Brasil de Fato: O próprio conceito de doenças raras é algo bem amplo. Se fosse para destacar alguma característica de acordo com a sua vivência como mãe da Maria Lia, qual seria?
Camilla Jordão: A gente costuma dizer aqui na nossa família que temos uma joia rara, uma joia rara raríssima. E a gente olha muito para Lia para além do diagnóstico da doença que ela teve. Para a gente, ela é única, rara e especial, mas por definição a gente pode dizer que uma doença é considerada rara quando ela corresponde a 65 pessoas a cada cem mil indivíduos, essa é a informação que a gente tem.
Brasil de Fato: Você pode contar um pouco como chegou o diagnóstico de Síndrome do Atraso do Desenvolvimento Hipotonia e Ataxia?
Camilla Jordão: Foi bem difícil a gente chegar em um diagnóstico porque, como eram sinais muito vagos e muito gerais, não dava para clinicamente chegar a uma resposta. Como ela nasceu bem no auge da pandemia, a gente estava vivendo aquele contexto de muito isolamento. A gente não tinha convivência com outras famílias, com outras crianças, e perdia um pouco esse parâmetro do que era considerado um desenvolvimento esperado para a faixa etária dela ou do que estava fugindo do esperado. Eu sou da área da saúde, assim como o meu companheiro e, a medida em que ela foi passando as semanas e meses, começamos a perceber alguns sinais que despertavam dúvidas sobre se estava tudo bem mesmo ou existia algum diagnóstico. Por exemplo, ela sempre foi uma bebê mais molinha, então a gente carregava mais ela no colo e ela demorou um tempo para sustentar o pescocinho. Ela demorou um tempo para sentar e se apoiar. Quando a gente carregava ela para trocar fralda ou para andar com ela no colo, ela sempre precisava de mais apoio nas costas e no pescoço.
Brasil de Fato: O que te motivou ir para as redes sociais falar sobre essa vivência com Maria Lia?
Camilla Jordão: Como Lia nasceu na pandemia, as redes sociais para mim sempre foram ferramentas essenciais para interagir com outras mulheres, com outras mães que estavam passando por situação parecida com a minha no puerpério. Quando veio o diagnóstico não foi diferente. Eu abri uma página no Instagram com o tema específico da síndrome de Lia e pude me conectar com outras famílias pessoas que tinham interesse no tema ou que tinham o diagnóstico. E a partir desse movimento eu me conectei com pessoas do mundo inteiro. Recentemente, inclusive, uma mãe que mora na Rússia, que fala outro idioma e tem outro alfabeto, identificou a gente e conseguiu ter esse contato. É algo muito bom a gente ter essa possibilidade da internet e das redes sociais, tanto pela sensação de estar em rede e no coletivo, quanto por esse fluxo de informação que é muito mais rápido.
Brasil de Fato: Fevereiro é um mês de conscientização, mas também de reivindicação de políticas públicas. Quais são as principais lutas de pessoas e famílias que convivem com doenças?
Camilla Jordão: Fevereiro é escolhido por ser um mês diferente, por ser um mês raro. Afinal, ele tem menos dias do que os outros meses. Fevereiro é o mês escolhido para essa sensibilização, para esse movimento de sensibilizar governantes, pessoas da sociedade em geral e profissionais de saúde acerca da existência das doenças raras. Muitas vezes, durante acadêmica, nas universidades, os profissionais de saúde tem a informação de que ‘primeiro vamos pensar no mais elementar, o grosso, no que afeta a saúde pública como um todo, em larga escala’, digamos assim, e com isso começa a suspeitar de algo mais comum, que é mais corriqueiro em todos os livros. E deixa para investigar doenças raras, que afetam igualmente ou até mais a saúde da população, por último e o que a gente vê é que é preciso fazer esses dois movimentos em paralelo. A gente vai investigar o que é mais corriqueiro ao mesmo tempo em que suspeita de uma doença rara.
Edição: Elen Carvalho