Pernambuco

Entrevista

Aumento de desastres naturais no NE: pesquisador aponta contradição nas políticas públicas

Para o pesquisador baiano, Diosmar Filho, a atenção do poder público sobre o clima deve priorizar a população

Nordeste |
Rio Branco tem 32 mil famílias afetadas pelas fortes chuvas que iniciaram na última quinta-feira (23) - Pedro Devani/Secom Acre

De acordo com um estudo da Associação de Pesquisa Iyaleta, da Bahia, a quantidade de populações das regiões Norte e Nordeste impactadas por desastres naturais tem aumentado. A pesquisa aponta para a urgência na área de políticas públicas voltadas para a adaptação às mudanças climáticas. Sobre o assunto, o Brasil de Fato Pernambuco conversou com o coordenador científico da associação, Diosmar Filho. Confira:

 

Brasil de Fato Pernambuco: Recentemente, vocês da Associação de Pesquisa Iyaleta realizaram um estudo que evidencia o aumento de populações afetadas por desastres naturais nas regiões Norte e Nordeste. Como foi feito esse estudo e quais as principais constatações que ele traz a situação dessas regiões?

Diosmar Filho: É um estudo em que as pesquisadoras da Iyaleta sistematizaram dados para apresentar evidências no campo das desigualdades e mudanças climáticas. É um estudo em que a gente amplifica o debate sobre a construção de políticas públicas para adaptação, pensando que a adaptação precisa partir de uma realidade e a realidade que nós temos é  que nas principais capitais da região Norte e Nordeste a população vive naquilo que é chamado de aglomerados subnormais. Se você pega o Nordeste hoje, vê que é o pulmão da energia renovável para o desenvolvimento do país, mas vê que tem uma população vivendo no Semiárido, que tem longas estiagens históricas e não tem políticas públicas de prevenção. Já tivemos um avanço com as políticas de convivência com o Semiárido, do governo federal, mas houve redução dessa política. Ao ter redução dessa política, você tem a região produzindo energia renovável limpa, mas a população está vivendo calamidades públicas. As longas estiagens que chamamos de seca também fazem parte do Estado de Emergência em Mudanças Climáticas. Na região Nordeste, desde 2020, as capitais litorâneas atlânticas são onde estão acontecendo os maiores desastres de correntes de aumento de chuva.

Você pode explicar para a gente o que é o Plano Nacional de Adaptação do Clima e porque ele é importante para a nossa forma de lidar com as mudanças climáticas?

O plano nacional é aquilo que foi regulamentado dentro do processo do Acordo de Paris (2006) para pensar um conjunto de políticas públicas direcionado a gestão de risco, investimento em áreas que precisam ter capacidade de responder ao aquecimento global que estamos vivendo, que tem resultado no aumento de chuvas em zonas urbanas e rurais, assim como períodos de longas secas em regiões semiáridas e no cerrado. Na adaptação você tem investimento para recuperar bacias hidrográficas nas áreas que estão mais degradadas ou passando por processos de savanização, como é o caso do que está acontecendo em Boa Vista, a capital de Roraima, no Norte. Quando você pensa em um plano nacional de adaptação, pensa em um conjunto de ações que vai atuar sob esses cenários. E você também vai preparar novas realidades de vida nessas cidades ou no campo, em decorrência desse aumento de eventos. Recuperar bacia hidrográfica, fazer política de prevenção de risco, investimentos em acesso à água e moradia de qualidade, com energias mais sustentáveis.

O estudo de vocês foi lançado na 27ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, a COP 27. Após as discussões nesse espaço e analisando o cenário social, político e econômico no Brasil, quais são as expectativas de colocar o assunto como prioridade neste momento?

Na nossa perspectiva, há muita possibilidade a ser feita, pensando que a adaptação dentro da agenda da ONU (Organização das Nações Unidas) que vai para a COP28 é a área que vai avançar para metas e objetivos globais. Isso significa que o Brasil, com o seu novo cenário político, vai precisar avançar construindo uma agenda de investimento público e privado em ações de adaptação em cidades de todas as regiões. Nós estamos pesquisando para que mude a realidade do Norte e Nordeste, para que toda a atenção que tem na Amazônia para as florestas e no Semiárido para as eólicas e plantas industriais de energia solar, seja revertida em cuidado das populações que vivem nas cidades dessas duas regiões.

Edição: Elen Carvalho