As sessões públicas de defesa são uma forma de apresentação formal da academia com a sociedade
As defesas de qualificação (trabalhos de conclusão de curso da graduação, mestrado e doutorado) costumam ser momentos marcantes na vida de todos que cruzaram a vida acadêmica. Do ponto em questão há duas visões críticas a serem discutidas: as expectativas de uma geração baseada nos likes de redes sociais e a sisudez de um mundo acadêmico que encara a defesa como um ritual de passagem – figurando assim como dois olhares totalmente conflitantes.
Enquanto que a expectativa de estudantes e familiares é a de uma festa repleta de selfies e postagens, o olhar da banca permanece como a de um momento de culminância avaliativa (em que entra um doutorando e sai um doutor, daí o conceito de passagem). A razão para este choque se dá pelo distanciamento evidente entre academia e sociedade, seja pela estranheza do povo para com os protocolos e ritos acadêmicos, seja pelo pouco interesse da academia em ser didática sobre os processos com o povo que vive fora de seus muros.
É fato que o ambiente acadêmico é baseado no questionamento e argumentação e é assim que a ciência avança – o efeito prático do elogio para a evolução do conhecimento não é tão relevante quanto aquele que as pessoas experimentam (porém o avanço do conhecimento depende de gente de carne, osso e sentimentos). Para completar esta equação tão complexa, há uma linha quase invisível separando a característica indagadora da ciência da arrogância típica de muitos pesquisadores.
Enquanto crítica construtiva, o papel da banca é fundamental para a formação acadêmica dos estudantes. Já por outro lado, o limite do comentário tóxico leva o processo avaliativo a um patamar de adoecimento extremamente arriscado. Esta é a dificuldade de todo o processo que segue cada dia mais temido pelos estudantes: um choque de gerações que envolve a relação temporária de avaliador e avaliado – um recorte espaço-temporal de horas em que muito mais que conhecimento está envolvido – ali também estão os egos.
Para controlar todo este processo, é fundamental que ambos os lados estejam preparados para este dia: do lado do estudante a ser avaliado, é necessária preparação emocional para a crítica e o entendimento de que o trabalho e a questão pessoal fiquem sempre distantes um do outro. Do outro lado, o avaliador precisa entender que este é um momento do estudante e não dele, que precisa focar nas contribuições de fato essenciais para o trabalho.
Problemas graves que possam levar a uma reprovação devem ser identificados com antecedência, de forma a evitar o próprio agendamento da defesa. É costume o ditado no meio acadêmico de que: “se está agendada a defesa, é porque está tudo bem”. É evidente que surpresas desnecessárias explodindo na defesa devem ser evitadas (por isso mesmo que qualificações e pré-defesas são até mais importantes que a própria defesa).
Não se pode esquecer que as sessões públicas de defesa são uma forma de apresentação formal da academia com a sociedade. É esperado o respeito mútuo, a prática da política de boa vizinhança, da humildade e o mais importante: da consciência de que as insígnias acadêmicas são símbolos de um esforço coletivo. A ciência, enfim, é o fruto de um processo coletivo e anônimo em que o recorte temporal define quem sobe no ombro de quem.
O ser anônimo talvez seja o mais assustador dos fantasmas para os acadêmicos, que desejam a imortalidade por seus teoremas, modelos e descobertas, mesmo sabendo que as novas fronteiras do saber não tem um dono, mas sim toda a espécie humana. Talvez lembrar de nossa insignificância frente ao universo sirva de choque para nos fazer entender que toda a arrogância acadêmica é colocada como uma venda para os olhos daqueles que poderiam ver mais longe. Lembre disso em sua próxima defesa. Orientadores e orientandos: menos é mais.
Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato Pernambuco.
Edição: Vanessa Gonzaga