No segundo maior município de Pernambuco, Jaboatão dos Guararapes, quem desponta como favorito - ao menos para liderar o 1º turno - para a eleição de outubro é a candidatura do PT, encabeçada pelo ex-tucano Elias Gomes. O cenário tem um quê de surpresa, visto que no último ciclo, tem sido terreno fértil para políticos bolsonaristas. O prefeito Mano Medeiros (PL), afilhado político dos Ferreira, terá a deputada federal Clarissa Tércio (PP) como competidora pelo voto evangélico.
A última pesquisa de intenção de votos no município está desatualizada. Em setembro de 2023 o nome favorito era o da ex-deputada federal Marília Arraes (Solidariedade), que foi candidata a governadora em 2022. Marília liderava com 29%, seguida por Elias Gomes (PT), que tinha 22%. O prefeito Mano Medeiros (PL) aparecia com 15% e a Clarissa Tércio (PP) com 11%. O ex-vereador Daniel Alves (Avante), que foi candidato em 2020, tinha 9%.
Mas fato é que Marília Arraes nunca anunciou sua candidatura. Ela e o Solidariedade declararam apoio ao nome de Elias (PT), que também firmou apoio do MDB, do Republicanos e deve realizar uma festa para celebrar o apoio do PSB. Por ser a candidatura do PT, Gomes arrasta consigo PCdoB e PV, que estão vinculados ao PT na Federação Brasil da Esperança.
Elias também tem, em relação aos adversários, a vantagem do trabalho bem avaliado quando foi prefeito, de 2008 a 2016, quando ainda vestia a camisa do PSDB. Antes foi prefeito do Cabo de Santo Agostinho, também por dois mandatos - inclusive tendo um vice-prefeito do PT.
A sindicalista e ex-metalúrgica Maria Auxiliadora - ou simplesmente “Dôra” -, presidenta do PT de Jaboatão, considera “natural” a entrada de Elias no PT. “Elias tem mais de 40 anos de vida política. Ele começou no PCB e ao longo dos anos foi ao centro, depois direita, mas nunca foi extrema-direita. Agora está voltando para a esquerda, voltando para casa”, diz a petista.
Dôra admite tê-lo convidado para o PT desde 2020. “Temos esse ‘namoro’ desde lá”, recorda ela, que avalia que o PT deve ser ativo na formação de um grande bloco que isole o bolsonarismo. “Temos que entender qual é o nosso papel nesse momento histórico, diante do avanço da extrema-direita no Brasil e no mundo”, opina. “Queremos imprimir o modo petista de governar aqui em Jaboatão, com uma frente ampla. Por isso temos conversado com todo mundo”, completa.
Questionada sobre o histórico recente de votos em candidaturas bolsonaristas no Jaboatão, Maria Auxiliadora “defende” o município. “Aqui não é um lugar terrivelmente bolsonarista, mas terrivelmente esquecido. Nunca foi prioridade. E isso abriu espaço para oportunistas, que têm usado a fé das pessoas para enganá-las na hora da eleição”, diz a petista. “Temos o 2º maior eleitorado e um território enorme na região metropolitana, com mais da metade da população na zona rural e o restante em aglomerados urbanos. É muito difícil fazer campanha aqui”, avalia.
Para completar, o município também tem pouca estrutura de meios de comunicação. “Não temos guia de TV, só de rádio. Mas quais são as rádios do município? A Maranata FM, que pertence aos Ferreira (dirigentes do PL); a Novas de Paz, pertencente aos Tércio; e a Ritz FM”, explica. O principal meio de informações sobre o município, segundo Dôra, acaba sendo o whatsapp. “Por isso o nosso diferencial tem que ser o corpo a corpo”, resume.
Auxiliadora mora no bairro do Curado I e conta que a localidade tem, no momento, oito pontos sob risco de desabamento neste período de chuvas. “Em 2022 foram 64 vidas perdidas, mas até hoje o prefeito não fez nada. Agora ele tirou as lonas e colocou uma nova estrtura, frágil, que não aguenta chuva”, avalia ela, cuja mãe foi vítima das chuvas de dois anos atrás. “As pessoas continuam em risco e ninguém dorme em noite de chuvas. É um governo de mentira e de descaso nas periferias e até na região das praias”, diz ela.
Caso Elias avance ao 2º turno, a tendência é que o bloco bolsonarista se una contra o candidato petista. Mas Dôra está confiante no trabalho que o partido tem feito. “Estamos o tempo todo dialogando e construindo relações com o público evangélico, escutando a população. Queremos governar para todos, não para pastores A ou B”, diz a petista.
Ela estima em 35% a população evangélica no município. “Não é possível que sejam todos dos Tércio ou dos Ferreira”, diz ela, mencionando pastores que são pré-candidatos nas chapas do PT e do PCdoB em Jaboatão. “Conheço muitos evangélicos que sempre votaram no PT. O problema é que algumas pessoas deixaram de seguir Jesus Cristo e agora seguem Bolsonaro”, provoca ela.
Bolsonarismo dividido
Desde a ascensão de Jair Bolsonaro, em 2018, algumas figuras “trocam cotoveladas” na disputa por espaço no espectro conservador em Pernambuco. Os irmãos Anderson (ex-prefeito de Jaboatão) e André Ferreira (deputado federal), que se construíram politicamente com o voto evangélico, conseguiram manter a liderança dentro do PL.
Mas a família Tércio, que comanda a Assembleia de Deus Ministério Novas de Paz, corre na mesma raia. Começaram no PSC (atual Podemos). Numa ascensão meteórica, em 6 anos o casal Clarissa Tércio (PP) e Junior Tércio (Podemos) conquistou quatro mandatos e hoje são, respectivamente, deputada federal e estadual.
O prefeito Mano Medeiros (PL) foi eleito como vice em 2020 e assumiu a gestão quando Anderson Ferreira (PL) deixou a prefeitura para disputar o Governo do Estado. Antes, Medeiros foi secretário no primeiro mandato de Ferreira e é nome de confiança dos irmãos Anderson e André, bolsonaristas que comandam o PL no estado. Medeiros já fechou apoio do União Brasil, PSD, PRD (antigo PTB) e Partido Novo.
Uma curiosidade fica sobre a posição da governadora Raquel Lyra (PSDB) em Jaboatão. Ela está se distanciando do PL dos Ferreira e se aproximando do PP de Eduardo da Fonte. Caso Raquel decida pelo apoio à candidatura de Clarissa Tércio, a escolha pode ser vists como um abraço ao bolsonarismo, espectro do qual ela também tem tentado se distanciar.
A deputada federal Clarissa Tércio (PP) só garantiu, até o momento, o apoio do Podemos do seu esposo Junior Tércio. O deputado estadual William Brígido, filiado ao Republicanos e líder da Igreja Universal, já declarou que não apoiará Elias, mas Clarissa. Essa será a primeira disputa majoritária da família Tércio, que prepara novos nomes para ocupar vagas nas câmaras do Recife e de Jaboatão.
Os dois grupos bolsonaristas finalmente se enfrentam numa disputa majoritária este ano, ambos buscando o voto bolsonarista e evangélico. A corrida ganhou um tempero vindo de Ipojuca, município mais ao sul. O PL ipojucano era comandado por Eduardo Machado, irmão do ex-ministro bolsonarista Gilson Machado. O PL abrigaria Adilma Lacerda, candidata da atual prefeita.
Mas os irmãos Ferreira deram uma rasteira na cúpula local, anunciaram a filiação e pré-candidatura da atual vice-prefeita Patricia de Leno (em oposição a Adilma) e ainda destituíram Eduardo Machado da direção municipal. Gilson, que é próximo de Bolsonaro, reagiu ameaçando convencer o ex-presidente a apoiar Clarissa Tércio (PP), “bolsonarista raiz”, contra a candidatura do próprio PL dos Ferreira.
No campo democrático, Daniel Alves (Avante), que em 2020 se lançou para a prefeitura e obteve 81,8 mil votos (30,7%), numa disputa liquidada já no 1º turno, este ano tende a encontrar mais dificuldades. Apesar de o atual prefeito ter menos força que o adversário de 2020, há os nomes no campo da oposição são mais competitivos que os da eleição passada, o que tem atrapalhado as articulações do candidato.
Sem conseguir partidos aliados até o momento, a chapa deve ser puro sangue. A vice deve ser ocupada por Vilaneida Aguiar, delegada da Polícia Civil atuando há 7 anos em Jaboatão, especialmente na delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente (DPCA). Vilaneida que se filiou ao Avante inicialmente visando uma candidatura a vereadora.
12 anos sem um vereador do PT
Outro desafio para o PT no município é o histórico recente de pouca força nas disputas municipais. O partido não elege sequer um vereador em Jaboatão há mais de 10 anos. Os últimos foram Ricardo Valois e Robson Leite, ambos em 2012. Em 2016, Valois trocou o PT pelo PR (atual PL) para compor como vice-prefeito na chapa vitoriosa de Anderson Ferreira. O desempenho do PT foi desastroso: somou 1,9 mil votos, apesar da candidatura própria de Inaldo Metalúrgico (3,8 mil votos, 1,3%).
O coeficiente eleitoral para conseguir ao menos uma das 27 cadeiras na Câmara de Vereadores é estimado em 12 mil votos. Na disputa mais recente, em 2020, o PT somou 3,3 mil votos, novamente não elegendo ninguém. O PCdoB, que teve como candidato a prefeito Arnaldo Delmondes (5º colocado, com 5,1%), se saiu melhor (14,9 mil) e elegeu um parlamentar - mas ele não tardou em aderir à base governista e hoje se soma ao bloco do prefeito Mano Medeiros (PL).
Para 2024 a chapa da Federação Brasil da Esperança terá 28 candidaturas, sendo 9 do PT, 9 do PV e 10 do PCdoB. As fileiras petistas ganharam os reforços do sindicalista Henrique Metalúrgico (ex-PCdoB), o ex-vereador petista Robson Leite e a professora Maíra Vilar, que há 4 anos foi candidata a prefeita pelo PDT, quando somou 19,9 mil votos (7,5%). Em 2022 foi candidata a deputada federal pelo PV.
Os reforços, somados à uma candidatura majoritária competitiva - fator que normalmente reverte votos para a chapa de vereadores -, deixa presidenta municipal do PT confiante. “Acho que a federação elege quatro ou cinco. E o PT faz um ou dois”, avalia Dôra, que aponta a diversidade da chapa petista como fator relevante. “Temos advogado, médico, pastor, líder comunitário... e muito bem distribuídos por todas as regiões do município”, diz ela. “Hoje a câmara é um balcão de favores. Precisamos renovar, até para dar sustentação para o nosso prefeito”, completa.
Auxiliadora recorda que em 2022, nas disputas para deputado estadual e federal, Jaboatão deu 6 mil votos na legenda do PT. Ela acha a candidatura de Elias tende a alavancar esse número. “Temos duas forças unidas: Elias e o PT de Lula. Ambos com serviços prestados para mostrar ao povo”, diz ela. “Mas eu quero que vote o 13 e também os outros números dos nossos candidatos, que é melhor que o voto na legenda”, diz a dirigente petista.
Edição: Helena Dias