A tentativa de ganhar um dinheirinho virou uma máquina de endividamento das famílias mais pobres
Endividamentos faraônicos, brigas com a família e amigos, crises de ansiedade, depressão e até mesmo tentativas de tirar a própria vida. Esse é o buraco negro que está por trás das “bets”, as casas de apostas que explodiram no Brasil nos últimos anos.
O que era para ser uma tentativa de ganhar algum dinheirinho a mais virou uma verdadeira máquina de endividamento, especialmente da população mais pobre, que - por não conseguir viver com a baixa renda - acaba acreditando nas publicidades veiculadas nas redes sociais, nos comerciais de rádio e TV e em outdoors, afirmando que a aposta é um jeito fácil e rápido de ganhar dinheiro.
Depois do crescimento desenfreado das bets, agora estamos pagando o custo invisível da dependência em apostas. Só para termos uma dimensão da gravidade, 30% dos beneficiários do Bolsa Família, cerca de 16 milhões de pessoas, já apostaram em “bets” - e, desse total, 26% se endividaram por causa dos gastos com os jogos, de acordo com uma pesquisa do PoderData.
O vício tem começado cada vez mais cedo. Neste mês de outubro, diversas reportagens noticiaram que estudantes beneficiários do programa Pé de Meia utilizaram a bolsa recebida pelo programa para apostar. Um dos relatos dos estudantes era de que “quando eu perdia, acordava querendo jogar para tentar recuperar”. Isso é muito grave, especialmente porque as apostas estão chegando até as crianças, que estão mais suscetíveis à dependência. Segundo um estudo da Unicef, 22% dos adolescentes começaram a apostar em jogos de azar pela primeira vez aos 11 anos.
As bets e a publicidade em torno delas se apoiam numa espécie de apagão legislativo, já que não existem até o momento leis em vigor que regulem as apostas e a publicidade delas, que inclusive tem virado notícia nas páginas policiais, com influencers sendo presos após serem acusados de utilizarem as bets para lavar dinheiro. Enquanto alguns enriquecem de forma ilícita, a população mais pobre se vê viciada nesses jogos de azar.
É por isso que nós, que estamos nas Assembleias Legislativas, temos uma tarefa urgente: criar leis para que as casas de apostas tenham limites na sua atuação. No Senado, temos o PL 3563/2024, do senador Randolfe Rodrigues (PT), que limita a propaganda de bets; na Câmara Federal temos o PL 3670/24, do também petista Reginaldo Lopes (PT-MG) que proíbe o uso de cartões de crédito e do cartão do Bolsa Família para apostas. Junto a esses exemplos, aqui em Pernambuco nosso mandato criou dois projetos de lei para lidar com esse tema no nosso estado.
O PL 2290/2024 cria diversas medidas de proteção à saúde da população pernambucana exposta aos sites ou aplicativos de apostas. Entre as ações, estão a proibição de divulgação de sites ou aplicativos de apostas em redes sociais, na internet, em meios de comunicação como o rádio e TV e também em eventos. O projeto pede também que a Secretaria de Saúde promova campanhas de conscientização sobre os riscos relacionados às bets.
Também queremos criar a “Semana Estadual de Conscientização quanto à Prevenção de Dependência em Apostas”, através do PL 2293/2024. Muitas vezes a pessoa que está viciada em apostar tem dívidas praticamente impossíveis de pagar, já está com a relação abalada com sua família e amigos e se vê, muitas vezes, sem saída, o que pode ter um impacto direto na saúde mental, agravando problemas de saúde já existentes. Por isso a necessidade de ter uma semana voltada à conscientização sobre a dependência em apostas, especialmente para prevenir que outras pessoas entrem neste caminho.
É por isso que a questão do vício não pode mais ser tratada como uma demanda individual, mas como um problema de saúde pública, e que precisa de ações específicas. É por isso que propusemos os projetos de lei, para que nosso estado possa lidar com essa questão com ações concretas. Assim, vamos coletivamente avançar na compreensão do impacto das “bets” na nossa saúde pública e evitar que mais pessoas tenham sua saúde mental prejudicada pela dependência.
Edição: Vinícius Sobreira