Sob protesto de mulheres, nesta quarta-feira (27), a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara Federal aprovou, por 35 votos favoráveis e 15 contrários, a Proposta de Emenda Constitucional nº 164/2012, que visa tornar crime quaisquer tipos de aborto de gestação. Entre os votos favoráveis, está o de um deputado pernambucano: Fernando Rodolfo, do PL.
A PEC acaba com o direito ao aborto legal, mesmo nos casos em que a mulher foi vítima de estupro, casos em que o feto é anencéfalo (sem cérebro) ou quando a gestação coloca em risco a vida da mulher.
Dois pernambucanos estiveram na lista dos 15 votos contrários a essa PEC: os deputados Renildo Calheiros (PCdoB) e Waldemar Oliveira (Avante). Também têm direito a voto na CCJ os deputados Maria Arraes (Solidariedade), que está de licença maternidade; Felipe Carreras (PSB) e Mendonça Filho (União), que não votaram sobre o tema.
Leia: Sob protestos, CCJ da Câmara aprova PEC do Estupro, que acaba com aborto legal, por 35 votos a 15
PEC que acaba com o aborto legal contou com assinaturas de políticos pernambucanos; saiba quem são
Os partidos PT, PCdoB, Psol, Rede, PSB e PV orientaram voto contrário à mudança na lei, buscando manter o direito das mulheres ao aborto legal e seguro para os casos atualmente permitidos. Esses partidos, no entanto, somam menos de 20 deputados na CCJ, comissão que conta com 66 membros titulares. Ainda houve um deputado do PT do Piauí, Flávio Nogueira, que votou a favor da PEC. Apesar da orientação do PSB para voto contrário, nenhum parlamentar do partido votou.
Já o PL e o Podemos orientaram seus deputados a votar a favor da proibição total do aborto, visando submeter as mulheres a manter gestações fruto de estupro ou que coloquem em risco as suas vidas. O União Brasil e o PSD liberaram seus deputados para votarem como preferirem - e a maioria foi favorável à mudança na lei.
E agora?
Nos próximos meses a PEC 164/2012 passará por uma comissão especial para debater o seu conteúdo. Só após isso a PEC avança para a votação em plenário. A proposta de mudança na Constituição precisa ser aprovada duas vezes no plenário da Câmara, em ambas obtendo apoio de ao menos três quintos (308 votos) dos deputados federais. E depois a PEC segue para análise no Senado e, caso aprovada, vai para sanção presidencial. Só então se tornará lei.
Pernambucanos assinaram a PEC em 2012
Para iniciar sua tramitação, lá em 2012, a PEC nº 164/2012 precisou obter assinaturas de pelo menos um terço (171) dos deputados federais. A PEC foi além e alcançou as 209 assinaturas. Entre elas, nomes de cinco pernambucanos que estavam na Câmara Federal naquele período.
São eles: Carlos Eduardo Cadoca (falecido em 2020), Raul Henry (MDB, não é deputado desde 2022), Paulo Rubem Santiago (ex-PDT, hoje na Rede, mas não é deputado desde 2014) e os deputados Eduardo da Fonte (PP) e Augusto Coutinho (Republicanos), ambos com mandato na Câmara Federal hoje.
Leia também: Mulheres protestam no Recife contra PEC que visa acabar com aborto legal; 6 pernambucanos estão na CCJ
A reportagem do Brasil de Fato Pernambuco entrou em contato com todos eles - exceto Cadoca, falecido - questionando se eles mantém o endosso à PEC. O deputado Eduardo da Fonte (PP) respondeu que, passados 12 anos, segue favorável ao fim do aborto legal, sinalizando que pretende votar a favor quando o projeto for a plenário. “Continuo favorável à PEC 164/2012, que torna inviolável a vida desde a concepção”, diz a nota enviada à reportagem.
Já Paulo Rubem (Rede) diz que discorda do conteúdo, que não assinou e nem assinaria essa PEC. “Houve uma ou duas outras PECs em que meu nome e o de outros parlamentares apareceram como signatários sem que tivéssemos assinado”, diz Santiago, em mensagem enviada ao BdF Pernambuco. “Sempre estive ao lado da Articulação de Mulheres Brasileiras, do SOS Corpo e do Centro Feminista de Estudos e Assessoria”, completa o ex-deputado.
De fato a ata afirma que entre as 209 assinaturas duas “não conferem”, mas não informa quais. Veja a lista completa aqui.
O que diz a PEC?
A PEC 164/2012 visa alterar o Artigo 5º da Constituição Federal, passando a considerar a vida a partir da concepção (ou seja, desde o momento que o óvulo é fecundado pelo espermatozoide) e tornando-a “inviolável”. A mudança de compreensão tornaria crime quaisquer tipo de aborto e colocaria em risco até mesmo o uso de medicamentos como a pílula do dia seguinte.
A proposta é de autoria do ex-deputado Eduardo Cunha (ex-MDB, hoje no Republicanos). Cunha liderou o processo de impeachment contra Dilma Rousseff (PT) e, meses depois, acabou preso por corrupção, lavagem de dinheiro e evasão financeira, condenado a 15 anos de prisão. Hoje ele já está solto e em 2022 conseguiu eleger sua filha Danielle Cunha (União Brasil) deputada federal.
Em junho deste ano, entrou em debate na Câmara Federal um Projeto de Lei que ficou conhecido como “PL do Estupro”, que também visava criminalizar todo e qualquer tipo de aborto no Brasil. A forte mobilização da sociedade, em especial das mulheres, fez com que o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP), engavetasse o projeto.
Mulheres protestam no Recife
Na última segunda-feira (25), “Dia Internacional pela Eliminação da Violência contra a Mulher”, cerca de 200 mulheres protestaram em frente ao Shopping Boa Vista, no centro do Recife. Elas criticam a PEC, defendem o direito ao aborto legal e, num dos principais centros de comércio da capital pernambucana, pediram o fim da escala de trabalho 6x1, visando garantir mais dias de descanso para os trabalhadores e trabalhadoras.
Edição: Vinícius Sobreira