Pernambuco

Coluna

A privatização das praias e o muro da vergonha

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Muro que cerca terreno no Pontal de Maracaípe contém placa com avisos em defesa da propriedade privada - Rebeca Martins
No sonho da direita, pobre não viaja de avião, não faz universidade pública e não deveria ir à praia

Um simples banho de mar, numa praia de sua preferência, poderá ser a coisa mais difícil a se fazer se não possuir dinheiro suficiente para conseguir comprar sua própria praia ou uma diária de um resort all-inclusive. Por mais esdrúxulo que seja, o projeto de privatização das praias no Brasil está tramitando no Congresso Nacional e o povo trabalhador, principal impactado com essa mudança, não está sendo consultado.

O projeto de Emenda à Constituição (PEC) nº 3/2022, chamada de “PEC das Praias”, tem como relator o senador Flávio Bolsonaro (PL do Rio de Janeiro), prevê que pessoas ou empresas possam adquirir terrenos sob responsabilidade da Marinha, áreas que atualmente pertencem à União. Na prática, esses terrenos - que ocupam uma faixa de terra de 33 metros a partir do ponto mais alto das marés, deixariam de ser compartilhados entre a União e as pessoas que ocupam essa faixa, passando a ter um dono, podendo ser uma mansão, um hotel ou resort.

Esse projeto é comemorado por proprietários de grandes empreendimentos hoteleiros, que desejam se apropriar desses terrenos sem qualquer preocupação em garantir o acesso ao mar para você, banhista comum. Do ponto de vista ambiental o projeto é outro desastre, porque essas “propriedades privadas” não teriam mais obrigação de preservar ambientalmente esse terreno. 

Muros serão erguidos, mangues poderão ser aterrados, coqueiros poderão ser derrubados, áreas de restingas e nascedouros de tartarugas marinhas poderão dar lugar a megaempreendimentos com acesso exclusivo ao mar.

O Brasil tem um litoral de 7.491 km de extensão. A privatização das praias acentuaria ainda mais a desigualdade entre ricos e pobres no país. Na república idealizada pela extrema-direita brasileira, pobres não viajam de avião, não vão à Disney, não estudam nas universidades públicas e não deveriam frequentar praias - o passeio mais democrático do país até o momento.

Esse projeto de privatização das praias não ajudará na mediação dos conflitos que já estão presentes em todo o litoral. Ao contrário: a PEC das Praias intensificará a guerra entre o poder econômico e as comunidades locais.

Em Pernambuco, precisamente na praia do Pontal de Maracaípe, no município de Ipojuca, temos uma amostra de como funciona a força do poder econômico em detrimento do povo. A construção de um muro de 576 metros na praia pelo empresário João Vita Fragoso está dificultando o acesso de banhistas e pequenos comerciantes à praia, sendo considerado irregular pela CPRH (Agência Estadual de Meio Ambiente).

Mesmo após protestos de banhistas e comerciantes, decisões e recursos vindos do judiciário e mudanças de posição da própria CPRH, o muro continua lá, impedindo o acesso público ao mar durante o período de maré alta. O poder público, representado pela CPRH, foi desmoralizado após a última tentativa frustrada de demolição desse tal muro.

A articulação para a sua reconstrução de madrugada foi tão sem vergonha que foi registrada em lives nas redes sociais e exaltada pela extrema direita.

A PEC das Praias deve ser rechaçada pela população, que não está sendo ouvida em todo esse processo. Não podemos permitir que transformem nossas lindas praias em propriedades exclusivas de grandes milionários. A população trabalhadora deve ter o direito ao acesso às praias garantido, pois na maioria das vezes é o único recurso de lazer de que dispõe.

Edição: Vinícius Sobreira