Temperaturas de 70 °C. Foi assim que o tema da onda de calor apareceu nos principais termos buscados no Google esta semana. E se você mora em qualquer lugar do Brasil, sabe do que estou falando: está muito quente.
E não é só uma sensação. A temperatura do planeta ficou 1,75 °C acima do nível pré-industrial em janeiro deste ano, batendo recorde na série histórica do Serviço Copernicus para Mudanças Climáticas da União Europeia.
No geral, o aumento de temperaturas e desastres climáticos estão ligados à expansão urbana desordenada e à redução de áreas permeáveis. Ou seja, se não houver mitigação das emissões e um replanejamento urbano, com foco em áreas verdes e permeáveis, provavelmente ficará pior.
E dá pra viver desse jeito? Em extremos assim, problemas de saúde podem ser agravados e atividades corriqueiras como trabalho, estudos e lazer ficam mais difíceis. Mas os danos são especialmente maiores para quem atua em atividades que exigem maior esforço e ocorrem em ambientes externos, como a limpeza urbana, a construção civil e a segurança pública.
No Rio Grande do Sul, por exemplo, uma liminar determinou o adiamento do início do ano letivo da rede estadual devido à onda de calor. Em entrevista ao Brasil de Fato RS, a presidente do Sindicato das Professoras(es) e Funcionárias(os) de Escola do RS (CPERS), Rosane Zan, destacou que a retomada das aulas em meio a um evento climático extremo coloca em risco a vida de todos os envolvidos, já que muitos ambientes escolares não possuem estrutura necessária para enfrentar o clima adverso.
A liminar foi revista e o adiamento durou apenas dois dias. Em nota, o CPERS afirmou que “o governo Eduardo Leite (PSDB) escolhe ignorar a ciência”, enfatizando que “o estado está na rota de mudanças climáticas severas” e pedindo investimentos com urgência na infraestrutura das escolas.
Efetivamente, como o próprio Brasil de Fato foi conferir, o RS foi duramente atingido por uma tempestade histórica no ano passado, da qual muitas pessoas ainda estão longe de se recuperar. Afinal, além do calor, outro evento climático que tem sido frequente é a chuva. E, para ambos os casos, é preciso investimentos em infraestrutura.
Ainda no RS, a vereadora Natasha Ferreira (PT) protocolou um Projeto de Lei que prevê a instalação de fontes de água potável e bebedouros em espaços públicos e privados de grande circulação na cidade.
“Porto Alegre está passando por uma série de reformas, o centro está sendo todo refeito, virado em pedra, ou seja, cimento sem árvore, aumentando o calor. É uma cidade que investe em construção e não no plantio de árvore, nada sustentável. Esse calorão também é uma emergência climática”, afirmou ao BdF RS.
A pesquisadora sênior no Instituto Internacional para Sustentabilidade, Bruna Pavani, lista outras medidas imediatas para lidar com os impactos, mas destaca que são fundamentais ações de prevenção para que a temperatura não suba ainda mais.
"[Precisamos de] mais locais de acesso à água gratuita, locais de sombra, principalmente perto do ponto de transporte público, ar-condicionado, infraestrutura de resfriamento dentro de transporte público, dentro das áreas escolares e de locais públicos. São diversas ações que a gente pode tomar para tentar mitigar os efeitos das mudanças climáticas", defende.
Mas não adianta apenas trabalhar com os efeitos sem lidar com a causa. Por que estamos sofrendo cada vez mais catástrofes climáticas? Para o pesquisador Luiz Marques, escritor do livro O decênio decisivo, as nações não querem se comprometer com a redução da temperatura global.
“Tivemos três grandes tratados internacionais sobre o meio ambiente e, de 1992 para cá, não houve nenhum progresso. Mais que isso, houve regressão acelerada. Então, nós estamos falando de um fracasso com letras garrafais. Fracassamos completamente.”
Internamente, ele ainda reforça que o agronegócio é nosso grande inimigo: “Uma das razões do que aconteceu no RS é pelo fato de que a Mata Atlântica foi completamente, ou quase completamente, destruída para colocar soja ali. Se você não tem floresta, não há um esquema de esponja, a floresta é fundamental para isso”.
Ou seja, está quente, vai piorar e pouco tem sido feito no sentido de mitigar as causas — ou mesmo lidar melhor com as consequências. É preciso denunciar, garantir o cumprimento de tratados internacionais e dar nomes aos culpados. A nossa sobrevivência como sociedade depende disso.
E você pode contar com o Brasil de Fato para seguir noticiando as causas, os culpados e as consequências. Com o seu apoio, a gente não vai ficar apenas observando o mundo acabar em calor e chuva. Lute conosco.
Hidrate-se,
Rafaella Coury
Coordenadora de redes sociais do Brasil de Fato
Edição: Martina Medina